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COMENTÁRIO
"Wanted dead or alive"
GERALD THOMAS
ESPECIAL PARA A FOLHA, EM NOVA YORK
Essa frase dita por Bush seria de
deixar qualquer pacifista horrorizado. Ela nos remete aos cartazes
dos velhos "westerns". Bush começou seu discurso moderadamente, falando em justiça. Mas,
de repente, sacou a pistola. Esse
parece ser o clima também entre
artistas e intelectuais americanos,
silenciosos perante a crise.
Esperava-se mais da comunidade intelectual? Certamente não se
esperava o que aconteceu ontem
no programa de David Letterman: o âncora Dan Rather, conhecido pela sua frieza, estava aos
prantos. O próprio Letterman estava aos prantos, pedindo desculpas por achar que não é hora de
piada. E não foi nada engraçado
mesmo. Dan Rather, emocionado
e abalado (isso só havia acontecido com seu predecessor, Walter
Cronkite, quando JFK foi assassinado), advertia o país que a luta
pela frente será sem precedentes.
"A América jamais voltará a ser
o que foi, e nós jamais poderemos
cantar nossos hinos e canções da
mesma forma" dizia, aos prantos.
"E não é somente a América que
estará em jogo", disse. "São todas
as liberdades e todas as conquistas modernas" (quase que repetindo as palavras de Cacá Diegues
para mim no telefone).
"Eles odeiam o que representamos. Não querem tomar conta do
nosso país nem o nosso dinheiro.
Querem nossa extinção em troca
de valores medievais. São os seguidores do culto do ódio."
Rather sabe do que está falando.
Ele já esteve no Afeganistão diversas vezes. Sentou frente aos grandes "líderes do mal". Esteve em
todos os lugares, reportando do
"ground zero" em todas as crises
mundiais. Ele é um dos três âncoras americanos, junto com Tom
Borkaw (da NBC) e Peter Jennings (da ABC). Rather parecia
refletir o clima da classe artística.
Pacifismo? Não. Essa palavra esta "out" nos EUA. O próprio Letterman ontem dizia: "Let's go get
them". Wow! Cruzada pela paz?
Ninguém está mostrando as caras. "São eles ou nós", diz o reitor
de letras da New York University,
uma frase inesperada vinda de intelectual do mundo literário.
"Dessa vez é diferente, é sujo.
Estamos lidando com terroristas e
não respondendo a nenhum conflito mundial: estamos lidando
com malucos que não medem
consequências. São suicidas e podem querer suicidar o mundo",
disse Peter McBride, filho de Sean
McBride, ex-líder do Sinn Fein (e
histórico pacifista da Anistia que
foi laureado com o Nobel da Paz).
Os cineastas americanos com
quem falei (que preferiram o anonimato) são conhecidos pacifistas. Unânimes, diziam que "esse
não é um momento de paz. Esse
conceito mudou para sempre. Teremos que repensar o que defendíamos". "Prefiro a nossa sobrevivência do que um mundo ocupado por ódio e inferno."
Será que o resto do mundo tem
idéia do que é tentar dormir (sem
consegui-lo), sentar na beirada da
cama e levar as mãos a cabeça?
Um líder pacifista negro disse
que "a guerra santa é uma guerra
burra. São os autodenominados
comandantes de um deus sem regras justas. São loucos, autodeclarados que defendem algo que só
caberia no manual dos maiores
criminosos do mundo".
Ontem, vi uma cena da qual jamais me esquecerei: aqui na esquina tem um pub cyber-clubber-punk (não exatamente conhecidos pelo seu pacifismo). Em estado de total catatonia, eles observavam pela TV imagens do resgate
de um caminhão dos bombeiros,
saído dos escombros do WTC.
A música parou. Acho que ouvi
alguns soluços. Vindo dos piercings. Os valores estão de cabeça
para baixo. É hora de pensar alto,
pois o silêncio do vizinho pode ser
um truque de um inimigo disfarçado. Esse é o clima de hoje nesse
"Admirável Novo Mundo": a
pomba da paz está suspensa e o
urubu tomou o seu lugar.
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