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Amigos-da-onça podem fazer mal até a saúde
Estudiosa americana lista 21 tipos de amigo-problema; quando os atritos são freqüentes, é melhor questionar a amizade
ANA PAULA DE OLIVEIRA
DA REPORTAGEM LOCAL
Que as amizades fazem bem à saúde, todo mundo sabe. A novidade é que estudiosos do assunto passam agora a investigar o mal que um amigo pode causar. É o caso,
por exemplo, de quem viaja 200 km para levar o amigo, que está sem carro, visitar a tia-
avó. Ou de quem, sempre que está com a amiga por perto, fica até com cara de doente, de
tão sanguessuga que a colega é.
Amizades problemáticas, em que promessas
não cumpridas, dependência excessiva, traição e outras atitudes questionáveis imperam,
podem causar de estresse a depressão.
"Ter um mau amigo pode fazer alguém duvidar de si mesmo, de suas próprias habilidades. Em casos extremos, pode também colocar ambos em situações de risco", disse à Folha a socióloga americana Jan Yager, autora
do livro "When Friendship Hurts" (quando a
amizade machuca, inédito no Brasil), uma espécie de passo-a-passo sobre como reconhecer amizades negativas e lidar com elas.
"Acredito na máxima "Diga-me com quem
andas e te direi quem és". É grande a probabilidade de uma pessoa se envolver em condutas
que ponham sua vida em risco, como usar
drogas, por influência dos amigos", afirma a
psicóloga Carolina Lisboa, professora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul e estudiosa das relações de amizade. Adotando essa
lógica de "afinidade", o rapaz que costuma
trair a namorada pode estimular seu melhor
amigo a fazer o mesmo, exemplifica Lisboa.
Qualquer relação está sujeita a altos e baixos,
e as amizades não escapam a isso. Um livro
não devolvido, um segredo não guardado ou
um telefonema não respondido -se são esporádicas, atitudes como essas não são motivo para repensar a amizade. O problema
acontece quando esses comportamentos se
tornam padrão, afirma a psicóloga Mara Cristina de Lucia, diretora da divisão de psicologia
do Instituto Central do Hospital das Clínicas
(HC), de São Paulo.
Peso da amizade
Social por natureza, o
homem tem amigos -bons ou maus- desde
sempre. Nas últimas décadas, porém, a importância atribuída à amizade tem aumentado, diz Yager. "Quando os casamentos eram
feitos para durar, era mais comum que intimidade e confidência fossem divididas apenas
entre o casal. Como as relações amorosas não
são mais tão estáveis, a importância dada ao
amigo hoje é maior."
Boa parte dos malefícios que um amigo-problema pode causar é justamente considerá-lo amigo e criar expectativas inadequadas,
explica a antropóloga e professora da Universidade do Estado do Rio de Janeiro Claudia
Barcellos Rezende, autora do livro "Os Significados da Amizade - Duas Visões de Pessoa e
Sociedade" (editora FGV).
Ela estudou o conceito de amizade entre cariocas e ingleses. "Os cariocas chamam até o
garçom de amigo e, para eles, um mau amigo é
aquele que não atende a suas expectativas. Já
para os ingleses, que contam nos dedos de
uma mão os amigos que possuem, os maus
são os inconvenientes, aqueles que ligam tarde
da noite para contar problemas", diz Rezende.
As variedades
Em seu livro, Yager lista,
em ordem decrescente, os 21 tipos de amigo-problema mais comuns. O primeiro lugar cabe aos que nunca
cumprem o que foi combinado, mas tipos menos freqüentes na avaliação da norte-americana também atrapalham bastante.
Recentemente, a espécie sanguessuga passou pela vida da fisioterapeuta Maria Aparecida Garcia da Silva, 43. "Como sou mais velha
do que ela, sempre fiz o papel de mãezona, fazia tudo por ela. Na primeira vez em que
me recusei a lhe fazer um favor, ela mudou completamente. Nem o presente que
lhe dei no Natal ela agradeceu."
Às vezes, porém, o problema não está
no outro. A psicanalista Solange Assumpção, 53, só conseguiu entender a relação que tinha com um amigo quando
admitiu que o invejava. "Sempre pensei
que a dificuldade era dele, mas percebi
que era eu que invejava seu sucesso."
"É um exercício de consciência. O primeiro passo para saber se o amigo causa
mais mal do que bem é se perguntar por
que mantém laços de amizade com aquela pessoa", diz o professor de psicologia
da PUC-SP Miguel Perosa.
Essa resposta pode ser surpreendente e
não muito agradável. "Essa auto-avaliação pode até fazer com que a pessoa enxergue que ela pode ser a parte problemática da relação", afirma o professor. E
não é fácil aceitar que você só tolera aquela pessoa porque ela pode ser útil na sua
carreira.
Se existe hostilidade entre as partes ou
se a relação está muito abalada, orienta
Perosa, o melhor a fazer é se distanciar
por algum tempo. Para esfriar o relacionamento, vale evitar troca de telefonemas e responder e-mails, por exemplo.
Se o bem-estar emocional, a saúde, a segurança e a auto-estima estão em jogo,
porém, Jan Yager é radical: o melhor é
romper totalmente a amizade.
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