UOL


São Paulo, domingo, 20 de julho de 2003

Próximo Texto | Índice

EMPREGO PELOS ARES

Enquanto fusão Varig/TAM não "decola", funcionário da área convive com o medo da demissão

Trabalho na aviação encara turbulência

BRUNO LIMA
FREE-LANCE PARA A FOLHA

A negociação do acordo de fusão entre as duas maiores companhias aéreas do país, a Varig e a TAM, apontada como principal sintoma da crise enfrentada pelo setor, tirou o sono dos trabalhadores ligados à aviação comercial.
Aeronautas, aeroviários e aeroportuários temem desvios de rota individuais (encerrando carreiras) e coletivos (barrando conquistas trabalhistas).
Dados do DAC (Departamento de Aviação Civil) revelam a retração do setor. O número de assentos oferecidos pelas empresas aéreas nas linhas domésticas, por exemplo, foi 18,9% menor em junho deste ano do que no mesmo mês em 2002, com redução de 30% no grupo Varig, 27,6% na TAM e 17,7% na Vasp. Se considerado o período de janeiro a junho, 2003 aparece com 8,9% menos assentos disponíveis.
A baixa na oferta passa por redução de vôos e, dizem especialistas, é acompanhada de cortes de funcionários e diminuição de custos com cada trabalhador.
"É um setor com empregos doentes", diz Uébio José da Silva, presidente do Sindicato dos Aeroviários do Estado de São Paulo. "A aviação hoje é status. O trabalhador come mortadela e arrota peru." Para ele, o "glamour" do segmento leva funcionários a aceitar a baixa remuneração.
Ícaro Machado Vieira, 56, comandante da Varig, diz acreditar que não terá espaço na nova companhia. Ele conta que, apesar do mercado ruim, paga com prazer o curso de piloto para o filho Felipe, 21, "porque é o que ele quer". "É caríssimo, não fica em menos de R$ 60 mil. E estou pagando sabendo que não haverá emprego."
"A aviação continua atraindo pelo romantismo. Mas a realidade é outra", ressalta o comandante desempregado Reginaldo Teixeira, 43, que diz viver hoje com ajuda de custo recebida de colegas.
Na TAM e na Varig, onde, segundo estudo atribuído aos responsáveis pela fusão, haveria cerca de 5.000 demissões, uma das preocupações dos funcionários, que são habilitados para lidar com aeronaves determinadas, é saber quais serão os aviões da nova empresa. A Varig atua com Boeing e MD, e a TAM, com Airbus e Fokker. "A maioria pensa nisso o dia inteiro", afirma o mecânico Jucelino dos Santos, 46.
Segundo o porta-voz para assuntos de fusão da Varig e da TAM, Roberto Müller, não há definição sobre demissões.

Hotel
Sem emprego nas companhias aéreas, comissários de bordo com e sem experiência profissional têm buscado colocações alternativas em hotéis, joalherias e navios.
A categoria é a que enfrenta a pior situação no setor, em razão da grande oferta de mão-de-obra. Segundo o SNA (Sindicato Nacional dos Aeronautas), há cerca de 30 mil profissionais certificados pelo DAC sem vaga na aviação. Em 2002, 17 escolas de comissários foram abertas -107 instituições oferecem o curso no país.
A reconfiguração das tripulações, reduzidas ao mínimo exigido -um comissário por porta do avião-, colaborou para o encolhimento dos postos de trabalho nas companhias tradicionais sem que as novas empresas pudessem absorver todos os demitidos.
A Gol, que começou a operar em janeiro de 2001, diz que admitiu 135 comissários em suas três últimas seleções -21% novatos, 36% da Rio Sul (grupo Varig), 16% da Vasp, 11% da Varig, 7% da Transbrasil (que encerrou operações em dezembro de 2001), 6% da TAM e 3% das demais. Do total de comissários em exercício, 58% vêm de outras empresas.
Mordomo de um hotel nos Jardins desde outubro de 2002, Alexandre Aveiro, 33, revela que ganha um terço do que recebia como comissário, mas com a vantagem de ter agora um plano de saúde. "O glamour acabou na aviação. Antes ficava em bons hotéis, tinha um uniforme legal, com tecido decente. No final, estava dormindo até em pousada."
Oswaldo Moraes, consultor de relações do trabalho do Snea (Sindicato Nacional das Empresas Aeroviárias), afirma que a aviação é recessiva e que não difere do mercado de trabalho de modo geral. "Mas está sempre entre as primeiras a sentir as crises e entre as últimas a se recuperar", argumenta.


Próximo Texto: Comissária "desembarca" em joalheria
Índice


UOL
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.