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São Paulo, quinta-feira, 24 de abril de 2003
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s.o.s família - rosely sayão

Quando o bom senso é a melhor saída dos pais

Muitas mães e pais que têm filhos -principalmente filhas- entre dez e 12 anos estão perdidos porque não sabem se tratam os filhos como crianças ou como adolescentes. E não resolve nada enquadrá-los naquela categoria chamada de "pré-adolescente" -com a qual não concordo, já falamos disso-, porque isso não ajuda em nada.
Motivos para essa confusão os pais têm de sobra: a puberdade está ocorrendo mais cedo, e muitas garotas menstruam pela primeira vez já aos dez anos, o que precipita o início da adolescência. Mesmo as que ainda não tiveram a menarca já se comportam como adolescentes porque o comportamento social compactua, aprova e até pressiona para que seja assim. Na verdade, até os pais entram nessa mesmo sem perceber. O fato é que crianças de dez ou 11 anos querem sair sem nenhum adulto responsável junto, querem namorar, e muitas já "ficam" com pares em festas noturnas embaladas com bebidas alcoólicas e listam numericamente os beijos na boca conquistados ou roubados.
Pais e mães que acham inadequados programas desse tipo têm a maior dificuldade em segurar o filho. É que boa parte dos amigos agem assim, e aí vêm as dúvidas: "Será que estou exigindo demais do meu filho? Será que estou fora do tempo? Será que está na hora de liberar?". Perguntas como essas tiram o sono de pais, por isso vamos discutir o assunto.
Em primeiro lugar: mesmo tendo a mesma idade, frequentando a mesma escola e série e manifestando interesses e comportamentos semelhantes, garotas e garotos são bem diferentes. Algumas meninas de 11 podem ser mais cuidadosas consigo mesmas do que outras da mesma idade e podem reconhecer riscos em situações em que outras se arriscam sem o menor receio, por exemplo. Alguns meninos de 13 podem ser bem mais moleques do que outros de 12 e abrir mão com facilidade de suas convicções e vontades só para se identificar com o grupo. Por isso é bom observar bem o filho antes de tomar uma decisão, tendo-o como referência. Mas atenção: não vale levar em conta só o que ele diz. É preciso considerar o que ele faz porque, nessa idade, nem sempre ele é capaz de agir na hora do impulso ou do aperto conforme pensa.
Em segundo, é bom lembrar que os pais pensam muito diferente uns dos outros sobre a educação dos filhos. Há pais cuidadosos, que acompanham de perto o desenvolvimento da adolescência do filho para se assegurarem de que ele assume a autonomia com responsabilidade à medida que vai sendo liberado da tutela dos pais, e há os que imaginam que o filho passa da dependência à autonomia de uma hora para a outra e confiam cegamente nas lições que passaram. Por isso é bom conhecer os pais dos amigos com quem o filho vai viajar, que vão recebê-lo para um fim de semana ou para uma festa em casa, por exemplo. Assim, fica mais fácil decidir se o filho deve ou não acompanhar os amigos.
Finalmente, se os pais acreditam que o filho é muito novo para realizar determinados programas ou para ter certos comportamentos, enquanto não se convencerem do contrário, o melhor será mesmo seguir as convicções que têm. Claro que o filho vai berrar, sofrer, reclamar e emburrar com toda a razão ao se defrontar com os limites familiares impostos. Mas nada disso tem efeito fulminante sobre a criançada e, como disse uma mãe zelosa, "enfrentar dificuldades também ajuda a educar e a formar".
É: hoje ninguém tem condições de garantir quando começa e quando termina a adolescência, e isso é uma pedra no caminho da prática educativa dos pais. Por isso o bom senso deve prevalecer: é bom ter os olhos voltados para o mundo em que o filho vive e convive sem perder de vista os princípios da família. Sem esse equilíbrio, que é responsabilidade dos pais buscar, o filho corre o risco de deixar de ter o vínculo de pertencimento com a família sem ter ainda feito, com consciência, o mesmo vínculo com outro grupo. E ele precisa sentir que pertence a um grupo para ter referências de identificação, para saber quem é.


ROSELY SAYÃO é psicóloga, consultora em educação e autora de "Sexo é Sexo" (ed. Companhia das Letras); e-mail: roselys@uol.com.br.


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