São Paulo, domingo, 20 de maio de 2001

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História descontínua

OBRA A SER EDITADA POR AGNALDO FARIAS FAZ BALANÇO DOS 50 ANOS

DA REPORTAGEM LOCAL

Como parte das comemorações dos 50 anos da mostra, a Fundação Bienal encomendou ao curador e crítico de arte Agnaldo Farias a publicação de um livro sobre a história da Bienal até hoje.
Farias é o editor da obra, que em cerca de 350 páginas reunirá também textos de Rosa Artigas, Fernanda Fernandes, Francisco Homem de Mello e Sheila Leirner. A data do lançamento ainda não está definida, mas deve ocorrer até o fim da exposição que será inaugurada na próxima quarta-feira (leia mais sobre o evento na pág. 15).
Apesar de sua importância para a cultura brasileira, a Bienal de São Paulo é tema de apenas um livro, editado em 89, por Leonor Amarante ("As Bienais de São Paulo", Pró Editores, 406 págs., R$ 66). Mesmo assim, a publicação faz uma análise apenas até a 19ª Bienal, em 87.
Agnaldo Farias, que já foi curador-adjunto da própria Bienal (em 96), é o curador para a representação brasileira da 25ª edição do evento, no próximo ano. Na entrevista a seguir, Farias adiantou à Folha alguns dos temas tratados na publicação.
(FABIO CYPRIANO)

Folha - Como está organizado o livro sobre os 50 anos da Bienal?
Agnaldo Farias -
Em primeiro lugar, há um preâmbulo histórico, feito pela Rosa Artigas, em que ela apresenta todo o processo que culminou com a construção da Bienal, na instituição, e o papel de Ciccillo Matarazzo nisso tudo, porque ele é a grande figura, o grande empresário, patrono das artes. O livro prossegue com um longo texto meu, mais analítico, sobre a história da Bienal.

Folha - Qual é o foco de seu texto?
Farias -
O partido que eu optei foi recontar a história da arte a partir das diversas presenças na Bienal de São Paulo. Ela acompanhou o que estava acontecendo, não necessariamente de forma sincrônica. Às vezes, ao mesmo tempo em que ela apresenta a produção mais recente, apresenta também as referências históricas, por meio das salas especiais. Com isso, meu texto traça uma linha não a partir de como as coisas de fato aconteceram dentro do momento histórico, mas como um mosaico disparatado com opiniões contrastantes.
O interessante é que essa é uma discussão de uma política cultural, que foi adotada ao longo dos anos, onde cada curador praticamente só teve duas Bienais para realizar. Então, ela é descontínua, o que dá um desenho muito singular. Ao fazer isso, revela-se a própria natureza da instituição.

Folha - Como o sr. situa a força do abstracionismo expressionista norte-americano, que foi encampado por São Paulo, antes de Veneza, por influência do Museu de Arte Moderna de Nova York?
Farias -
Veja, não é nem a Bienal que encampa isso, porque a grande vinculação dela é com o concretismo. Portanto, não é com a escola norte-americana, nem com o tachismo europeu. E foi a via concreta que de fato, nos anos 50, vingou aqui muito fortemente.
Agora, de fato, o MoMA tem uma presença muito forte. Não se podia pensar em fazer uma grande exposição aqui sem esses parceiros, e os Estados Unidos foram um grande parceiro.
A Bienal é um espaço onde eles vão apresentar tanto o expressionismo abstrato, como também alguma coisa pop. Em 57 eles já fazem uma retrospectiva do Pollock. E por aqui eles preparavam uma grande entrada no âmbito internacional. Era uma questão política. Não uma decisão de marchand. Portanto, não é mercado nem decisão de curador.

Folha - A estrutura que Ciccillo legou à Bienal, centralizadora e dependente de seu presidente, é um problema para os curadores?
Farias -
Não, eu acho que, de modo geral, isso foi bem resolvido nos últimos anos. Quando a direção reclama ou torna um imperativo a sala histórica, ela não é inconsequente. Como também não é uma ingerência a preocupação dela com o público, que é uma satisfação que ela deve dar ao patrocinador, em última análise. Então, cabe ao curador dialogar com o mundo interno da arte, enquanto o diretor-presidente faz essa mediação com o mundo externo, que é quem vai bancar, patrocinar. Temos muito a aprender nesse aspecto. Não pode ser um muro fechado. É preciso que haja essa conversa e que ela seja feita da melhor maneira possível.


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