|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Comunidade de San Francisco afirma que não sabe quem são os governantes do país
Taleban é invasor, dizem afegãos dos EUA
ÁLVARO PEREIRA JÚNIOR
ESPECIAL PARA A FOLHA, EM SAN FRANCISCO
"Você me conhece? Não. Eu o
conheço? Não. É a mesma coisa
com o Taleban. Nós não sabemos
quem eles são."
Enfático, o imã (neste caso, espécie de pároco) da mesquita afegã de Concord, Califórnia, tenta
explicar à Folha como é distante a
relação entre os afegãos que vivem nos EUA e o atual governo de
seu país.
O imã, que preferiu não revelar
o seu nome, deu entrevista em
pashto, uma das línguas oficiais
afegãs. Foi traduzido por fiéis que
chegavam à mesquita, no fim de
semana passado, para uma de
suas cinco orações diárias. Poucas
horas antes, vizinhas americanas
tinham levado flores à mesquita,
como prova de solidariedade.
Concord fica na região de San
Francisco, que tem a maior população afegã dos EUA, cerca de 60
mil pessoas. Só na cidade de San
Francisco, com 750 mil habitantes, há sete mesquitas.
"Os integrantes do Taleban são
invasores que vieram do Paquistão, e Osama bin Laden não é afegão, é árabe", disse Haji Sarwari,
56, um afegão que vive na Califórnia há 21 anos e também estava na
mesquita. Sarwari é um dos 5 milhões que saíram do Afeganistão
desde 1979, quando o país foi invadido por tropas soviéticas."Ouvi agora no rádio falarem do mullah Muhammad Omar [líder do
Taleban]. Nós, afegãos, nem sabíamos quem era essa pessoa."
A mesquita afegã de Concord fica no piso superior de um prédio
de dois andares. É identificada
por uma pequena placa, que diz
"Centro Islâmico". No térreo,
funciona uma loja de roupas mexicanas. O dono, Luís Gomez,
contou que, às sextas-feiras (dia
santo muçulmano), o movimento
é grande no andar de cima. O estacionamento fica cheio e cerca de
80 fiéis lotam a pequena mesquita. "Só que, sexta-feira passada,
vieram apenas umas três ou quatro pessoas", diz.
Gomez afirmou que, na quarta-feira de manhã, um dia depois dos
atentados, encontrou diversas
garrafas quebradas na porta da loja. "Achei que fosse coisa de bêbados, mas soube depois que, à noite, um pessoal tinha passado atirando coisas na mesquita."
Nada mais sério aconteceu, segundo Ghulam Shaghasi, 42, outro afegão que chegava para as
orações. De fato, não havia nenhuma segurança visível e, quando a reportagem da Folha chegou
à mesquita, encontrou a porta
aberta. Dentro, o imã rezava sozinho. "A polícia veio aqui e deixou
um cartão, para ligarmos se alguma coisa acontecesse", disse.
A região em volta da mesquita
tem forte presença afegã. Vários
afegãos trabalham no comércio,
como Beheshat Delery, 18, que
chegou aos EUA há oito meses.
Ela tem emprego numa lanchonete vizinha à mesquita. "Eu frito
batatas, faço saladas, esfrego o
chão e lavo o banheiro." Com inglês precário, Beheshat resume a
situação em seu país: "No school,
no money, no work" (não há dinheiro, escola ou trabalho).
Na mesquita são 18h, e o imã pede que o repórter saia porque as
orações vão começar. Ghulam
Shaghasi acompanha até a porta e
se despede em tom de apelo: "Se
os EUA quiserem, eles acham Bin
Laden e o trazem para ser julgado.
Não precisam jogar bombas sobre pessoas inocentes."
Texto Anterior: Pacifistas se mobilizam contra a guerra Próximo Texto: Gore Vidal: Algo de novo na Terça-Feira Negra Índice
|