São Paulo, sexta-feira, 31 de agosto de 2007

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LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS

A inflação está de volta?

O preço dos produtos e serviços que não são afetados pela importação subiu acima da média pela 1ª vez em meses

OS ÍNDICES que medem a inflação têm surpreendido o mercado nestas últimas semanas. O último deles, o IGP-M (Índice Geral de Preços - Mercado) de agosto, chegou próximo de 1%, muito acima do esperado. Os números recentes da inflação no atacado estão fortemente influenciados pelo comportamento dos preços agrícolas. A variação dos preços desses produtos está próxima de 13% ao ano, afetando também os alimentos industrializados e, de forma incipiente, o segmento de refeições fora do domicílio.
Já a inflação de outros produtos industriais está bem comportada, em torno de 2% ao ano nos 12 meses até agosto. Essa situação caracteriza o que os economistas chamam de crescimento de preços por choque de oferta -mesmo que esse choque se dê fora do Brasil-, e não por descompasso de demanda.
Isso pode ser visto de maneira mais clara quando acompanhamos os chamados núcleos da inflação, que retiram do cálculo dos índices os preços mais voláteis, como os de origem agrícola. Tenho escrito com freqüência nesta coluna que as importações crescentes têm funcionado como uma válvula reguladora entre o consumo que avança a taxas vigorosas -mais de 6% ao ano- e a oferta de produtos como automóveis e outros bens duráveis.
Mas a última medida dos preços ao consumidor, realizada em agosto -o chamado IPCA-15 (Índice de Preços ao Consumidor Amplo -15)- , trouxe uma novidade em relação aos meses anteriores. Os preços dos produtos e serviços que não são afetados pelas importações tiveram crescimento acima da média pela primeira vez em vários meses. Esses itens -chamados de não-comercializáveis pelos economistas- dependem basicamente do equilíbrio entre oferta e procura no mercado interno. As importações não podem compensar, como ocorre com os bens comercializáveis, eventuais desequilíbrios entre oferta e demanda.
Nesse caso, o grau de utilização de recursos na economia -incluindo o mercado de trabalho- e a produtividade é que definem a dinâmica da inflação.
Se o resultado do último IPCA-15 persistir nos próximos meses -e aqui é importante salientar que o último dado pode ser simplesmente uma compensação de meses de crescimento abaixo da média desses preços-, a inflação terá mudado de dinâmica, passando a ser uma questão a ser enfrentada pelo Banco Central.
Sabemos que o consumo do brasileiro tem crescido a taxas próximas de 6% ao ano, ritmo que só pode ser mantido com a contribuição das importações e do aumento da capacidade produtiva interna. Esses dois fenômenos vêm ocorrendo nos últimos trimestres, limitando a inflação nos bens duráveis. Mas o último IPCA-15 é um alerta de que o consumo acelerado pode estar chegando a setores menos atingidos por esses dois fatores. Confirmando esse comportamento, poderemos estar diante de uma necessária redução do ritmo de crescimento do consumo dos brasileiros.
Estudo realizado pela economista Marina Santos, da Quest Investimentos, mostra que o fator mais importante por trás do consumo das famílias tem sido o crescimento do crédito às pessoas físicas. Entre meados de 2005 e julho de 2007, o volume de crédito para o consumo dobrou, ao passar de 5,5% para mais de 11% do PIB (Produto Interno Bruto). A continuidade desse crescimento do crédito pode se tornar problemática para a política monetária, caso se confirme uma dinâmica menos benigna para a inflação.


LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS, 64, engenheiro e economista, é economista-chefe da Quest Investimentos. Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações (governo FHC).

lcmb2@terra.com.br


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