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São Paulo, domingo, 17 de agosto de 2003

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DE PAVIO CURTO

Dificuldade para arrumar trabalho conduz à revolta e à descrença no retorno ao mercado

Estressado, candidato desafia selecionador

TATIANA DINIZ
DA REPORTAGEM LOCAL

Eles estão na defensiva. Tentando se encaixar num mercado cujo prazo médio de recolocação já é de dez meses, chegando a 11 para os profissionais especializados (segundo estudo inédito do Grupo Catho realizado com 40 mil pessoas), os candidatos em busca de emprego enfrentam desgaste emocional crescente.
Há muitos indícios de que o longo período de desemprego deixa sequelas entre os que aspiram a um posto de trabalho: irritação, cansaço e alto nível de desconfiança são sintomas comuns, apontados tanto pelos recrutadores como pelos candidatos.
Para se ter uma idéia, os "ânimos alterados" estão convertendo fases como entrevistas e contatos telefônicos entre profissionais e selecionadores em experiências capazes de produzir faíscas.
"Quem é você?" e "diga logo se essa vaga existe porque eu não aguento mais" são algumas das saudações que a caça-talentos Renata Bezerra, da H2 Headhunting, passou a ouvir de seus potenciais candidatos já no primeiro telefonema. "Eles estão no limite", diz.
Do outro lado da linha, o estudante de direito Renato Mussi, 23, justifica sua "fúria": está procurando uma posição desde 2001. "Cada vez que volto de mais uma entrevista sem sucesso, minha revolta aumenta. Quando me ligam, a vontade é de perguntar logo se vão me contratar ou não", afirma.
Mussi conta que, no último processo de que participou, esperou mais de uma hora até que duas selecionadoras solicitassem que fizesse uma prova para, só depois, conversarem com ele. "Foi demais. Levantei e fui embora."

Virando a mesa
Professora de artes cênicas, Zenaide Poludo, 25, provocou um verdadeiro motim quando, após enfrentar dois dias de seleção para "professores da área cultural", a empresa comunicou que ela fora aprovada para atuar como vendedora de revistas e enciclopédias.
"Eles fizeram mil exigências, pediram que usasse traje social, mantiveram os candidatos esperando por horas. Sempre que alguém perguntava se era uma seleção para a área de vendas, respondiam que "não necessariamente"."
Ao saber qual era realmente a vaga ao final do segundo dia, Poludo protestou alto e bom tom. "Questionei a falta de transparência, e vários outros candidatos reclamaram também", conta.

Bocejo e lágrimas
Mais contida, a profissional de marketing P. (pediu para não ter seu nome revelado) fez as contas: dos 17 processo seletivos de que participou em 2003, não obteve retorno em 35%. "Vou para as entrevistas sem esperança."
Para ela, a falta de retorno é o fator mais desanimador dos processos seletivos. "Há também episódios inacreditáveis, como o caso do selecionador que fica bocejando na sua cara bem no meio da entrevista", comenta. "Aí o desespero cresce, e chego a chorar no carro durante a volta para casa."


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