São Paulo, quinta-feira, 18 de outubro de 2001
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Malhador se vicia nos exercícios

KÁTIA FERRAZ - FREE-LANCE PARA A FOLHA

Indivíduos que praticam exercícios físicos em excesso podem integrar a categoria dos chamados dependentes compulsivos, segundo estudo a ser publicado neste ano na revista americana "Medicine & Science in Sports & Exercise", de autoria do professor de educação física da Unifesp Daniel Alves Rosa. E a dependência da malhação é similar à dos usuários de drogas, diz o professor Marco Túlio de Melo, um dos orientadores da pesquisa. "A idéia original era tentar observar o grau de estresse e de irritabilidade provocado pela interrupção na frequência da prática de exercícios. Com esse objetivo, aplicamos um questionário para detectar as reações antes e depois da prática em três grupos distintos: sedentários, praticantes moderados (prática de três vezes por semana, em média) e praticantes inveterados (de seis a sete vezes na semana)", explica Túlio. O estudo apontou relações intensas de dependência e compulsão nos chamados praticantes inveterados. Esse resultado possibilitou uma analogia com a síndrome de abstinência encontrada nos usuários de drogas psicotrópicas e de álcool. "A vontade de fazer exercícios torna-se tão obsessiva que os indivíduos chegam a interromper suas atividades diárias e até a largar tudo, como família e trabalho, para correr ou jogar com chuva e frio, por exemplo, tudo em nome da atividade física. O objetivo deixa de ser o bem-estar, e a pessoa passa a buscar mais a redução da ansiedade do que uma boa forma física", afirma Rosa. O estudo revelou um alto índice de liberação de beta-endorfina -uma das substâncias responsáveis pela sensação de prazer- no organismo de pessoas que se exercitavam diariamente ou pelo menos seis vezes por semana.

Síndrome de abstinência
A dependência física é caracterizada quando ocorrem o prejuízo das relações interpessoais, a mudança de comportamento e a chamada síndrome de abstinência. Assim como em outros tipos de dependência, nem todos os compulsivos por exercício são considerados dependentes.
Existem dois traços básicos que caracterizam uma dependência: reforço positivo e reforço negativo. As propriedades de reforço positivo do exercício estariam associadas à sua capacidade de alterar os níveis dos principais neurotransmissores envolvidos com a sensação de prazer.
As propriedades de reforço negativo estariam ligadas à sua capacidade de minimizar estados negativos de humor. Para alguns indivíduos, a prática de exercícios serviria para reduzir ou extinguir um estado geral desagradável (ansiedade, estresse ou depressão), contribuindo para o estado de dependência.
Num universo de 66 pesquisados -20 sedentários, 23 classificados como possíveis dependentes e 23 considerados praticantes "normais"-, observou-se melhora no humor e diminuição sensível da ansiedade após a prática dos exercícios. Para tanto, segundo o especialista, não importa a intensidade dos exercícios, mas a frequência de sua prática.
O próximo passo dos pesquisadores é investigar o mecanismo de ação desse tipo de dependência. Enquanto isso, os especialistas recomendam que os praticantes se conscientizem que as atividades físicas não devem prejudicar as relações interpessoais. Exercício é saudável, mas com cautela.


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