São Paulo, quinta-feira, 08 de abril de 2004
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Amigos-da-onça podem fazer mal até a saúde

Estudiosa americana lista 21 tipos de amigo-problema; quando os atritos são freqüentes, é melhor questionar a amizade

ANA PAULA DE OLIVEIRA
DA REPORTAGEM LOCAL

Que as amizades fazem bem à saúde, todo mundo sabe. A novidade é que estudiosos do assunto passam agora a investigar o mal que um amigo pode causar. É o caso, por exemplo, de quem viaja 200 km para levar o amigo, que está sem carro, visitar a tia- avó. Ou de quem, sempre que está com a amiga por perto, fica até com cara de doente, de tão sanguessuga que a colega é. Amizades problemáticas, em que promessas não cumpridas, dependência excessiva, traição e outras atitudes questionáveis imperam, podem causar de estresse a depressão. "Ter um mau amigo pode fazer alguém duvidar de si mesmo, de suas próprias habilidades. Em casos extremos, pode também colocar ambos em situações de risco", disse à Folha a socióloga americana Jan Yager, autora do livro "When Friendship Hurts" (quando a amizade machuca, inédito no Brasil), uma espécie de passo-a-passo sobre como reconhecer amizades negativas e lidar com elas. "Acredito na máxima "Diga-me com quem andas e te direi quem és". É grande a probabilidade de uma pessoa se envolver em condutas que ponham sua vida em risco, como usar drogas, por influência dos amigos", afirma a psicóloga Carolina Lisboa, professora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul e estudiosa das relações de amizade. Adotando essa lógica de "afinidade", o rapaz que costuma trair a namorada pode estimular seu melhor amigo a fazer o mesmo, exemplifica Lisboa. Qualquer relação está sujeita a altos e baixos, e as amizades não escapam a isso. Um livro não devolvido, um segredo não guardado ou um telefonema não respondido -se são esporádicas, atitudes como essas não são motivo para repensar a amizade. O problema acontece quando esses comportamentos se tornam padrão, afirma a psicóloga Mara Cristina de Lucia, diretora da divisão de psicologia do Instituto Central do Hospital das Clínicas (HC), de São Paulo.

Peso da amizade
Social por natureza, o homem tem amigos -bons ou maus- desde sempre. Nas últimas décadas, porém, a importância atribuída à amizade tem aumentado, diz Yager. "Quando os casamentos eram feitos para durar, era mais comum que intimidade e confidência fossem divididas apenas entre o casal. Como as relações amorosas não são mais tão estáveis, a importância dada ao amigo hoje é maior." Boa parte dos malefícios que um amigo-problema pode causar é justamente considerá-lo amigo e criar expectativas inadequadas, explica a antropóloga e professora da Universidade do Estado do Rio de Janeiro Claudia Barcellos Rezende, autora do livro "Os Significados da Amizade - Duas Visões de Pessoa e Sociedade" (editora FGV). Ela estudou o conceito de amizade entre cariocas e ingleses. "Os cariocas chamam até o garçom de amigo e, para eles, um mau amigo é aquele que não atende a suas expectativas. Já para os ingleses, que contam nos dedos de uma mão os amigos que possuem, os maus são os inconvenientes, aqueles que ligam tarde da noite para contar problemas", diz Rezende.

As variedades
Em seu livro, Yager lista, em ordem decrescente, os 21 tipos de amigo-problema mais comuns. O primeiro lugar cabe aos que nunca cumprem o que foi combinado, mas tipos menos freqüentes na avaliação da norte-americana também atrapalham bastante.
Recentemente, a espécie sanguessuga passou pela vida da fisioterapeuta Maria Aparecida Garcia da Silva, 43. "Como sou mais velha do que ela, sempre fiz o papel de mãezona, fazia tudo por ela. Na primeira vez em que me recusei a lhe fazer um favor, ela mudou completamente. Nem o presente que lhe dei no Natal ela agradeceu."
Às vezes, porém, o problema não está no outro. A psicanalista Solange Assumpção, 53, só conseguiu entender a relação que tinha com um amigo quando admitiu que o invejava. "Sempre pensei que a dificuldade era dele, mas percebi que era eu que invejava seu sucesso."
"É um exercício de consciência. O primeiro passo para saber se o amigo causa mais mal do que bem é se perguntar por que mantém laços de amizade com aquela pessoa", diz o professor de psicologia da PUC-SP Miguel Perosa.
Essa resposta pode ser surpreendente e não muito agradável. "Essa auto-avaliação pode até fazer com que a pessoa enxergue que ela pode ser a parte problemática da relação", afirma o professor. E não é fácil aceitar que você só tolera aquela pessoa porque ela pode ser útil na sua carreira.
Se existe hostilidade entre as partes ou se a relação está muito abalada, orienta Perosa, o melhor a fazer é se distanciar por algum tempo. Para esfriar o relacionamento, vale evitar troca de telefonemas e responder e-mails, por exemplo.
Se o bem-estar emocional, a saúde, a segurança e a auto-estima estão em jogo, porém, Jan Yager é radical: o melhor é romper totalmente a amizade.


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