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OPINIÃO ECONÔMICA
Cem sem cem
BENJAMIN STEINBRUCH
Depois de marchas e contramarchas, com cem e sem 100 mil
manifestantes, com rumo e sem
rumo, com unidade e sem unidade da oposição, com ruralistas e sem ruralistas, com caminhoneiros e sem caminhoneiros,
com dólar a R$ 2 e sem dólar a
R$ 2, o Brasil se encontra no
"day after" mais uma vez.
Sobrevivemos. Mas o que podemos tirar de prático dessa manifestação toda? Certamente o
descontentamento da maior
parte da população com seu dia-a-dia cheio de insegurança,
cheio de desacertos, de falta de
trabalho, de ausência de perspectiva e esperança. O que fazer,
então?
Outra mudança de ministros
não seria o caso, já que o problema não são pessoas. Modificação radical da política econômica também não seria a solução,
já que implicaria grandes riscos
de incompreensão, aqui e lá fora, e instabilidades externas certamente ocorreriam.
A continuidade das votações
das reformas, a aprovação do
novo Orçamento (agora redigido e montado de uma forma que
todos podem entender), a divulgação do novo Plano Plurianual
de Desenvolvimento (agora batizado com o slogan "Avança
Brasil"), a continuidade do programa de privatizações, a maior
proximidade do Palácio do Planalto com os partidos que compõem a base do governo são
ações muito importantes, desejadas e oportunas.
Mas o que eu gostaria de sugerir é que o governo partisse para
coisas concretas, em sintonia
com tudo o mais que está sendo
projetado, estudado ou votado.
É a hora, por exemplo, de lançar
logo o programa de 1 milhão de
casas populares a ser implementado o mais longe possível do
Orçamento, buscando-se formas
de gerar suprimentos e angariar
financiamentos externos, a ser
repassados aos compradores dos
imóveis.
Também dá para ser prático e
objetivo na agricultura, com um
programa para a "segunda safra", já que estamos iniciando o
plantio da primeira safra em setembro e o Brasil tem condições
de solo e de clima, excelentes e
diferenciadas, que nos permitem
produzir uma segunda safra em
grande parte do nosso território.
O que europeus e norte-americanos, por exemplo, não podem
sequer imaginar.
Outro caminho é o programa
de incremento do turismo, com
metas claras, para que assumamos, de fato, uma liderança continental, em vez de continuarmos disputando estatísticas com
o Uruguai, a Costa Rica, a Argentina, o Chile e até os minipaíses do Caribe. Nessa área o Brasil já alcançou bastante, e basta
que se apresentem diretrizes claras e se dê suporte ao que já se
faz nos Estados, nos municípios
e nas empresas de todos os tamanhos que já operam no turismo doméstico. São empresas,
empresários e profissionais que
têm tudo para se transformar
em fábricas de divisas, acolhendo o turista internacional.
Outra idéia exequível a curto
prazo é a do financiamento especial para a exportação, com linhas abertas para a manutenção e o incremento das quantidades exportadas.
Mencionei aqui quatro ações
específicas que podem e devem
ser realizadas sem ameaças de
mudanças da política econômica. É que todos concordamos
que é preciso partir, de novo, para o desenvolvimento, mas vejo,
com tristeza, que muitas das
propostas hoje apresentadas se
baseiam em práticas antigas
que privilegiavam a gastança, a
emissão de dinheiro sem lastro
produtivo e outras experiências
tristes que se constituíram, pela
sua soma, no terrível rastilho da
inflação.
Chega de tentar o que todos
sabemos que não pode dar certo.
Desenvolvimento, sim, apoiado
em ações concretas e enérgicas
que não possam ser convertidas,
por má-fé ou imprudência, em
tristes prólogos da volta da inflação.
Não é possível esquecer a hiperinflação de que nos livramos há
bem pouco tempo, o imposto
mais perverso jamais cobrado
dos brasileiros e do país. A distorção inflacionária agravou as
nossas chagas sociais, desarrumou a economia e encheu de
obstáculos a volta à seriedade
que se baseia em um princípio
de enorme simplicidade: o Brasil
não pode gastar mais do que arrecada. Nenhum país pode!
Não nos esqueçamos disso. E
vamos, com criatividade, explorar as perspectivas de idéias simples e propostas concretas que
podem trazer respostas imediatas às nossas maiores necessidades: emprego, crescimento e desenvolvimento, pelos caminhos
simples como os que enunciei
neste artigo.
Benjamin Steinbruch, 45, empresário,
graduado em administração de empresas e
marketing financeiro pela Fundação Getúlio Vargas (SP), é presidente dos conselhos
de administração da Companhia Siderúrgica Nacional e da Companhia Vale do Rio
Doce. E-mail: bvictoria@psi.com.br
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