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s.o.s. família
Diferença entre regras e leis familiares
rosely sayão
Se tem uma coisa que atrapalha a vida de filhos e alunos são as proibições e as obrigações que vão surgindo, pouco a pouco, na
vida deles. Em casa o filho não pode mexer lá,
não pode subir ali, precisa comer tal hora, em
determinado lugar, tem que ir pra escola...
E na escola? Tem que entrar na hora do sinal,
só pode sair depois que a aula termina e toca a
campainha, só pode tomar o lanche na hora
do recreio... leis e regras por todo lado!
Mas se tem coisa que complica a vida dos filhos e alunos é o fato de eles não conseguirem
entender por que é que algumas vezes não há
outro jeito a não ser aceitar a proibição ou
cumprir a obrigação, sem dó nem perdão, e
outras vezes dá pra escapar, sair pela tangente,
argumentar e ganhar. Por que isso acontece?
Em parte porque os adultos vivem tentando
contornar ou transgredir a lei. Qualquer pessoa pode atestar: em muitos postes da cidade
há um cartaz com os dizeres: "Foi multado?
Ligue para...". Outro anúncio é sobre um artifício que, colocado na placa do carro, impede
que seu número seja fotografado pelo radar
eletrônico.
Isso sem falar no mecanismo que avisa o
motorista que ele entrará em área coberta por
radar de controle de velocidade. Por causa disso os adultos se embaraçam quando precisam
garantir que o filho ou aluno respeite uma lei
ou cumpra uma regra.
Mas há também a confusão que os adultos
fazem entre regra e lei. São coisas diferentes! E,
se estamos interessados em educar democraticamente, é importante conseguir distinguir
lei de regra, pois essa diferenciação é que vai
permitir a negociação entre pais e filhos, entre
professores e alunos.
Uma família pode dar importância ao fato
de o filho ter que voltar para casa no horário
combinado anteriormente, por exemplo. Se
para os pais isso não tem discussão, pelo menos enquanto o filho estiver sob a responsabilidade deles, isso ganha o valor de lei. Significa,
portanto, que voltar para casa no horário
combinado não muda com a situação, não varia conforme o contexto. O filho até pode ter
boas explicações para um atraso, mas nada o
livra da responsabilidade de arcar com uma
pena por transgredir a lei familiar. A lei não
permite negociação. Não é assim quando se
estaciona o carro em local proibido? Não há
argumento para livrar o adulto dessa multa.
Ou melhor, não deveria haver.
Já o horário do retorno pode ser combinado
a cada programa que o filho vai fazer. O horário de retorno é, portanto, uma regra, pois é
passível de mudanças, varia conforme o contexto. Se o filho não concorda com o horário
estabelecido pelos pais para retornar de um
passeio, ele pode, ele tem o direito, sim, de tentar argumentar para conseguir adaptar melhor o horário às suas vontades ou necessidades. Ele tem espaço para fazer isso porque o
horário determinado é regra, não uma lei.
Mas, claro, ele só terá êxito nessa empreitada
se usar os argumentos adequados e se for ouvido e considerado pelos pais ou professores.
Entretanto ele só vai aprender a saber quando negociar, a respeitar a lei e arcar com a pena da transgressão, quando for o caso, se os
pais e a escola assumirem seu lugar de autoridade nesse processo educativo e dialogarem
-quando possível- e aplicarem a penalidade -quando necessário.
O fato de os filhos e alunos, principalmente
adolescentes, constatarem que os adultos que
os educam muitas vezes transgridem as leis
não deve ser desculpa para que façam o mesmo ou para que não sejam penalizados quando transgredirem alguma lei familiar ou escolar. Afinal, está nas mãos deles a possibilidade
de tornar este mundo um pouco melhor para
todos. E, sem respeito às leis, isso é impossível.
ROSELY SAYÃO é psicóloga, consultora em educação e
autora de "Sexo É Sexo" (ed. Companhia das Letras); e-mail: roselys@uol.com.br
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