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São Paulo, quinta-feira, 19 de junho de 2003
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s.o.s família - rosely sayão

Qualquer filho está sujeito a consumir droga

Se há assunto complexo e delicado de tratar com pais e escolas, o uso de drogas é um deles. Costuma provocar reações passionais tão intensas que fica particularmente difícil -quando não impossível- manter uma reflexão equilibrada sobre o problema.
Já se discutiram amplamente os prováveis motivos que levariam ao uso -ou melhor, ao abuso- das drogas. O que se pode concluir é que não há um motivo único, mas diversos, já que não temos um adolescente padrão, e sim adolescentes bem diferentes.
Alguns começam a usar drogas por pura curiosidade: é preciso reconhecer que há uma superexposição do tema e isso estimula a curiosidade da garotada. Outros usam para tentar diminuir ou dissimular algum sofrimento que incomoda e que faz parte da vida. Há também os que têm problemas familiares, escolares ou de outra ordem e buscam alívio da pressão que isso provoca. Outros querem ser o que não costumam ser, agir de modo diferente, enturmar-se, encontrar mais prazer ou mais felicidade etc. Enfim, essa discussão nunca levou a nada.
Por isso os discursos em tom acusatório que elegem os pais, a escola ou as más companhias, por exemplo, como os maiores responsáveis pelo encontro dos jovens com as drogas são totalmente equivocados. Os jovens usam drogas principalmente porque elas existem, estão aí, são oferecidas pela sociedade e alguma coisa interessante têm para oferecer. Mas, além disso, elas têm também efeitos nocivos, e isso não se pode negar.
Acontece que a maioria das abordagens a respeito das drogas não é eficaz para a prevenção de seu uso ou dos problemas de seu uso abusivo. Adianta colocar medo, apontar os malefícios, as consequências desastrosas possíveis? Pelo jeito, não. Eles continuam usando, experimentando, arriscando-se. Vale a pena apostar em um mundo sem drogas, em jovens perfeitos que resistam aos apelos que elas fazem? Também não. As drogas resistiram até hoje a todos os tipos de abordagem.
O pais têm medo das drogas. É normal e realista sentir isso. Nenhum tipo de educação oferece garantia de que o filho não se torne usuário ou mesmo dependente. A questão é fazer o que é possível.
Em primeiro lugar, é bom não esperar que o filho seja um santo. Ele pode, sim, não resistir à tentação da droga, tão onipresente no mundo atual. E, quando se espera ou se trabalha pelo ideal, o possível nunca é considerado.
Em segundo lugar, os pais podem -e devem- fazer o controle da vida dos filhos enquanto eles não têm mecanismos de auto-regulação. Isso significa colocar-se a par dos lugares que frequentam, colocar limites de horário e aplicar sanções quando as regras são transgredidas, por exemplo. É assim que ele aprende a se cuidar: sendo cuidado.
Outra coisa: muitos pais esquecem que boa parte da educação do filho se dá pela observação atenta que ele faz das atitudes familiares. Quantos pais já não se alcoolizaram na frente dos filhos? Isso é bem perigoso, mesmo que tenha sido uma só vez. Permitir que o filho use drogas em casa também oferece riscos altos: ele pode sentir-se autorizado a usar, sem receio nenhum. Mas o mais importante talvez seja admitir que os pais não são onipotentes.
E a escola? Há quem afirme, hoje, que as escolas se transformaram no maior centro de distribuição e de concentração de drogas. Não é bem assim. Claro que há drogas na escola também. É que ela representa o mundo: o que há fora da escola há dentro dela também. Mas, como instituição educativa, ela precisa deixar claros seus limites e suas regras, e isso nem sempre é feito. No entanto isso não basta. Ela precisa ir além e adotar algum trabalho sensato, realista, eficaz e realmente educativo.
Hoje, a abordagem do uso de drogas que se tem mostrado mais eficaz é a que adota a política da redução de danos. Escolas e pais precisam conhecer melhor esse tipo de trabalho. Sugiro um livro: "Que Droga é Essa?", de Aidan Macfarlane, Magnus Macfarlane e Philip Robson (200 págs., R$ 25, Editora 34, tel. 0/ xx/11/3816-6777).


ROSELY SAYÃO é psicóloga, consultora em educação e autora de "Como Educar Meu Filho?" (Publifolha); e-mail: roselys@uol.com.br


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