São Paulo, quarta-feira, 04 de outubro de 2006

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A seleção

Curadores da mostra também "viveram juntos"

Trabalho coletivo é resposta ao centralismo da última Bienal

DA REPORTAGEM LOCAL

Com uma curadoria dividida por cinco pessoas, a Bienal "Como Viver Junto" foi, em sua criação, uma experiência ligada ao próprio tema da mostra. "O trabalho curatorial foi, como em todo grupo, um exercício de convivência. Barthes indicava que todo grupo é, de certa forma, uma versão em escala reduzida da sociedade e, nesse sentido, reproduz as tensões, alianças, tomadas de posição e dinâmicas de força que ocorrem em maior escala", afirma um dos co-curadores, o colombiano Jose Roca.

Coletividade
A proposta de uma curadoria coletiva já estava na carta convite do atual presidente da Fundação Bienal, Manuel Francisco Pires da Costa, aos escolhidos para elaborar um pré-projeto de bienal, como ocorre com a Documenta de Kassel, na Alemanha. Certamente, a idéia de trabalho em grupo surgiu após o fracasso da Bienal passada, organizada apenas pelo alemão Alfons Hug, que foi considerada uma das piores da história.
Em seu pré-projeto, Lisette Lagnado indicava os brasileiros Adriano Pedrosa, que já havia participado da 24ª Bienal de São Paulo, em 1998, como adjunto de Paulo Herkenhoff, e é dos curadores nacionais com maior circulação internacional, e Cristina Freire, professora e pesquisadora do Museu de Arte Contemporânea da USP, especialista em arte conceitual.
"Para mim, que venho de uma formação acadêmica e de uma prática museológica, a Bienal foi um exercício de pensar além de certos princípios estabelecidos e também uma oportunidade concreta para realizar um trabalho de pesquisa de campo inigualável", afirma Freire.
De estrangeiros, Lagnado nomeou Roca, diretor de exposições temporárias da Biblioteca Luis Angel Arango, em Bogotá, na Colômbia, e Rosa Martinez, a mais estelar do grupo, que já foi responsável por organizar bienais na Rússia, Espanha, Estados Unidos, Irlanda, Coréia, Japão, e ter tido o mérito de ser a primeira curadora mulher, com Maria del Corral, a cuidar da Bienal de Veneza, na Itália, no ano passado. Atualmente, Martinez é diretora do Museu de Arte Moderna de Istambul.
Um terceiro estrangeiro ainda foi apontado, o alemão Jochen Volz, ex-diretor do Porticus, espaço de arte contemporânea em Frankfurt, na Alemanha, e atualmente curador do Centro de Arte Contemporânea Inhotim, em Minas Gerais, do colecionador Bernado Paes. Volz foi o único curador a ser responsável por um segmento específico, o bloco dedicado ao belga Marcel Broodthaers.
As curadorias coletivas têm sido comuns em bienais e grandes mostras. Foi assim na última Bienal de Veneza e na Documenta de Kassel, mas, em ambas, cada curador escolhia os artistas, que foram apresentados em grupos isolados, o que não ocorreu em São Paulo.

Como uma "banca"
Aqui, todas as decisões foram coletivas, ou seja, cada artista exposto na mostra foi aprovado por todos os curadores, o que significa que nem sempre foi fácil viver junto. "Em certos momentos me senti numa banca, tendo que defender o Acre, a quinzena de filmes, mas todos os ajustes que foram feitos, foram para melhor. É difícil viver junto, fazer curadoria junto, acatar propostas estéticas que você talvez não escolheria, mas, com certeza, é pior trabalhar sozinho", diz Lagnado.
Esse modelo, entretanto, não está incorporado à Fundação Bienal e o processo para a escolha do próximo curador está indefinido. Cabe ao presidente da instituição a indicação do curador, e Pires da Costa, que já organizou duas mostras, não deve permanecer, pois não é prática na Fundação que o presidente tenha mais de dois mandatos. Com isso, "Como Viver Junto" pode representar apenas o momento mais democrático na história da Fundação e não uma prática constante. (FCY)


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