|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
PRESIDÊNCIA/RAZÕES DO VOTO
Lula perde votos onde economia patina
Em regiões afetadas negativamente pela política econômica do governo, petista teve menos apoio que nas eleições de 2002
Alckmin venceu presidente com folga em áreas de forte produção agropecuária; setor sofreu com câmbio e volta da febre aftosa
FÁBIO VICTOR
PAULO COBOS
DA REPORTAGEM LOCAL
Um detalhamento do mapa
eleitoral do primeiro turno
mostra que o surrado bordão
"É a economia, estúpido", cunhado por um marqueteiro do
ex-presidente dos EUA Bill
Clinton, continua útil para explicar resultados da política.
Se é impossível afirmar o que
motivou diretamente a opção
dos eleitores, fato é também
que a situação econômica de regiões específicas do país guarda
relação clara com os votos a
Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e
a Geraldo Alckmin (PSDB).
Relação essa que não se resume à vinculação mais óbvia, de
que a superioridade de Lula nas
regiões mais pobres se deve à
massificação do programa Bolsa-Família nesses lugares. A indústria e o comércio do Nordeste crescem mais que a média nacional, ajudando a criar
novos consumidores nas classes C e D. O petista venceu em
todos os Estados da região.
Há o outro lado da moeda.
Onde a crise se instalou, seja
pela política do atual governo
ou por problemas externos ou
climáticos, Alckmin venceu.
Nos Estados com agropecuária forte, como em todo o Centro-Oeste e no Sul, Lula despencou em relação à sua votação de 2002. Em Mato Grosso
do Sul, por exemplo, caiu de
41,5% dos votos válidos há quatro anos para 36% agora. Em
Santa Catarina o tombo foi dramático -de 56,6% para 33,2%.
Afetado pela política cambial
do governo e pelos preços externos, o preço da saca de soja
caiu quase 40% nos últimos
quatro anos. A resposta dos
eleitores de Sinop (MT), município que está entre os maiores
produtores do país, veio anteontem. Lula teve apenas 26%
dos votos válidos. Há quatro
anos, recebera 41%.
"Esse governo foi um zero à
esquerda para Mato Grosso. Investimentos em infra-estrutura poderiam compensar o problema cambial, mas nada foi
feito", reclama Tarcísio Sachetti, um dos maiores produtores
de soja e algodão da região.
Já no vizinho Amazonas, Lula teve sua maior votação proporcional no país, 78%. Dados
recentes ajudam a compreender o porquê. A Zona Franca de
Manaus cresceu cerca de 35%
só no ano passado, com faturamento recorde. O número de
empregos aumentou 29%.
Aftosa e gripe aviária
A retração no preço da carne
bovina e o ressurgimento, no
ano passado, da febre aftosa,
que restringiu as importações,
afetaram o Centro-Oeste, região em que Lula foi batido por
Alckmin em todos os Estados.
Porcos e frangos espreitam a
decadência de Lula em Santa
Catarina. A exportação dessas
carnes, especialidade do Estado, sofreu um tombo. No primeiro caso, pela suspensão das
compras da Rússia (maior importador), outro reflexo da febre aftosa. Quanto aos frangos,
a culpa foi da gripe aviária.
O Rio de Janeiro e o Espírito
Santo, os dois Estados do Sudeste onde Lula venceu, são
grandes produtores de petróleo, cujo preço subiu nos últimos anos. O Rio, maior produtor nacional, gostou. Lá, Lula
teve 49% dos votos, nove pontos a mais que em 2002. Macaé,
município campeão de produção, foi ainda mais generoso
-59% votaram no petista.
A indústrias de calçados, móveis e máquinas e equipamentos não parece contente com a
política econômica. Eleitores
de cidades onde esses setores
são fortes puniram Lula. Enfraquecidas pela invasão de produtos chineses, as fábricas de
sapatos de Franca (SP) e Novo
Hamburgo (RS) dispensaram
funcionários nos últimos anos.
Em Franca, Lula teve 25%
dos votos válidos, contra 39%
de 2002. Em Novo Hamburgo o
petista caiu de 47% para 31%.
No Paraná, a região com forte
indústria moveleira foi menos
generosa com Lula. O petista
teve 27% dos votos válidos em
Arapongas (foram 41% em
2002). No Paraná como um todo, o petista registrou 38%.
"O centro-sul, com forte atividade do chamado agribusiness, é uma área em que os benefícios sociais do governo não
chegam, porque a população
tem um nível de renda melhor.
É gente que precisa do auxílio
do Estado em outro nível, e o
governo demorou a atendê-los", afirma o sociólogo Brasílio
Sallum Jr., professor da USP.
Para ele, porém, é uma simplificação dizer que o quadro
eleitoral é fruto exclusivamente da economia. "Às vezes uma
sociedade é simples, como em
muitas cidades do agribusiness,
mas se vê atingida no centro de
seus valores. Nesses lugares, a
ameaça à propriedade da terra
pode contar mais do que o desempenho econômico."
Texto Anterior: Eleições 2006/Assembléia paulista: Bancada PSDB-PFL cresce 25% em SP Próximo Texto: Análise: Para analistas, radicalização é só eleitoral Índice
|