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São Paulo, quinta-feira, 13 de novembro de 2003
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Sintomas como cansaço e dores musculares surpreendem os pacientes anos depois da doença e confundem até os médicos

Síndrome dificulta rotina de quem teve poliomielite

Marcelo Barabani/Folha Imagem
Bernardete Olivério sentia dor e fraqueza


DANIELLE BORGES
DA REPORTAGEM LOCAL

Há cinco anos, o clínico-geral Roberto Seixas, 53, começou a se sentir mais cansado. O corredor do hospital que ele percorria diariamente passou a parecer cada vez mais longo. "Precisava parar para descansar. Sentia muita fraqueza e cansaço", diz ele. Mesmo sendo médico, Seixas precisou pesquisar para descobrir que estava com síndrome pós-pólio, problema que acomete pessoas que, como ele, tiveram poliomielite. Embora o médico francês Jean-Martin Charcot (1825-1893), considerado um dos pais da neurologia moderna, já chamasse a atenção para a síndrome em 1876, pouco se sabe sobre ela. Até no meio médico a síndrome permanece desconhecida, e seus sintomas -dores musculares, cansaço, fadiga e alterações no sono- são facilmente confundidos com estresse. Isso é um complicador para boa parte dos pacientes que tiveram pólio há 20 ou 30 anos e imaginam ter superado as limitações que a doença lhes infringiu. Uma pesquisa realizada pelo setor de doenças neuromusculares da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo) aponta que entre 60% e 80% deles sofrem com a síndrome pós-pólio atualmente, mas é difícil chegar ao diagnóstico correto, o que incentivou os próprios pacientes a se organizarem (leia mais na pág. ao lado). Um exemplo da falta de informação é o caso da professora Bernardete Estrela Olivério, 48. A pólio que ela teve aos noves meses de idade causou problemas no desenvolvimento na perna direita. Após anos de fisioterapia, em 1997, ela começou a sentir dores no membro afetado pela doença. Em nenhum momento, porém, a professora relacionou esses sintomas com a pólio. "Comecei a sentir fraqueza para andar até que, um dia, não consegui sair do lugar", relembra. Depois disso, Olivério começou uma via-sacra de cinco anos por consultórios de neurologistas e ortopedistas. "Todos faziam perguntas sobre meu histórico de saúde, mas nenhum mencionou a síndrome." A resposta veio quando ela leu um artigo assinado por Seixas. "Eu me identifiquei com todos os sintomas descritos por ele."

Hipótese
A medicina ainda não chegou a uma conclusão sobre o que causa a síndrome pós-pólio. De acordo com uma tese que tem sido aceita nos últimos anos, a doença pode estar associada à morte, por esgotamento, dos neurônios responsáveis pelo movimento. "Com a poliomielite, boa parte dos neurônios motores morre, e os que sobram são condicionados a trabalhar por três ou até por cinco neurônios", explica Berenice Cataldo, do Ambulatório de Doenças Neuromusculares da Santa Casa de São Paulo. "As primeiras manifestações da síndrome são a fadiga e a fraqueza muscular, como se as fibras estivessem perdendo a força", diz Rogério Carvalho de Castro, ortopedista da AACD (Associação de Assistência à Criança Deficiente). No entanto esses sintomas nem sempre são suficientes para que o paciente procure um médico. "Muitos confundem a síndrome com estresse, e até os médicos têm dificuldades para fazer o diagnóstico", afirma Acary Bulle de Oliveira, chefe do setor de doenças neuromusculares da Unifesp. Segundo Oliveira, a falta de intimidade com a síndrome é fruto da falta de interesse dos profissionais na área. "Quando houve a epidemia de pólio [leia mais na pág. ao lado], muitos médicos se especializaram na doença, mas poucos continuaram pesquisando o assunto." Por conta das poucas pesquisas existentes sobre a síndrome pós-pólio, a medicação indicada aos pacientes é apenas paliativa. "Usamos medicamentos para aliviar os sintomas", afirma Oliveira.

Adaptação da rotina
Após o diagnóstico, pacientes da síndrome pós-pólio precisam adaptar sua rotina diária às limitações que a doença lhes impõe. "Fazia parte da mentalidade das pessoas exigir tudo de quem tivesse alguma sequela da pólio. Hoje, sabemos que esse não é o caminho", explica Oliveira.
A receita para os pacientes que tiveram pólio na infância é poupar o corpo. Segundo Oliveira, os pacientes devem prevenir o cansaço e esgotamento físico. "Não é indicado, por exemplo, subir e descer escadas, andar longas distâncias ou permanecer muito tempo de pé." Ele recomenda descansar um pouco após fazer qualquer tipo de atividade.
Prevenir o cansaço, porém, não significa tornar-se sedentário e eliminar os exercícios físicos do cotidiano. "Os exercícios devem ser feitos, mas com critério", diz Castro. Entre as atividades recomendadas pelos especialistas estão a natação e a hidroginástica.


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