São Paulo, quarta-feira, 31 de julho de 2002

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ECONOMIA EM TRANSE

Empresas pedem descontos para quitar débito externo antes do vencimento e ajudam a pressionar o dólar

Empresas antecipam pagamentos externos

FABRICIO VIEIRA
ADRIANA MATTOS

DA REPORTAGEM LOCAL

Sem ter como arcar com todo o peso de suas das dívidas em dólar, empresas brasileiras criaram alternativas de emergência para o pagamento das pendências que vencem nos próximos meses. Mas tais saídas estão fazendo com que o preço do dólar aumente ainda mais.
Uma das saídas é negociar com os credores um desconto no valor total do vencimento em troca do pagamento imediato da dívida -ou a antecipação de uma de suas parcelas. A outra possibilidade é pagar um prêmio -que corresponde a uma porcentagem da dívida- ao investidor externo.
Em troca, o credor aceita receber o montante total só no futuro. Na prática, nos contratos assinados entre as partes, a negociação é feita com base em duas datas.
Uma, anterior ao prazo final de liquidação do empréstimo, data essa que é definida entre as partes. Exemplo: a dívida vence em 2006, mas há chance de o investidor ou a empresa decidirem pelo pagamento numa data "x", antes de 2006. E ainda há a data oficial do pagamento. Agora, as empresas estão "jogando" com essas datas na tentativa de procurar uma solução de emergência para postergar o mico que elas têm nas mãos.
Algumas companhias têm pedido um desconto para pagar o débito antes da data oficial de pagamento. Com isso, desembolsam menos dólares. Ou até mesmo tentam negociar o pagamento, mas só para o dia do vencimento mesmo, daqui a alguns anos. E para isso, oferecem um prêmio, uma espécie de sinal.
Nesse barco estão companhias menores, que não tinham dólares no cofre e, portanto, têm que recorrer ao mercado à vista. Também caíram nessa armadilha empresas de grande porte, que acreditavam que os credores não exigiriam o pagamento de suas dívidas em data antecipada. Segundo dados apurados pela Folha em um banco nacional, todo o setor privado deve acumular, apenas em agosto, dívida externa de US$ 1,5 bilhão a US$ 1,7 bilhão.

Sem saída
O sufoco das empresas começou a se agudizar a partir de maio. As linhas de crédito no mercado externo secaram e a alternativa de rolagem das dívidas privadas que vencem -comum até o ano passado- começou a se tornar muito mais difícil.
O percentual de dívidas roladas pelas empresas despencou de cerca de 96,5% no ano passado para 58% entre janeiro e maio deste ano. Em junho, o resultado foi ainda mais desastroso, com a rolagem de apenas 22% dos vencimentos.
""Além de tentarem pagar parte antecipada da dívida, uma alternativa interessante que surge para as empresas nesses dias é recomprar títulos de sua dívida, como eurobônus, que estão sendo negociados em níveis muito baixos. Em muitos casos, com apenas 60% de seu valor de face", afirma Fernando Ferreira, diretor da consultoria Global Invest.
Esse movimento, que o mercado já detecta, tem colaborado para aumentar a pressão sobre o câmbio. Em um mercado com poucos investidores dispostos a oferecer dólares, o aumento de potenciais compradores levou a moeda norte-americana aos níveis recordes dos últimos dias.
""O volume de pagamentos efetuados tem superado os programados. São dois os motivos principais: uma tentativa das empresas de se precaverem de um um dólar em um nível ainda mais alto quando chegarem os vencimentos, e o medo de que haja mudança nas regras no que se refere a remessas ao exterior quando o próximo governo assumir", afirma Danny Rappaport, economista da consultoria Tendências.
Nesse clima de incerteza, saídas são criadas às pressas. "É nessas horas de instabilidade que surgem possibilidades como a de pagar prêmios. As companhias vão tentando achar saídas", disse Ernesto Meyer, diretor do banco BNP Paribas.
Os analistas deixam claro que o movimento de subida na cotação da moeda estrangeira não quer dizer, necessariamente, que só as grandes empresas estão na busca da moeda. Muitas delas já compraram dólares em março e abril, para quitar débitos que vencem agora. Portanto, quem tem pressionado muito o mercado são as companhias menores (com débitos nem tão elevados) que não optaram por esse caminho, por considerar a operação cara. Agora, pagam pela escolha.



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