UOL


São Paulo, quinta-feira, 19 de junho de 2003
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Empregada principalmente no tratamento de adolescentes e crianças, a técnica mostra como controlar as ondas cerebrais

Biofeedback auxilia quem sofre de déficit de atenção

GUSTAVO PRUDENTE
FREE-LANCE PARA A FOLHA

Com frio na barriga e expressão de derrota no rosto, o filho conta para a mãe que perdeu a carteira -pela segunda vez na mesma semana. Para quem sofre de TDAH (transtorno do déficit de atenção com hiperatividade), essa pode ser uma situação bem comum. As sucessivas frustrações de quem não consegue se concentrar, mesmo sob tratamento medicamentoso, podem causar baixa auto-estima e problemas de sociabilização. A novidade é que o biofeedback está ajudando os portadores a lidar com essas dificuldades. Criado na década de 60 nos Estados Unidos, o biofeedback utiliza aparelhos para ajudar a pessoa a aprender ou reaprender a controlar funções fisiológicas. No Brasil, os primeiros equipamentos chegaram há cerca de dez anos e vêm sendo usados principalmente por fisioterapeutas. Mas outros problemas, como incontinência urinária e compulsão alimentar, também podem ser tratados com essa técnica. "Aplicamos eletrodos na pessoa, e um computador traduz as reações fisiológicas quando ela é submetida a certos estímulos. No caso dos portadores de TDAH, os eletrodos são colocados na cabeça para medir as ondas cerebrais", explica Dirce Perissinotti, psicóloga dos hospitais das Clínicas e 9 de Julho, ambos em São Paulo. Segundo ela, o TDAH possui dois "pólos": nos portadores hiperativos, há alteração na frequência das ondas beta, relacionadas aos estados de excitação; nos mais apáticos, a diferença está nas ondas alfas, associadas ao relaxamento. Em ambos os casos, a pessoa tem dificuldade de se concentrar, seja numa aula, seja num objetivo a longo prazo. O biofeedback permite que o portador conscientize-se da relação entre o estado físico e as ondas cerebrais e, assim, aprenda a controlá-las. "Com os recursos multimídia de um computador, podemos criar um jogo de boliche, por exemplo, em que a bola se aproxima dos pinos à medida que o paciente controla as ondas cerebrais", diz Perissinotti. Para ganhar o jogo, um hiperativo terá de aprender a relaxar, e um apático, a ficar mais estimulado. O recurso é usado especialmente com crianças e adolescentes, que somam a maioria dos pacientes. O TDAH, que atinge de 3% a 5% da população mundial, começa a se manifestar antes dos sete anos de idade, e é justamente na infância que sintomas e dificuldades costumam ser mais fortes.

Traumas
Embora a teoria mais aceita na comunidade médica relacione o transtorno à genética, é recorrente a existência de traumas infantis que agravam a síndrome e levam o portador a estabelecer uma auto-imagem negativa. Por isso, na primeira sessão de biofeedback, Perissinotti induz o paciente a se lembrar de momentos bons e ruins ou provoca situações que o ajudam a identificar pontos sensíveis.
A psicóloga alia o trabalho com eletrodos à análise verbal e à terapia corporal, estimulando o relaxamento de uma determinada parte do corpo, por exemplo. "É importante também manter o remédio. O melhor tratamento é o que combina as técnicas."
De acordo com o psiquiatra Ênio Roberto de Andrade, presidente da ABDA-SP (Associação Brasileira do Déficit de Atenção -Regional São Paulo), o medicamento usado na maioria dos casos é o metilfenidato, um estimulante. "Em 75% a 85% das vezes, a pessoa consegue controlar o transtorno", diz ele.
Para Perissinotti, usar apenas o remédio, porém, é como dar o peixe ao paciente sem ensiná-lo a pescar. O TDAH não pode ser curado, apenas controlado, e o portador precisa aprender a conviver com o transtorno, argumenta ela.
"Não me oponho ao biofeedback, mas não há 100% de comprovação científica. Para mim, é como a homeopatia: há gente que usa e fica bem", diz Andrade. Já a psicóloga afirma que os resultados são muito bons -tanto no Brasil como no exterior. "Nos EUA, no Canadá e na Bélgica, a técnica permitiu muitos avanços no tratamento do TDAH e da depressão", diz ela.


Texto Anterior: alecrim: Sopa-refeição
Próximo Texto: Saiba mais sobre a TDAH
Índice


UOL
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.