São Paulo, domingo, 17 de maio de 1998

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A costa do Brasil

Bruno Alves/Reflexo
Vista do arquipélago de Fernando de Noronha, que se localiza a 345 Km da costa do Rio Grande do Norte



Atividades ligadas ao mar sempre tiveram um peso muito reduzido na economia do país desde os tempos coloniais, mas a expansão recente do turismo deve eliminar os vazios demográficos que ainda subsistiam na região costeira


ÁLVARO MONTENEGRO
free-lance para a Folha

Com 7.367 km, a costa brasileira, apesar de extensa em termos absolutos, é pequena quando comparada à área total do país.
Para cada mil quilômetros de costa, o Brasil tem 1.134 km2 de área interior. Na Argentina, por exemplo, essa relação é de 588 km2 de continente para cada mil quilômetros de costa. Nos EUA, é de 477 km2/1000 km.
Com base nesse parâmetro, o Brasil é um dos países mais continentais do mundo. A história da zona litorânea reflete essa configuração geográfica. De acordo com o geógrafo e sociólogo Antonio Moraes, o desenvolvimento do litoral esteve sempre atrelado à atividade econômica do interior.
Mesmo os grandes centros urbanos da costa, que hoje respondem por 15% da população nacional, funcionaram, até meados deste século, como ponto de escoamento para os produtos do interior.
As atividades tipicamente ligadas ao mar (exceto os portos) tinham importância secundária. Isso explicaria a ocupação irregular do litoral, que até os anos 60 se caracterizava por grandes extensões praticamente desertas interrompidas por algumas áreas urbanas.
Não que as populações litorâneas tenham ignorado o oceano a sua frente. Mas as atividades marítimas tinham importância regional, não se enquadrando nos grandes ciclos econômicos do país.
Até a pesca tem um peso restrito. Segundo a oceanóloga da Universidade Federal Rural de Pernambuco, Rosângela Lessa, por não ter muitas regiões oceânicas de alta produtividade, o Brasil nunca foi um pesqueiro importante.
A situação não deve mudar -pelo contrário. "As perspectivas da pesca no Brasil são muito ruins", diz Jorge Castello, especialista em recursos pesqueiros da Fundação Universidade do Rio Grande (RS). Castello diz que a pesca excessiva vai, em poucos anos, fazer com que a exploração de espécies como a corvina e o camarão se torne inviável.

Petróleo e turismo

Em 1977, quando a Petrobrás começou a extrair petróleo na bacia de Campos, em frente ao litoral fluminense, surgiu uma das primeiras atividades da zona costeira com impacto nacional.
Depois de 21 anos, mais de 78% do petróleo produzido no país, cerca de 50% do consumo nacional, vem do mar. Não é a toa que a Petrobrás é recordista mundial em profundidade de exploração, extraindo petróleo a 1.701 metros.
Outra atividade costeira que cresceu desde o fim dos anos 60 foi o turismo. A Associação Brasileira das Agências de Viagens estima que mais de metade do turismo no Brasil se concentre no litoral. Isso significou uma movimentação de pelo menos U$ 25 bilhões, em 97.
A exploração turística se estende por quase toda a costa. Segundo relatório do Ministério do Meio Ambiente, dos Recursos Hídricos e da Amazônia Legal, é uma das principais causas da ocupação dos vazios demográficos. Moraes prevê que, em dez anos, a faixa que vai de Chuí (RS) até Fortaleza (CE) estará totalmente ocupada por empreendimentos turísticos e imobiliários. "Só ficarão intactas áreas legalmente protegidas", diz.
Mas a falta de controle e de planejamento ameaça o turismo. Moraes se preocupa com a disseminação das casas de praia. Muitos loteamentos são executados em locais proibidos, sem esgoto ou áreas verdes. "Podem destruir um local em três temporadas" diz.
A pesquisadora do Instituto Oceanográfico da USP, Yara Schaeffer-Novelli, vê nos grandes empreendimentos turísticos, como os "resorts", um novo mal: além dos danos ambientais, excluem a comunidade local, que não usufrui da prosperidade do negócio. Porém, ela é otimista em relação ao futuro. À medida que a zona costeira passa a fazer parte da vida de um maior número de pessoas, fica mais fácil protegê-la, pois nos preocupamos mais com aquilo que conhecemos melhor.



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