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CRIANÇA
A polêmica da palmada
A Europa debate uma lei para proibir os pais de bater nos filhos; franceses e ingleses
resistem em banir o tapa no bumbum
LUCIANA COELHO
DE GENEBRA
O Conselho da Europa
lançou uma campanha para acabar com
as palmadas, esquentando um debate que divide a
opinião pública europeia sobre
como disciplinar crianças sem
afetar seu desenvolvimento
psicológico e físico.
A mais proeminente entidade de monitoramento dos direitos humanos do continente
quer que os países proíbam na
lei qualquer tipo de castigo corporal, inclusive as palmadas no
bumbum. Até agora já obteve
garantias de 20 governos e promessas de outros oito de que
assinarão o compromisso.
Para os defensores da medida, qualquer tipo de punição
que envolva violência física degrada a dignidade da criança e
viola seu direito à integridade
-garantidos na Convenção dos
Direitos Humanos da ONU.
"Punições corporais mandam a mensagem errada de que
você pode usar violência para
obter o que quer", disse à Folha
por telefone Elda Moreno, do
Conselho. "E fica mais difícil
impedir outros tipos de violência. Onde estará o limite?"
Moreno é assessora especial
para o tema da vice-secretária-geral do Conselho da Europa,
Maud de Boer Buquicchio, que
lançou oficialmente a campanha na última terça-feira em
um debate em Estrasburgo.
No evento, foi apresentada
uma petição com assinaturas
dos jogadores do Real Madrid,
do ex-presidente soviético Mikhail Gorbatchov, da rainha
Sílvia da Suécia e da atriz italiana Claudia Cardinale.
Apesar do apoio pomposo,
no entanto, a proibição ainda
encontra resistência da população. Segundo Moreno, mãe
de duas crianças, este é o maior
freio à adesão dos governos que
ainda hesitam, como o britânico e o francês.
Ela lembra ainda que na Suécia, país pioneiro em proibir
por lei as palmadas, em 1980,
foi necessária toda uma geração para mudar a mentalidade.
"Uma pessoa confrontada com
essa questão primeiro tem de
questionar a forma como foi
criada e depois examinar seu
próprio comportamento como
pai ou mãe", afirma. "Do ponto
de vista psicológico, é muito difícil lidar com essas questões."
A imprensa europeia agora
desperta para o tema. "A campanha está ganhando impulso",
diz Moreno. No fim de semana,
jornais franceses antes irônicos destacaram a questão. No
Reino Unido, a cobrança em cima do governo cresce. Até recentemente, os britânicos permitiam castigo físico na escola.
Um estudo assinado pela
pesquisadora de saúde comunitária Catherine Taylor, da
Universidade Tulane (EUA),
mostra que crianças que levam
palmadas frequentes por volta
dos três anos se tornam mais
agressivas aos cinco. Para a
pesquisa, que será publicada na
revista "Pediatrics", foram ouvidas 2.500 mães e listados fatores de risco na maternidade.
Quase metade delas (46%)
afirmou que não havia batido
em seus filhos nenhuma vez no
mês anterior, e 28% o haviam
feito uma ou duas vezes. Outras 27% bateram mais e eram
as que reuniam mais fatores de
risco, segundo o estudo.
Em outra fase, as crianças
que apanham mais manifestaram mais sinais de agressividade, como crueldade, bullying,
brigar e fazer ameaças.
Para Miriam Debieux Rosa,
professora de psicologia da
USP, a força física não é um
bom método de educação, mas
há ocasiões em que a situação
escapa ao controle. "Pais que
nunca se descontrolam são
perfeitos, o que não existe", diz.
Ela afirma que educar pela
palmada é autoritário e pode
gerar pessoas medrosas e submissas ou que reproduzam esse padrão de se impor pela força. "Mas transformar em lei
um excesso eventual é exagero
e pode criminalizar formações
culturais diferentes."
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