São Paulo, quinta-feira, 02 de junho de 2005
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Saúde

Nova cirurgia refrativa respeita as características individuais de cada olho

Pessoal e intransferível

FLÁVIA MANTOVANI
DA REPORTAGEM LOCAL

Primeiro, foi o bisturi. Depois, o laser. Agora uma nova técnica veio aprimorar a correção de miopia, astigmatismo e hipermetropia. A cirurgia refrativa personalizada também usa laser, mas proporciona melhor qualidade de visão em relação à cirurgia convencional, aos óculos e às lentes de contato.
"Trata-se da terceira geração em cirurgias para correção desses problemas oculares. A nova técnica é individualizada e respeita as características de cada olho. É um avanço em vários sentidos", afirma o oftalmologista Mauro Campos, chefe do setor de cirurgia refrativa da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo). Na instituição, a cirurgia é realizada desde fevereiro de 2004 e, atualmente, é prescrita para todos os pacientes que querem ser operados.


O principal diferencial da nova cirurgia é que ela corrige as aberrações de alta ordem (imperfeições do olho que tornam as imagens menos nítidas)


Assim como a operação a laser convencional, a cirurgia personalizada é indicada para quem tem miopia, hipermetropia e astigmatismo, além da associação de astigmatismo com miopia ou com hipermetropia.
Seu principal diferencial é corrigir também as aberrações de alta ordem (imperfeições do olho que tornam as imagens menos nítidas, principalmente com pouca luz). Essas aberrações são naturais -sua intensidade e seu tipo variam de pessoa para pessoa- e não podem ser corrigidas com óculos nem com lentes.
A própria cirurgia a laser convencional provoca um aumento nas aberrações de alta ordem. "A comunidade oftalmológica percebeu que alguns pacientes tinham o grau zerado, mas continuavam com queixas, principalmente noturnas. Eles diziam que as luzes ficavam borradas, e a gente não conseguia detectar por que isso acontecia. A partir daí, foi desenvolvida uma tecnologia para quantificar e corrigir o problema", relata o oftalmologista Marcelo Cunha, que trabalha com a cirurgia personalizada em sua clínica desde agosto de 2004.
Em condições de pouca luz, uma pessoa que possui aberrações em grande intensidade pode enxergar halos (espécie de borrões em torno de um ponto de luz). Ao dirigir à noite, por exemplo, é comum que ela veja borrões de luz em volta dos faróis.

ABERROMETRIA
Para identificar o tipo e a intensidade das aberrações, é feito um exame chamado aberrometria, que mapeia as características do olho, tirando uma espécie de "impressão digital" dele.
O resultado do exame é colocado em um disquete e levado para o aparelho de laser, que faz a correção de acordo com as características de cada olho. "O aberrômetro diz as imperfeições que o olho tem e desenha o tratamento que o laser pode fazer para transformá-lo em um sistema óptico mais perfeito. Ele detecta o problema e sugere uma solução", explica Mauro Campos.
De acordo com o oftalmologista, a partir da descoberta das aberrações oculares, as técnicas para melhorar a visão foram sendo aprimoradas. "Essa cirurgia é apenas o inicio de uma série de alternativas que estão sendo desenvolvidas em oftalmologia atualmente. Hoje, são pesquisados óculos e lentes livres de aberrações. Algumas lentes já trazem uma qualidade na visão noturna superior às convencionais", diz o médico.

PROCURA
A cirurgia refrativa personalizada começou a ser realizada no Brasil há cerca de dois anos e ainda é oferecida em poucos locais. São Paulo, Campinas, São José do Rio Preto, Curitiba, Sorocaba, Porto Alegre, Belo Horizonte e Rio de Janeiro são algumas cidades onde ela já é feita. De acordo com os médicos, a procura vem crescendo.
Uma das fabricantes da tecnologia, a Alcon, relata que 32% dos pacientes que são operados com seu aparelho de laser optam pela cirurgia personalizada. No fim do ano passado, eram 15%. A empresa comercializou, até agora, 11 aparelhos no Brasil.
Segundo a Bausch & Lomb -cujos aparelhos de cirurgia personalizada estão presentes em 19 clínicas e hospitais brasileiros-, a porcentagem de cirurgias refrativas personalizadas em relação ao total de operações a laser que são realizadas por mês com o equipamento da empresa subiu de 3% para 15% de 2004 para 2005.


O preço do procedimento varia, mas fica em torno de R$ 3.600 (a cirurgia tradicional custa cerca de R$ 1.800)


A coordenadora do Departamento de Oftalmologia da Sociedade Brasileira de Laser, Marina Biseo Henriques, afirma que a procura existe, mas que o preço é um fator limitante. "O ideal é que ela fosse indicada para todos os pacientes que querem ser operados. As pessoas estão mais informadas e querem fazer a operação, mas o preço dificulta o acesso. A cirurgia personalizada custa praticamente o dobro da convencional", diz. O preço do procedimento varia, mas fica em torno de R$ 3.600 (a tradicional custa cerca de R$ 1.800).
Apesar de ter um baixo grau de miopia e astigmatismo, o publicitário Diego Zaragoza, 42, achou que compensava submeter-se à cirurgia personalizada. "Pratico esportes aquáticos, como surfe e vela, e o risco de perder as lentes na água é muito grande. Além disso, não conseguia me disciplinar com os óculos. Eu acabava perdendo ou tinha a lente riscada ou quebrada. Vi que, com o dinheiro que eu gastava com as armações, valia a pena fazer a operação", conta ele, que passou pelo procedimento há dois meses.
O publicitário diz que optou pela técnica personalizada em busca de uma melhor qualidade de visão. "O pós-operatório foi tranqüilo. Na mesma noite, consegui abrir os olhos e ver todas as estrelas", diz.
Em geral, a recuperação é rápida, assim como a cirurgia, que, dependendo do caso, pode durar cerca de cinco minutos por olho. "A pessoa vai embora de olhos abertos. Ela tem que usar colírios antibióticos e antiinflamatórios e, no dia seguinte, já está apta para trabalhar, desde que não realize tarefas que exijam uma excepcional visão. Muitos já vêm dirigindo para o meu consultório um dia depois", diz Marcelo Cunha.
Assim como no caso da operação a laser tradicional, é preciso fazer uma série de exames para saber se o paciente tem condições de passar pela cirurgia. "Ele deve ter o grau estável por mais de um ano. A espessura e a curvatura da córnea também têm que ser adequadas para a aplicação do laser em função do grau", lembra Cunha.
Os riscos são pequenos, mas, como em toda cirurgia, existem. "A complicação mais freqüente é não atingirmos o objetivo de grau. Fora isso, entramos nos riscos de infecção que existem em qualquer cirurgia. Mas, como é um procedimento muito rápido, a chance é mínima. O laser é altamente previsível", afirma o oftalmologista.

CÓRNEA FINA
Alguns aparelhos de cirurgia refrativa personalizada têm ainda um recurso adicional que permite corrigir o grau afinando menos a córnea. "O laser "lixa" a córnea e a deixa mais fina. Mas há uma espessura mínima que não pode ser ultrapassada. Algumas pessoas que têm córneas menos espessas naturalmente e por isso não podiam ser operadas antes agora já podem", diz Marcelo Cunha.
A Baush & Lomb chama esse sistema de "tissue saver" e diz que ele chega a economizar 30% do tecido da córnea. A Alcon também oferece cerca de 30% de economia de tecido.
De acordo com o oftalmologista Mauro Campos, a prioridade de pesquisa e desenvolvimento das empresas atualmente é planejar cirurgias que removam a menor quantidade possível de tecido.
A analista de sistemas Débora Coelho Ribeiro, 32, beneficiou-se desse recurso. Como ela tem a córnea muito fina, da primeira vez que procurou o médico para fazer a cirurgia, foi informada de que seu grau talvez não zerasse com a cirurgia convencional. "Isso foi há dois anos. Ele pediu que eu esperasse um pouco mais", diz.
Débora tinha quatro graus de miopia e 3,75 de astigmatismo e usava lentes de contato rígidas. "Quando surgiu a cirurgia a laser, achei que era pura estética e não quis fazer. Mas viajei para Fortaleza de férias e vi que era impossível andar de buggy com emoção. Cada grão de areia que entrava no meu olho parecia um elefante. Queria usufruir de tudo o que a vida me oferece."
Débora, que acabara de sair da sala de cirurgia no dia da entrevista, diz que mal pode esperar para ver como será o cotidiano sem as lentes. "Deve ser maravilhoso acordar e não ter que me preocupar em lavar e colocar a lente. Também quero muito usar maquiagem nos olhos", planeja.


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