São Paulo, Segunda-feira, 08 de Março de 1999
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Em 50 anos e 16 filmes, diretor reinventou a arte do cinema

AMIR LABAKI
da Equipe de Articulistas

Com o ainda inédito "Eyes Wide Shut", foram apenas 17 título sem 50 anos de cinema. Stanley Kubrick reinventou pacientemente a arte do filme, espaçando mais e mais suas revoluções. Leia abaixo a cada obra de Kubrick.

Curtas - Vindo da fotografia, Kubrick estreou atrás da câmera com três documentários de curta-metragem, muito marcado por suas experiências como repórter fotográfico da revista "Look". "Day of Fight" (1951) reconstitui os preparativos de um boxeador comum para mais um combate. "Flying Padre" (1952) focaliza um religioso que literalmente voava para aproximar seus fiéis dos céus. "The Seafarers" (1953), um filme de encomenda, destaca-se apenas por tratar-se de seu primeiro filme colorido. Antes dessas experiências, Kubrick teria rodado um breve curta ficcional ("A.I."), tido como perdido, em que adiantava as idéias sobre inteligência artificial desenvolvidas com o computador HAL de "2.001".

"Fear and Desire" (1953) - O longa de estréia, rodado com dinheiro emprestado por parentes e amigos, é o primeiro dos cinco estudos fílmicos de Kubrick sobre a guerra. Quatro soldados sobrevivem a queda de um avião em território inimigo. Uma jovem vem atrapalhar o plano de retorno a solo seguro. É o primeiro elemento feminino a perturbar o mundo másculo, à moda John Huston, de Kubrick.

"A Morte Passou por Perto" (1955) - Kubrick tempera seu primeiro -e ultra-estilizado- exercício no policial noir com sua experiência de repórter no submundo do boxe. Um lutador envolve-se com uma dançarina ao defendê-la das agressões de seu poderoso amante. Este jura vingança mas o destino exibe mais um de seus caprichos.

"O Grande Golpe" (1956) - O último grande "noir" da era clássica. Um homem sai da cadeia e aposta tudo num último assalto. Mas o mundo real parece responder-lhe com uma conspiração difusa e avassaladora. O primeiro Kubrick maduro marca sua estréia em Hollywood. Toda a obra de Quentin Tarantino partiu daqui.

"Glória Feita de Sangue" (1957) - O mais grave libelo antibelicista de Kubrick. Trincheiras européias, Primeira Guerra. Um general envia sua tropa a uma missão suicida. Ao fracassar, manda processar três soldados por covardia. Pena: execução. Como o coronel que os defende, Kirk Douglas transmite uma fúria cívica não menos que magnética.

"Spartacus" (1960) - A revolta do escravo Spartacus contra o decadente império romano num raro épico com cérebro. Kubrick reafirma a expansão de seus talentos orquestrando tanto grandes cenas de batalha quando sutis confrontos pelo poder, de gigantes como Laurence Olivier, Charles Laughton e Peter Ustinov. Ousado política, dramática e sexualmente, é talvez o mais subestimado dos filmes do diretor.

"Lolita" (1962) - Uma versão heterodoxa, pesada e grotesca, para o romance de Vladimir Nabokov. Um professor de literatura se apaixona por uma ninfeta e casa-se com a mãe dela para facilitar a convivência. Morta a senhora, consuma-se a relação. Mudam-se de cidade, viajam pelos EUA, sempre em busca do equilíbrio impossível. Há mais obsessão e culpa no Humbert fílmico. E o rival Clare Quilty, um vulto no livro, é praticamente uma criação kubrickiana imortalizada por Peter Sellers.

"Doutor Fantástico" (1964) - A sátira definitiva sobre a Guerra Fria, uma das comédias mais subversivas já registradas em filme. No auge do braço de ferro nuclear entre EUA e URSS, Kubrick destrói com humor macabro a tese de que haveria sobreviventes há um confronto atômico. Um paranóico general americano ordena o ataque inicial -e nada parece capaz de detê-lo. Peter Sellers em três papéis e a Sala de Guerra do Pentágono agarram na memória.

"2001 - Uma Odisséia no Espaço" (1968) - A partir de uma história de Arthur C. Clarke, Kubrick levou ao paroxismo sua pesquisa em torno do cinema como experiência audiovisual autônoma e irreprodutível. A história do progresso científico da humanidade transforma-se em pesadelo quando a criatura volta-se contra o criador. Raríssimos filmes capturaram o mistério das grandes obras de arte, como as novelas de Kafka ou as telas de Pollock. Este é um deles.

"Laranja Mecânica" (1971) - O romance futurista de Anthony Burgess serve para Kubrick rediscutir o mal-estar na civilização. Toda sua obra madura examina sob o ponto de vista freudiano histórias com potencial mitológico que tratem de personagens desajustados, dada a repressão instintual exigida pela vida em sociedade. O inesquecível Alex de Malcolm MacDowell é apenas mais um deles.

"Barry Lyndon" (1975) - A mais fiel das adaptações literárias de Kubrick, a partir do clássico de Thackeray, sobre as desventuras de um soldado irlandês em guerras na Europa do século passado. Nada supera o impacto da opção pela fotografia com luz natural.

"O Iluminado" (1980) - A simples história de Stephen King sobre um escritor sofrendo de bloqueio criativo viu-se transformada no mais aterrorizante dos filmes. Kubrick brinca com arquétipos e extrai de Jack Nicholson uma performance que o aprisionou até há pouco.

"Nascido para Matar" (1987) - A Guerra do Vietnã segundo Kubrick. A estrutura do "romance de formação" a serviço de uma fábula sobre a cruel educação para o assassínio de um grupo de jovens "marines" americanos. O menos orgânico título de sua filmografia.


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