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Rosalind Franklin
Dama sombria
Biografia usa cartas e documentos inéditos para esclarecer enigmas de personagem central
FREE-LANCE PARA A FOLHA
A elucidação da estrutura do DNA é considerada marco fundamental na
ciência e rendeu o Prêmio Nobel, em 1962, ao norte-americano James
Watson, ao britânico Francis Crick e ao neozelandês Maurice Wilkins.
Mas há ainda muitos aspectos obscuros nessa história. Atores fundamentais do
episódio tiveram seu papel minimizado ou até mesmo esquecido, como o de Rosalind Franklin, integrante da equipe de Wilkins no King's College de Londres.
Há até quem diga que a pesquisadora foi passada para trás: uma
imagem da molécula de DNA obtida por ela com raios X permitiu
que Watson tivesse o lampejo para desvendar a estrutura em dupla
hélice. A imagem lhe foi mostrada
por Wilkins sem
consentimento de
Franklin.
Uma biografia
nova e equilibrada traz, agora, novos elementos para a elucidação
desse episódio da
ciência: "Rosalind
Franklin - The
Dark Lady of
DNA" (A Dama
Sombria do DNA)
-título que alude
ao apelido dado
por Wilkins-, de
Brenda Maddox.
A autora teve
acesso à correspondência pessoal inédita de
Franklin e entrevistou vários dos personagens, inclusive Watson, Crick e Wilkins.
O livro reúne informações preciosas para conhecer essa personagem misteriosa, morta com câncer aos 37 anos.
Maddox retrocede até o século
18, nos primeiros capítulos da
obra, para delinear a família judia
em que nasceu a menina Rosalind. Na Universidade de Cambridge, onde estudava física e química, Franklin teve contato com
William Lawrence
Bragg, que usava a
difração por raios
X para revelar a
estrutura de cristais. Franklin optou por seguir sua
carreira explorando essa técnica no
estudo microscópico da matéria.
O ponto de virada na vida de
Franklin foi, alega
Maddox, seu encontro com a
cientista francesa
Adrienne Weill,
discípula de Marie
Curie. Foi Weill
quem, de certo
modo, permitiu
que Franklin tivesse a oferta de seus sonhos: um
posto no Laboratório Central dos
Serviços Químicos, em Paris, para
onde se mudou em 1947.
Os anos em Paris consolidaram
sua reputação internacional em
cristalografia. De volta à Inglaterra, Franklin assumiu um posto no
King's College de Londres em
1951, para analisar a estrutura do
DNA, um campo novo para ela.
Desde o início, sua vida no
King's contrastou com a de Paris.
Franklin era independente, confiante e admirada em Paris. Já
Londres era um ambiente pouco
amigável para uma judia de classe
média alta que apreciava a cultura
francesa. No King's, sua reputação era pouco conhecida e seu
trabalho, pouco respeitado. Isso
no início dos anos 50, quando a
participação de mulheres no meio
científico ainda era pequena.
Sua primeira tarefa foi montar
um equipamento de difração de
raios X, com o qual obteve imagens de DNA com qualidade cada
vez maior, auxiliada pelo estudante de doutorado Raymond
Gosling. A situação no King's ficou insustentável. A antipatia de
Franklin por Wilkins contribuiu
para a ruptura dos dois, que chegaram a trabalhar sobre o mesmo
tema, mas isolados. Após dois
anos, Franklin decidiu ir embora.
Até onde Franklin chegou na interpretação das imagens que obteve do DNA? Há quem diga que
ela teve a intuição errada, ou que
não ousou o suficiente para chegar à estrutura atualmente aceita.
Watson, por exemplo, afirma que
ela não soube interpretar seus
próprios dados. O historiador da
ciência Robert Olby defende que
ela foi cuidadosa e evitou tirar
conclusões apressadas. Outros
afirmam que ela chegou muito
mais perto do que se imagina da
estrutura do DNA. O que se sabe é
que Franklin obteve imagens de
DNA de excelente qualidade em
1952, em especial a de número 51.
Enquanto Franklin finalizava
seu trabalho no King's, Gosling
tentava finalizar sua tese sozinho,
sem a orientadora. Deu a Wilkins
a imagem 51, que a mostrou a
Watson sem Franklin saber.
Seguiu-se daí, segundo Maddox, uma série de manobras que
minimizaram a contribuição de
Franklin. Para demarcar prioridade, Watson e Crick escreveram
um artigo para a revista "Nature".
Wilkins também quis ter crédito e
escreveu um texto sobre DNA para a mesma edição, sem mencionar o trabalho de Franklin. Nesse
meio tempo, Franklin e Gosling
também finalizaram um artigo,
incluído no mesmo número. Sem
saber que a descoberta de Watson
e Crick partira de sua imagem 51,
Franklin chegou a escrever que
suas "idéias gerais" eram coerentes com o modelo deles.
Três anos depois, em agosto de
1956, o câncer de ovário foi diagnosticado. Franklin manteve sua
agenda lotada, alternando períodos no hospital com idas ao laboratório e viagens a trabalho. Foi
uma época frutífera de pesquisas
sobre vírus, não mais DNA. Maddox define bem esse período:
"Rosalind estava muito ocupada
para morrer". A morte chegou
em abril de 1958. (LM)
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