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LUÍS NASSIF
Política industrial e FAB
Duas lições relevantes foram aprendidas pelo país
nos últimos tempos. A primeira é
que, em toda grande licitação
pública que envolva grandes
competidores internacionais e
interesses nacionais de outros
países, o Brasil tem o direito
-mais, o dever- de exigir contrapartidas. É o que se chama de
"cláusula off-set". A segunda é a
de que a transferência de tecnologia e conhecimento são elementos essenciais para o desenvolvimento nacional.
Essas duas questões precisam
estar presentes na decisão do
Conselho Nacional de Defesa que
definirá a licitação dos FXs, os
aviões de caça que irão reaparelhar a FAB (Força Aérea Brasileira). Divulgadas nos jornais, as
avaliações entre os competidores
comprovam semelhanças técnicas e financeiras.
No plano desenvolvimento estratégico, a fabricação de um
moderno avião de caça poderá
permitir a incorporação à inteligência nacional de diversas tecnologias de ponta. Além de
transformar o país em base para
a exportação de aviões. A proposta mais concreta nessa direção é a da francesa Dassault, associada à Embraer. Mas nada
impede que as condições apresentadas pela Dassault sejam estendidas aos demais competidores que se dispuserem a tanto.
A Dassault apresenta uma série de propostas inéditas que terão que ser conferidas e cobradas
pelas autoridades.
A primeira é a de permitir à
sua parceira e sócia, a Embraer,
autonomia para o desenvolvimento tecnológico do aparelho e,
em um primeiro momento, o
atendimento do mercado latino-americano. Nessa área específica, não haverá competição entre
o Mirage 2000-Br (que será fabricado pela Embraer, em caso de
vitória na licitação) e o francês.
Nos últimos 35 anos, foram vendidos para a América Latina cerca de 200 aviões de combate. Não
haverá substituição imediata de
todos, mas vários países estão em
processo de renovação de frota.
Como os aviões atuais têm mais
capacidade que os antigos, haverá a necessidade de menos
aviões, mas, mesmo assim, é um
mercado atraente.
Como a Embraer terá autonomia no desenvolvimento do Mirage, nada impedirá que, futuramente, dominado o ciclo de produção, o modelo brasileiro possa
competir com o francês.
Originalmente, o pedido da
FAB era de 108 aviões. Restrições
econômicas reduziram a primeira fase a um lote de 12 a 24. O índice de nacionalização do Mirage Br dependerá da velocidade
de renovação da frota brasileira
por uma questão de custo e escala, segundo informam os representantes da Dassault. No 70º
avião, seria atingido o índice de
80% de nacionalização.
O Mirage brasileiro trará algumas modificações para se adaptar às características do país, especialmente nas partes de comunicação logística e nas condições
técnicas da FAB, especialmente
na interação com o sistema Sivam de satélites. Como no Brasil
as distâncias são continentais, há
a necessidade de produção autônoma de oxigênio para pilotos.
Na Otan (o sistema de defesa europeu), o oxigênio é colocado na
base. A adaptação dos armamentos já será feita no Brasil pela Embraer.
Recentemente, a Range Corporation listou 26 tecnologias de
ponta em que um país precisaria
ser tecnologicamente competitivo. Ainda segundo a Dassault,
dessas tecnologias, 18 estão presentes em avião de caça. Por
exemplo: 1) design industrial via
computadores. O software em
questão poder ser largamente
utilizado em toda a indústria automobilística, naval e até para
coração artificial. 2) Tecnologia
de informação, com toda a parte
da informatização eletrônica. Esse item consta da proposta de
transferência de tecnologia. 3) A
tecnologia de radares, com aplicação também na indústria automobilística. 4) Engenharia de
materiais, já que aviões de combate são frequentemente colocados sob situação limite. 5) A integração de sistemas em aviões de
combate pode ser aplicada ao
controle de poluição.
Além disso, uma política industrial adequada deverá permitir a criação de uma rede de fornecedores brasileiros, capazes de
acompanhar a Embraer em suas
incursões por outros países.
Com essa transferência, supõe
a Dassault, de cada real gasto pelo governo ao longo do processo,
até 70% ficariam no Brasil, gerando emprego e riqueza.
Outros competidores apresentam outras vantagens. Mas é importante que, qualquer que seja o escolhido, o governo imponha condições similares de transferência de tecnologia.
E-mail - lnassif@uol.com.br
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