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São Paulo, quinta-feira, 24 de julho de 2003
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s.o.s família - rosely sayão

Escolas confundem sexo com sexualidade

Outro dia, uma conversa que ouvi de um grupo de adolescentes, todos meninos entre 13 e 15 anos, me fez pensar nas várias correspondências que já recebi de pais e mães preocupados com a atuação da escola no que diz respeito à educação sexual. Nesse grupo, formado por garotos que provavelmente cursam escola particular, as conversas comentavam os feitos sexuais deles e de outros colegas com as empregadas das famílias.
Fiquei um bom tempo ouvindo o que eles diziam. O preconceito e os estereótipos contidos nas conversas eram radicais: eles classificavam as mulheres em várias categorias sexuais e usavam adjetivos grosseiros e pejorativos para descrever a maneira de elas se vestirem e falarem, por exemplo. Isso tudo acrescentado ao modo de abordar as piadas, que deixavam claro que consideravam as garotas inferiores a eles. Isso mesmo: em pleno século 21, alguns filhos da classe média ainda se divertem praticando sexo com moças e meninas que ocupam funções que eles consideram subalternas. Isso nos faz pensar na importância e na responsabilidade social que as escolas têm com respeito à educação sexual.
Infelizmente, a maioria das escolas não trabalha com essa questão de modo organizado e sistematizado, e muitas das que oferecem essa parte da formação a seus alunos cometem vários equívocos. O primeiro deles é confundir formação com oferecer informação.
Na ânsia de trabalhar na prevenção de doenças sexualmente transmissíveis e da gravidez indesejada e precoce, as escolas planejam programas de orientação sexual em que a informação é privilegiada acima de qualquer outra questão. Mas hoje, com tudo o que os meios de comunicação oferecem, é de se perguntar: mais informação? Será que eles já não as têm em quantidade suficiente? E a escola segue confundindo informação com conhecimento e sexo com sexualidade.
Um outro engano cometido é oferecer opções moralizantes aos alunos, ou seja, a escola usa a educação sexual para colocar categorias de comportamento sexual que considera mais adequadas, menos banais, mais próprias e menos vulgares do que as que seus alunos têm e/ou dizem ter ou -pior- que os professores imaginam que eles têm. Isso não funciona, além de transgredir princípios fundamentais da educação, tais como o da busca da liberdade possível e o da autonomia.
Uma escola, ao elaborar e praticar um projeto de educação sexual, deve ter em vista que seu papel é, principalmente, desenvolver com seus alunos uma atitude crítica e reflexiva em relação à sexualidade. Para isso, deve sempre refletir e questionar os diversos conceitos e preconceitos, os valores e as crenças que existem na sociedade para abordar a questão.
É competência também da escola ajudar o aluno a distinguir o que diz respeito à intimidade e o que se refere ao convívio social. Se os adolescentes que fizeram os comentários que ouvi tivessem esse tipo de educação, no mínimo, estariam conversando em tom bem mais baixo, já que estavam em um espaço público e as aventuras sexuais são da ordem da intimidade. Além disso, pelo menos saberiam que estavam emitindo preconceitos de gênero e de classe social quando teciam seus comentários e, certamente, sentiriam-se constrangidos em ser ouvidos. Mas creio que eles acham natural esse tipo de conversa, tanto quanto o comportamento deles nas situações comentadas.
Claro que uma boa educação sexual não garante que isso não aconteça, mas, no mínimo, colabora para que os alunos fiquem mais conscientes do que fazem e são levados a fazer.
Muitos educadores -pais e professores- acreditam que a educação sexual nas escolas é item fundamental. Eles têm razão. A questão, entretanto, é como praticar essa educação, com que propósitos e como deve ser a formação dos professores que vão atuar nesse conteúdo. Você já arguiu a escola de seu filho a esse respeito?


ROSELY SAYÃO é psicóloga, consultora em educação e autora de "Como Educar Meu Filho?" (Publifolha); e-mail: roselys@uol.com.br


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