São Paulo, quinta-feira, 10 de maio de 2001
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s.o.s. família

ROSELY SAYÃO

O prazer que as fantasias sexuais dão

Quem é capaz de escapar do apelo erótico de cada dia? E não falo apenas dos programas da televisão, dos filmes, das propagandas e do que vemos em jornais e revistas; falo, principalmente, de um estilo de vida moderno que todos somos compelidos a perseguir. Hoje, ter uma vida sexual satisfatória, criativa, rica, intensa, regular e frequente, prazerosa e duradoura faz parte do "pacote" do que consideramos viver bem. Haja saúde, haja investimento, haja confusão.
Bem, o fato é que, com maior ou menor liberdade de pensamento e expressão, a prática sexual sempre foi associada ao prazer, com mais tranquilidade íntima para alguns e menos para outros. Quando o assunto ainda era impróprio, muitos anseios e muitas fantasias e vontades eram simplesmente banidas pela pessoa por serem consideradas impróprias, anormais, doentes ou, no mínimo, inadequadas. E, quando eram insistentes demais para serem suprimidas, provocavam grandes angústias e sofrimentos.
Isso não acabou e talvez não acabe nunca, mas muito constrangimento se amenizou com a mudança dos costumes em relação ao assunto. Um constrangimento que parece ter perdido a pesada carga moralista que tinha é o referente ao que as pessoas sentiam com o conteúdo do que conhecemos como "fantasias sexuais".
Quem não tem, pelo menos algumas vezes ao dia, algum pensamento com imagem erótica? Na correria do dia-a-dia sempre há espaço para essas fantasias. Tais pensamentos, ricos em detalhes nas imagens, podem apenas supor um envolvimento sexual com uma pessoa de imagem pública, o que não é incomum em tempos de fotos provocantes de homens e mulheres sensuais. Outras fantasias podem ser um pouco mais apimentadas: incluir variações sexuais consideradas radicais, como encontros eróticos em grupo, práticas sadomasoquistas, atos de voyeurismo e outras mais.
Claro que muitos nem reconhecem que têm tais fantasias, pois elas podem passar despercebidas. Mas, de algum jeito, elas cumpriram seu papel: realizar um desejo que, na vida real, seria impraticável -ou quase.
Mas impraticável por quê? Porque a pessoa tem princípios e valores que norteiam seu comportamento, seu jeito de se relacionar com a vida, e muitas dessas fantasias se chocam com esse modo de viver. O resultado, então, de realizar a fantasia seria fonte de conflito e angústia, e não de prazer.
Mesmo assim, para alguns essas fantasias se transformam em vontade de realização. E aí começa uma grande confusão. Vou tomar como exemplo algumas perguntas que se tornaram frequentes no meu bate-papo com adultos pela internet a respeito da sexualidade. Muitos homens e mulheres, em geral casados e heterossexuais, indagam se devem ou não realizar encontros de troca de casais, se seria normal ou não assistir a um relacionamento sexual da mulher ou do marido com outra pessoa e se isso poderia prejudicar o relacionamento do casal.
Na base desse anseio há uma busca: a da realização plena e quase absoluta da vida sexual e a busca do prazer completo. Tarefa impossível. Mas, como estamos impregnados com a idéia de viver bem, realizar algumas fantasias, mesmo exóticas, passa a ser visto como fato possível e viável. Para alguns, vira obrigação.
Calma lá: vamos devagar com o andor e o ardor, que o santo é de barro. Uma fantasia sexual, seja ela do tipo que for, não precisa ser realizada na vida real para satisfazer. A simples existência já dá prazer. É que, no plano do pensamento, somos quase livres: os únicos empecilhos que existem são os internos, ou seja, as censuras de cada um.
Na ânsia moderna de ter uma vida sexual prazerosa, muitas pessoas optam por tornar concretas certas fantasias sem perceber que, agindo assim, colocam em risco os laços, os relacionamentos e os compromissos que priorizaram na vida. É aí que mora o perigo.


ROSELY SAYÃO é psicóloga, consultora em educação e autora de "Sexo É Sexo" (ed. Companhia das Letras); e-mail: roselys@uol.com.br


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