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LUÍS NASSIF
A polêmica da Merrill Lynch
A agressividade do banco
Merrill Lynch no mercado brasileiro tem incomodado a concorrência. O último episódio envolvendo o banco ocorreu no recente vencimento do mercado
de índices e tem dado margem a
interpretações variadas sobre
sua motivação.
Anos atrás, a Bolsa de Valores
de São Paulo passou pela turbulenta fase do IGP -Icatu, Garantia e Pactual-, que eram
bancos bastante agressivos, especialistas em montar operações entre mercados de índices e
à vista. O mercado de índices é
operado pela Bolsa Mercantil &
Futuros (BM&F), e o mercado à
vista, pelas Bolsas de Valores. O
futuro de Índice Bovespa (que é
negociado na BM&F) se faz em
torno de apostas sobre o comportamento do índice -que
corresponde à média ponderada das cotações das ações negociadas em pregão na Bovespa.
O que os bancos faziam era
montar estratégias simultâneas. No vencimento do futuro,
vendiam ou compravam pesadamente ações no mercado à
vista, para derrubar ou elevar o
Índice Bovespa.
Uma das manipulações mais
utilizadas era "picar" o boleto
(o documento que serve para registrar a operação). Para evitar
que grandes investidores interferissem nas cotações (em um
tempo em que o mercado tinha
poucos negócios), a Bolsa determinava que a cotação média
fosse feita pela média aritmética dos boletos -independentemente do valor da operação.
No último vencimento de índices, a Merrill Lynch passou a
atuar pesadamente, "picando"
os boletos. A regra da Bolsa diz
que quem vende a ação preenche o boleto. Ao perceber a
atuação dos operadores, o diretor de pregão ordenou que os
boletos passassem a ser preenchidos pelos compradores.
A Bolsa estranhou o movimento dos "boletos" e pediu explicações ao banco. As explicações não convenceram, mas não
foi aberto inquérito porque o
superintendente da Bovespa,
Gilberto Mifano, garante que,
seja qual for a intenção, a Merrill Lynch não logrou o intento
de manipular as cotações, devido a mudanças na metodologia
de cálculo do índice. Antes, o índice era calculado negócio a negócio. Mudou para o cálculo
médio do pregão levantado de
30 em 30 segundos.
Três anos atrás, por conta da
própria Merrill Lynch -que
derrubou o pregão da Bovespa
na última meia hora, em operação casada com o mercado de
índices-, houve novas modificações. O índice era calculado
de acordo com a última meia
hora de pregão. Passou para a
média das últimas duas horas e
meia -justamente o período
em que o banco descarregou
suas operações "picadas". De
acordo com Mifano, essa nova
metodologia impediria manipulações.
Mas é evidente que, dependendo da maneira como os boletos "picados" entram no pregão, há influências sobre o preço à vista. E muitas instituições
se consideraram prejudicadas
pela operação.
Outras polêmicas
Não é a única operação polêmica da Merrill Lynch. Os movimentos de sua mesa nem
sempre são claros e há rumores
de que operadores estariam
atuando por meio de "scalpers"
(operadores que operam por
conta própria no pregão), especialmente em operações envolvendo ações da Petrobras. Pelo
menos três fontes de mercado
me confirmaram essa suspeita.
Alexandre Kock, diretor executivo do banco, responsável
pela área de mercado de ações,
julga que esteja havendo um
misto de má compreensão
-pelo fato de a corretora atuar
com praticamente todos os papéis- com disputa da concorrência. Segundo ele, a ordem de
"picar" o boleto vem de clientes.
Há clientes internacionais, segundo ele, que dão ordens do tipo investir 25% ou 35% do volume de negócios do dia de determinado papel. Como não é
possível saber "a priori" o volume negociado, segundo Kock, a
alternativa seria "picar" os boletos e ir vendendo de acordo
com o desenrolar do leilão.
Kock descarta a possibilidade
de operações de "traders" com
""scalpers". Existe um sistema
de monitoramento contínuo de
execução de ordens, diz ele. Semanalmente, comparam pedido de ordens de compra e venda, monitoram tempo de execução e analisam se existe algum tipo de concentração em
relação à contraparte. Tudo isso para fins de controle interno.
De qualquer modo, não resta
dúvida de que a Merrill Lynch
se tornou a herdeira da agressividade dos bancos de investimento nacionais, do início da
década.
E-mail: lnassif@uol.com.br
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