São Paulo, domingo, 01 de outubro de 2006

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Eleições 2006

Mercadante

MALU DELGADO
DA REPORTAGEM LOCAL

É de um amigo que parte a definição: "Ele tem o ego do tamanho suficiente para ser político". Aloizio Mercadante, 52, percorreu com rapidez o trajeto das bases do PT à cúpula do poder. No caminho, angariou uma legião de inimigos políticos, mas soube construir amizades que passaram incólumes por crises políticas, pensamentos econômicos distintos e ideologias que não se bicam.
Se a vaidade do petista é um consenso entre os que por ele compartilham bons sentimentos e também os que o hostilizam, a generosidade seria a sua maior virtude (aí, só segundo os amigos).
Há quase um corolário "psíquico" dos que conhecem a alma do petista: "sim, ele é centralizador, tem um jeito arrogante, uma vaidade desconcertante, uma inteligência privilegiada, uma neurose com números, uma cobrança pelo perfeccionismo herdada da formação militar do pai, a veemência irritante para defender as próprias idéias, mas é generoso, solidário, engraçado nos poucos momentos em que se permite descontrair, um pai dedicado e babão, um homem que preza a família e os amigos".
Antes de disputar a eleição para o governo de São Paulo, Mercadante sustentava que sua maior derrota política fora em 1994, quando disputou como vice na chapa de Lula à Presidência. Passou boa parte do tempo criticando o Plano Real. Ao final, teve que admitir o êxito da fórmula econômica montada pelos tucanos.
Fez a mesma gritaria contra o Plano Cruzado, em 1986. "Algumas críticas foram justas, outras não", diz o economista Luiz Gonzaga Beluzzo, ex-professor de Mercadante, que integrou o governo Sarney. Reivindicar e exigir, lembra Beluzzo, eram verbos muito adotados por Mercadante. "Ele parece arrogante, mas está disposto a ouvir. É veemente, muito qualificado, mas sabe que não vou votar nele", diz o professor,que optou por Serra.

Sonho de ser presidente
Ao longo da campanha para governador, Mercadante nem sequer cogitava que o pleito poderia ser decidido no primeiro turno. Quem o conhece assegura: o petista não encarou a disputa em São Paulo como uma missão para auxiliar a reeleição de Lula. "Ele acha mesmo que é sua vez, que vai ganhar. Não admite a possibilidade de não ir para o segundo turno", conta um aliado do candidato.
A derrota em São Paulo dificulta o retorno do petista para o posto de líder do governo no Senado. Dizem "as más línguas petistas" que ele voltará obstinado por um ministério, num eventual segundo mandato de Lula. "É fato que ele sempre quis ser ministro. Mas o sonho mesmo é ser Presidente", alfineta um adversário petista.
Uma das mais leais amigas de Mercadante, atualmente assessora dele no Senado e ex-professora do petista na universidade, a economista de origem portuguesa Maria da Conceição Tavares contesta: "Ao contrário do que dizem, ele não é uma pessoa ambiciosa pelo poder, tá bom nega! Diria que as más línguas paulistas, que eu conheço muito bem, têm a tendência a dizer que ele é. Ele cumpre seu dever político".
O jornalista Ricardo Kotscho, que começou no PT junto com Mercadante, assegura que Lula nutre pelo senador uma amizade especial. "Eles divergem em muitas coisas, em política e em economia. Mas Lula o ouve muito e não deixa falarem mal dele", diz o ex-secretário de comunicação de Lula.
Se Mercadante foi lançado na política por Lula e preparado para ser o porta-voz econômico do PT, hoje não é mais a figura preponderante na economia para o partido. Lula considerava que, para o ministério da Fazenda, precisava de alguém com perfil político. "Político, por concepção, quer agradar a todos. Mercadante não. O que dificulta sua vida na política", diagnostica Kotscho.

Jeitão de poucos amigos
No Senado, Mercadante cumpriu a missão partidária. Segurou nas costas uma bancada totalmente inexpressiva do PT contra uma maioria articulada e bastante experiente do PSDB e PFL. Extremamente centralizador, tentava estar em todos os lugares e controlar todas as votações.
O malabarismo provocou alguns desastres políticos e vários ruídos com a oposição. Mas conseguiu conduzir negociações relevantes com o PSDB, PFL e PMDB em vários momentos. Ainda assim, não é benquisto pelos colegas. Há, inclusive, um bordão entre os senadores quando um deles esquece de cumprimentar o outro: "Bom dia, Mercadante!", dizem eles, colecionando sarcasmos sobre o jeitão difícil e de poucos amigos do líder do governo.
Enquanto exalta a fidelidade a Lula, há vários petistas que o consideram desleal na política. Citam, como exemplo, o caso do mensalão. Mercadante, assim como Lula, rifou os correligionários.
Não defendeu ninguém publicamente. "Nos bastidores, ajudou para que não fossem cassados. Mas não defendeu ninguém", conta um petista magoado. Ainda assim, buscou, na prévia para o governo, o apoio do ex-presidente da Câmara João Paulo Cunha, envolvido no mensalão, mas absolvido da cassação.


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