São Paulo, quinta-feira, 28 de fevereiro de 2002
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Advogada revela direitos dos doentes

KÁTIA FERRAZ - FREE-LANCE PARA A FOLHA

"Acredito que o choque de se saber portador de câncer abala qualquer pessoa. Mas é preciso pensar em coisas práticas e partir logo para a ação." A frase é da advogada Maria Cecília Mazzariol Volpe, 61, que, em janeiro de 2001, descobriu ser portadora de câncer no intestino. Hoje, após o tratamento da doença, milita em favor da divulgação dos direitos assegurados pela Constituição aos doentes de câncer e também aos portadores de enfermidades como hanseníase, tuberculose, Aids, cegueira, mal de Parkinson e contaminação por radiação.
A advogada acaba de lançar a cartilha "Faça Valer os seus Direitos", disponível no site www.oncocamp.com.br, em que se descobre, por exemplo, que portadores de câncer e de outras doenças têm direito a sacar o FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço).
"Na minha opinião, é muito importante que as pessoas briguem por aquilo a que têm direito. Não cura, mas colabora muito com o êxito do tratamento", diz ela. Leia entrevista abaixo.

Folha - Como surgiu a idéia da cartilha?
Maria Cecília Mazzariol Volpe -
Quando foi constatado meu câncer no intestino, a primeira providência que tomei foi pedir isenção da cobrança de imposto de renda sobre a minha aposentadoria, mas, para falar a verdade, não tinha idéia ainda da quantidade de direitos assegurados pela Constituição aos portadores dessa enfermidade. Procurada por uma professora que havia ouvido falar sobre uma isenção a que tinha direito, mas que não fazia a menor idéia de como proceder, dei-me conta de que precisava fazer algo a respeito, imaginando que, se ela, uma pessoa com nível qualificado, não tinha esse conhecimento, o que diria a maioria da população que lota os corredores dos hospitais públicos. Iniciei então uma ampla pesquisa sobre o assunto.

Folha - O que é importante ressaltar nessa pesquisa?
Maria Cecília -
Primeiro, que todos tomem consciência do direito de ter seu tratamento custeado integralmente pelo Estado. No caso de câncer, o tratamento pode ser dado em centros específicos e até em casa, dependendo da gravidade do quadro. Não se pode esquecer que o SUS (Sistema Único de Saúde) é mantido com o pagamento dos nossos impostos. Outro fato importante é que o tratamento do câncer exige uma série de gastos e, muitas vezes, o paciente não tem dinheiro nem para o ônibus. Por isso é importante ele ter consciência de que pode requisitar algumas coisas para garantir sua sobrevivência mínima.

Folha - Quais, por exemplo?
Maria Cecília -
Todos os portadores de câncer e de outras enfermidades graves como hanseníase, tuberculose e Aids podem sacar seu fundo de garantia e seu PIS/Pasep e pedir a isenção do imposto de renda incidente na aposentadoria, entre outras coisas.

Folha - E o processo é demorado?
Maria Cecília -
Ao contrário, é rápido, basta ter a documentação adequada, que consiste de um laudo médico atestando a enfermidade e o exame propriamente dito, além de documentos pessoais. É importante citar aqui que os órgãos responsáveis, no caso a Caixa Econômica Federal, têm de aceitar documentos autenticados. Eu recomendo nunca deixar o documento original, pois poderá ser exigido em muitas outras situações. Explico passo a passo como devem ser o atestado e o requerimento exigidos pela Caixa. Além disso, todo paciente tem direito ao acesso a todos os dados do serviço médico. O segredo profissional existe para o médico, mas não pode existir entre o médico e o paciente. No caso do FGTS, por exemplo, não é necessária a presença do doente para o saque, o responsável pode entregar o requerimento e receber o pagamento devido.

Folha - Você fala também de uma renda vitalícia, o que é?
Maria Cecília -
Existem pessoas que não têm nenhum tipo de previdência. Nesses casos, a lei assegura ao doente uma renda vitalícia de um salário mínimo mensal. Não é muito, mas é melhor do que nada.

Folha - Você se tornou uma militante na área?
Maria Cecília -
Já que tenho acesso a esse tipo de informação, sinto que é meu dever dividir esse conhecimento.

Folha - E quem não tem acesso à internet?
Maria Cecília - Eu autorizo a cópia integral da cartilha aos interessados em distribuir o conteúdo. Espero obter o apoio de laboratórios, hospitais e até mesmo do Ministério da Saúde.

Folha - E como está a sua saúde?
Maria Cecília - Sofri intervenção cirúrgica e passei pela quimioterapia. Um paciente que teve câncer tem de monitorar sempre, mas, depois que voltei da praia, pude me sentir curada. Quem faz quimioterapia não pode ir à praia por, no mínimo, três meses. No Carnaval, tive a oportunidade de passar dez dias no litoral. Quando entrei no mar, senti-me renovada.

Folha - Você tem outros projetos de utilidade pública?
Maria Cecília - É assegurado à criança internada o direito de ter a seu lado um parente. Porém a CLT não reconhece esse direito, e o que acontece é que ou o responsável perde o emprego ou a criança fica no hospital sozinha. Estou empenhada em um projeto de lei que force o Congresso Nacional a garantir ao menos o direito a uma licença sem vencimentos.


O e-mail para contatar a advogada é mariinha@sorirama.com.br



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