UOL


São Paulo, quinta-feira, 23 de outubro de 2003
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

s.o.s. família - rosely sayão

Como pais e alunos podem melhorar o ensino superior

Os pais até já estão acostumados: ter filhos na escola supõe alguns compromissos. Alguns desses compromissos são as reuniões que a escola promove, principalmente no princípio e no final de cada ano letivo. O conteúdo e a maneira de essas reuniões serem conduzidas pelos profissionais da escola são o que confere -ou não- um valor importante à parceria família e escola na educação. Mas, quando os filhos estão cursando faculdade ou quase lá, ser chamado para reunião na escola é, no mínimo, vergonhoso e comprometedor. Para os filhos e para a educação.
Foi meio por acaso que soube que uma escola de terceiro grau estava adotando a prática de chamar os pais de seus alunos dos anos iniciais para reuniões. Confesso que fiquei muito surpresa e perplexa com o fato, mas não fiz mais indagações nem reflexões porque achei que fosse um caso isolado. Acontece que, pouco tempo depois, soube que vários cursinhos pré-vestibulares faziam o mesmo. Aí já passei a achar que não se tratava de um caso ou outro. Saí averiguando e -pasme!- constatei que se trata de prática quase comum. Isso merece uma boa conversa.
Qual é mesmo o objetivo da educação, tanto familiar quanto escolar? Introduzir as crianças e os adolescentes no mundo para que, assim, possam construir seu próprio modo de viver. Desse modo, quem educa precisa sempre supor a chegada da maturidade, da possibilidade de o jovem viver por conta própria.
A educação como preparação, ou seja, como tutela para a inserção no mundo para quem ainda não tem recursos e autonomia para viver por si precisa ter um fim. Não é possível determinar quando esse fim chega, mas, seguramente, retardá-lo significa apostar na dependência, no controle e, portanto, na falta de liberdade.
Quando pais e professores universitários acreditam que precisam reunir-se para conversar sobre qualquer coisa que seja da vida escolar dos jovens -e esse talvez seja apenas um dos sinais de que o ensino superior está confuso-, é porque consideram seus alunos e filhos incapazes de assumir suas responsabilidades, de fazer suas escolhas e de se comprometerem com elas, de arcar com os ônus e os bônus de sua juventude, de se relacionarem sem intermediários com a vida, que é deles. Pais e professores universitários se agarram ao palco da vida, quando deveriam estar é nas coxias. Esses jovens não sabem, mas eles estão sendo desalojados de seu lugar na vida.
Tenho recebido várias cartas e e-mails de alunos universitários que reclamam do ensino na faculdade e do relacionamento que os professores têm com eles. Uma delas, em especial, me chamou a atenção. Trata-se de um jovem que se diz filho dessas "escolas-clube", referência à coluna publicada em 4/9.
Ele questiona o papel da faculdade. Não concorda com a visão de um conhecimento voltado apenas ao mercado de trabalho nem com a falta de compromisso dos professores com a formação de seus alunos. Ele gostaria que a faculdade fosse um centro de renovação do conhecimento, com professores que, além de especialistas em sua área, soubessem comunicar o que sabem. Outros acrescentam que não gostam de ser tratados nem como adolescentes nem como iguais ao professor. Bem, se o papel da escola de ensino fundamental e médio não se ajusta à sua prática, o da faculdade também não.
As famílias podem ajudar a melhorar a escola que ministra o ensino universitário, sim, mas de outras maneiras. Em primeiro lugar, conversando com o filho sobre o que acontece por lá, estimulando-o a ser crítico e participativo em relação à formação que recebe e encorajando-o a arcar com seus estudos -ou com a falta dele. Em segundo, ignorando os convites para comparecer a reuniões, ou melhor, repassando o convite ao filho. Não seria maravilhoso a faculdade encontrar seus próprios alunos no dia da reunião de pais? Seria lindo, já que é com os alunos que a faculdade deve exercer o seu ofício.


ROSELY SAYÃO é psicóloga, consultora em educação e autora de "Como Educar Meu Filho?" (Publifolha); e-mail: roselys@uol.com.br


Texto Anterior: poucas e boas: Atletas apresentam sintomas de fibromialgia
Próximo Texto: outras idéias - Thereza Soares Pagani ("Therezita"): Eu comigo. Eu mais eu. Eu só eu
Índice

UOL
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.