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São Paulo, domingo, 31 de agosto de 2003

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VAREJO

Empresas que perderam clientes ao reajustar preços em busca da rentabilidade devem ter dificuldade para reconquistá-los

Overdose de aumentos pode virar "tiro no pé"

ADRIANA MATTOS
DA REPORTAGEM LOCAL

A recente overdose de aumentos de preços dos produtos de marcas líderes no mercado terá os seus efeitos colaterais. Lojas, especialistas e empresas afirmam que mesmo uma eventual retomada na demanda não fará o consumidor voltar a comprar mercadorias de primeira linha em 2003. Pior: as previsões para o retorno dos clientes às marcas líderes jogam a data para 2005.
Há até uma bolsa de apostas dos produtos -e suas empresas líderes- que já perderam mercado e dificilmente irão se recuperar do tombo. São eles: iogurte, bolacha, enlatados, maionese e leite em caixa.
Era esse o risco da tática das companhias de implementar reajustes que privilegiavam, antes de tudo, a rentabilidade. Ainda que as amargas remarcações afastassem a clientela.
"Essa não foi uma decisão certa ou errada, mas puramente estratégica", afirma Nelson Barrizelli, economista e analista da área. Para Alberto Serrentino, sócio da consultoria GS&MD, não há perspectiva de retorno dos consumidores para as marcas principais a médio prazo. Barrizelli diz que isso não acontecerá até 2005.

"Estamos aqui"
O reencontro dos consumidores com as marcas líderes poderia ocorrer por conta do atual cenário de inflação sob controle. Isso cria, como ocorreu por vezes no passado, terreno para a recuperação nas vendas dessas marcas.
Mas esse movimento será lento por duas razões: 1) em parte porque o cliente trocou de marca, gostou do "substituto", passou a gastar menos e está satisfeito; 2) não há expectativa de uma recuperação na renda -esse é o fator principal. Em julho, o rendimento médio real no país estava 16,4% menor que em julho de 2002.
"As grandes companhias sabem que perderam consumidores. Tanto que iniciaram uma reação. Há ações agressivas de mídia na tentativa de expor a marca e dizer: "Olha, estamos aqui'", diz Rogério Rafael, gerente de marketing dos supermercados Nordestão.
Segundo Alberto Serrentino, um fator foi determinante nesse processo: houve uma melhora na qualidade de produtos classificados como secundários. Eles são fabricados por empresas de médio porte ou levam o nome de supermercados na embalagem.
De janeiro a junho, por exemplo, o Carrefour apurou um aumento de 20%, em média, na venda (em volume) de mercadorias de sua marca no segmento de óleo de soja, arroz, leite longa vida, amaciante de roupas e biscoitos.
No período, companhias de grande porte perderam participação de mercado. Isso ocorreu com a Unilever, no setor de maioneses e margarinas, e com a Danone, em iogurtes, segundo o Instituto de Pesquisas Nielsen.
A escalada de aumentos de preços de alguns produtos existiu porque as empresas precisavam repassar a valorização do dólar -verificada no primeiro trimestre. As matérias-primas são cotadas na moeda dos EUA.
Por isso, por exemplo, o açúcar acumula alta nos preços de 70,5% de junho de 2002 a junho de 2003. O óleo de soja, 53,8% no período.

Aumento necessário
Algumas empresas líderes de mercado, como a Unilever, foram procuradas pela Folha. Informam que o aumento nos preços foi necessário e não cobriu a pressão nos custos. E que parte da margem foi "comida" pelos aumentos que sofreram nas tarifas públicas e insumos importados.
Dados da Folha, com base nos últimos resultados de empresas como Sadia e Seara, mostram que a margem bruta média do setor de carnes industriais caiu. Passou de 28,6% para 24,6% em 12 meses.
Isso indica que há grupos com perdas na rentabilidade e que não repassaram todos os custos. Não cabe, portanto, generalizações.
"Empresas de grande porte não conseguiram vender quantidades maiores de mercadorias e garantir resultados", diz Hugo Bethlem, diretor do Pão de Açúcar. "Cansadas de um mercado retraído, decidiram manter rentabilidade a todo custo. Mas há exceções."
Bethlem e Arthur Sendas, dono da rede Sendas, desconfiam da possibilidade de uma retomada na economia ainda neste ano. "Se acontecer uma aceleração nas vendas, ela será limitada a poucos casos", afirma Sendas.


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