São Paulo, sexta, 19 de dezembro de 1997.



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Esmola é jeito pouco eficaz de ajudar

da Redação

A esmola é a mais primitiva, a menos racional e provavelmente a menos eficaz forma de filantropia.
É raro encontrar alguém que já não tenha dado uma esmola num sinal de trânsito. Todas as pessoas têm posições definidas contra ou favor desse gesto. Dificilmente alguém deixou de trair suas convicções pelo menos uma vez.
Quase ninguém se sente inteiramente à vontade ao expor suas razões diante desse assunto.
Betinho, por exemplo, quando perguntado se dava ou não esmolas na rua, respondeu: "Dou. E, quando não dou, morro de arrependimento". Pode soar estranho na boca de quem liderou uma campanha que pretende fazer da luta contra a fome um instrumento de construção da cidadania.
Mas Betinho não está sozinho nesse ponto. O psicanalista Jurandir Freire Costa, por exemplo, considera que a discussão "chega a ser tola e ociosa diante do tamanho da tragédia social do Brasil". Se as pessoas ainda dão esmolas, diz, "é porque não endureceram inteiramente diante da miséria".
Ele dá esmolas e não o faz "para apaziguar a consciência".
O sociólogo Pedro Jacobi afirma que, dependendo do seu "momento psicológico e do seu humor no dia", dá esmolas. "Sei que a esmola reproduz a cultura do favor, que está na raiz do paternalismo brasileiro, mas numa sociedade como essa é preciso ter alguma dose de generosidade, mesmo correndo o risco de ser piegas".
A secretária-executiva do Comunidade Solidária, Anna Peliano, é contra a esmola. Diz que ela serve para resolver "problemas de consciência" e defende que seria mais útil se as pessoas "doassem alguma coisa a instituições". A esmola, sustenta Peliano, "pode servir para que as crianças continuem na rua e aprofundem sua marginalização social".
Oded Grajew, diretor-presidente da Fundação Abrinq, não dá esmola por motivos parecidos. Acha que esse tipo de filantropia ajuda a manter uma estrutura de trabalho infantil e de subemprego adulto. Mas não condena quem as dá. "A pior coisa é não fazer nada. É melhor dar esmola do que não ajudar de nenhuma maneira."



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