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s.o.s. família
ROSELY SAYÃO
Madrasta não muda os rumos da educação
"Madrasta: como aprender a ser uma em dez lições?" Essa pergunta, brincalhona e ao mesmo tempo séria, veio de uma leitora que se casou com um homem divorciado e com filhos já crescidos, quase chegando à adolescência. A situação dessa leitora não é atípica nos dias atuais. Ao contrário, o divórcio e as separações judiciais possibilitaram o
aparecimento de novas estruturas e configurações familiares, que se tornam cada vez mais
frequentes em nossa sociedade.
É bom lembrar que essa mudança na constituição da família contribuiu bastante para o
surgimento de um comentário muito repetido
-quase sempre em situações de crise- por
pessoas que trabalham com a educação de
crianças e adolescentes: "a família está desestruturada, e os filhos pagam por isso".
O fato é que a estrutura tradicional e mais reconhecida de família -pai, mãe e filhos-
perdeu a primazia, apenas isso. Hoje temos
muitas famílias com padrões diferentes do
modelo tradicional, e isso não significa necessariamente problemas na educação desses filhos. Aliás, a pergunta de nossa leitora mostra
exatamente sua preocupação em encontrar
uma boa forma de se relacionar com crianças
que não são seus filhos e que vão conviver com
ela, ou seja, o que ela busca é justamente encontrar a melhor maneira de construir uma
nova estrutura familiar. Também não é nada
atípica essa postura.
O papel da madrasta, entretanto, é delicado
e ingrato. Antes de tudo, já vem a idéia, bem
solidificada pelas histórias infantis, de que a
madrasta é uma mulher que vai, mais cedo ou
mais tarde, prejudicar o enteado. O início do
relacionamento já começa, portanto, prejudicado por esse estereótipo, e é preciso, então,
uma dose extra de bom senso e maturidade
para que esse momento seja superado sem jogos de sedução. E depois disso?
O relacionamento futuro depende, em parte, do tipo de convivência que será estabelecido entre a nova mulher do pai e a criança. Em
alguns casos, essa convivência acontece durante a maior parte do tempo da vida da criança e, em outros, apenas nos fins de semana e
nas férias. Em ambos os casos, entretanto, a
madrasta precisa entender que não é a mãe da
criança e que nem pode pretender ocupar esse
lugar. Se todos os adultos têm clareza dessa situação, a criança se sente menos ameaçada e
mais confortável para se comportar de modo
espontâneo com os membros da nova família.
Aí é que se abre a possibilidade de surgirem os
conflitos.
Normal. Afinal, qual é a família que não enfrenta conflitos? Se há convivência entre várias
pessoas, há regras que precisam ser respeitadas; se há regras, há transgressões e conflitos.
Além disso, também como em qualquer família, há diferenças no modo de conceber a educação das crianças. Nossa leitora, por exemplo, diz que não sabe o que fazer quando o marido age com os filhos de um modo com que
ela não concorda. Aí mora um grande perigo:
o de conflitos entre o novo casal serem deslocados para a relação da mulher com os filhos
do marido.
A madrasta dificilmente vai conseguir mudar o rumo que tomou a educação dos filhos
do marido, e é preciso aceitar esse limite. Se ela
tem uma relação franca com o companheiro,
pode tentar refletir com ele sobre a sua maneira de se relacionar com os filhos e de prepará-los para a vida. Além disso, deve deixar claras
as regras familiares e se empenhar para que
elas sejam respeitadas por todos na casa. E encorajar o marido para que ele faça o mesmo.
É assim, enfrentando os limites de seu papel
- ora para acatá-los, ora para superá-los-,
suportando os desentendimentos do dia-a-dia
com paciência, investindo no diálogo com o
marido e mantendo sempre uma posição
adulta, que a madrasta pode colaborar com a
formação dos filhos do marido. Isso não é
pouco e não se aprende em dez lições, o que
nossa leitora bem-humorada já sabia de antemão. Sinal de que ela se dispõe a aprender
com a experiência, e esse é o melhor caminho.
Como em qualquer família.
ROSELY SAYÃO é psicóloga, consultora em educação e
autora de "Sexo É Sexo" (ed. Companhia das Letras);
e-mail: roselys@uol.com.br
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