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RACISMO
Imigrantes hispânicos e muçulmanos tornam-se os novos alvos
do preconceito nos Estados Unidos pós-atentados terroristas
Discriminação racial é o "calcanhar de Aquiles"
Para os negros, vítimas históricas do racismo, a hora é de cobrar reparações pela escravidão; eles também querem garantir a continuidade das políticas para aumentar a presença de afro-americanos nas universidades e no mercado de trabalho
FERNANDA DA ESCÓSSIA
DA SUCURSAL DO RIO
Trinta e sete anos depois
da promulgação da Lei
dos Direitos Civis, que
pôs fim à segregação racial nos EUA, o racismo ainda está
no cotidiano dos americanos,
com o surgimento de novos alvos
de discriminação --como hispânicos e muçulmanos.
Para os negros, vítimas históricas do racismo, a hora é de cobrar
reparações pela escravidão, principal bandeira do movimento negro hoje nos EUA. O país tem cerca de 34,6 milhões de negros -ou
afro-americanos-, diz o censo
realizado em 2000. Isso equivale a
12,3% da população americana,
de 281,4 milhões de pessoas.
Relatório da Iniciativa de Relações Humanas Comparadas (grupo de pesquisadores que estuda a
questão racial nos EUA, na África
do Sul e no Brasil) fala do racismo
como "o calcanhar de Aquiles da
América", uma aresta originalmente apontada contra os negros,
mas que hoje afeta também os
hispânicos.
O relatório mostra, por exemplo, a disparidade na formação
educacional: enquanto 82,7% dos
homens brancos, em 1996, tinham pelo menos quatro anos de
estudo no ensino básico, entre homens negros o número caía para
74,3%, e, entre hispânicos, para
53%.
O mesmo relatório mostra que,
em 1997, a taxa de homicídios entre homens negros era de 65,1
(por 100 mil habitantes), enquanto, entre homens brancos, caía
para 8,5 (por 100 mil habitantes).
Para os negros, é hora também
de tentar garantir a continuidade
das políticas de ação afirmativa (o
conjunto de práticas implementadas com o objetivo de reduzir desigualdades motivadas por gênero, raça, origem, deficiência física
ou outra condição de desvantagem).
A ação afirmativa estabelece
metas para aumentar a participação desses grupos nas universidades e no mercado de trabalho.
Há um debate em curso nos
EUA sobre a necessidade de manutenção desse tipo de política,
que vem sendo acusada por seus
críticos de promover uma discriminação ao contrário, criando divisões na sociedade.
A demanda por reparações foi o
tom dos protestos dos ativistas
negros americanos em Durban,
na África do Sul, na Conferência
das Nações Unidas contra o Racismo, a Discriminação Racial, a
Xenofobia e a Intolerância Correlata, que terminou no dia 8 de setembro.
Os EUA foram, desde antes da
conferência, contrários à discussão sobre reparações, por considerem o tema um "assunto doméstico". O governo temia, na
verdade, que a discussão internacional numa reunião das Nações
Unidas respaldasse uma onda de
ações judiciais por reparações
dentro do território americano.
Os EUA acabaram abandonando a Conferência de Durban, alegando discordar do tom das discussões sobre o Oriente Médio.
Países árabes queriam que os documentos da conferência acusassem Israel, tradicional aliado dos
EUA, de práticas discriminatórias
contra os palestinos.
Muçulmanos e hispânicos
Mal acabou a conferência de
Durban, os ataques terroristas da
semana passada contra o World
Trade Center e contra o Pentágono desencadearam uma onda de
ódio racial nos EUA contra muçulmanos.
"Sinto que, embora esses ataques tenham sido desencadeados
depois do atentado, vieram de
grupos que já têm sentimentos de
discriminação em relação a muçulmanos", afirma Louis Abdellatif Costillo, diretor do projeto
"Comunidades Muçulmanas em
Nova York", da Universidade de
Columbia.
Segundo dados desse projeto,
há hoje 600 mil muçulmanos na
cidade de Nova York, 1 milhão na
região metropolitana e cerca de 6
milhões nos EUA. Esses muçulmanos são de várias origens, desde brancos de ascendência européia (como Costillo) até negros de
origem africana, passando por
árabes e hispânicos.
Para Costillo, a discriminação
contra os muçulmanos é velada,
não direta. "Temos participado
da política americana, de várias
instâncias da sociedade e, com esse atentado, vimos que as pessoas
não nos consideram americanos,
mas estrangeiros no nosso próprio país", afirma.
Os hispânicos ou latinos que vivem nos EUA já superaram os negros em número. Segundo o último Censo americano, vivem hoje
no país 35,3 milhões de hispânicos, 12,5% do total da população.
Os hispânicos também são beneficiados por políticas de ação
afirmativa em licitações e empregos públicos e no preenchimento
de vagas em universidades.
"Mas os hispânicos ainda vivem
em situação de desvantagem, e
melhorar a situação deles é hoje
um dos desafios da política racial
dos Estados Unidos", avalia Lynn
Walker Huntley, coordenadora
da Iniciativa Comparada de Relações Humanas e vice-presidente
executiva da Fundação Sulista de
Educação, uma organização sediada em Atlanta para desenvolver projetos de apoio à educação
de negros e de outras minorias.
Huntley afirma, porém, que é
preciso reconhecer os avanços no
combate à discriminação nos
EUA, e cita especialmente o fim
da política de segregação. "Eu
mesma estudei em escolas segregacionistas, e isso não existe mais
hoje", diz Huntley.
A política oficial de segregação
vigorou nos EUA, em diferentes
graus em cada Estado, até 1964,
quando foi promulgada a Lei dos
Direitos Civis. Em alguns Estados,
havia até Bíblias separadas para
que brancos e negros fizessem seu
juramento nos tribunais. Separados, mas iguais, era o lema oficial
da política de segregação, com vagões de trem, escolas e bebedouros separados para negros.
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