São Paulo, sexta-feira, 23 de janeiro de 2004

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Escola traz "missões" de ultramar

DA REPORTAGEM LOCAL

Quando nasceu, a USP seguiu a lógica do "não tem pão, que comam brioches". Sem professores especializados na maior parte das suas novas disciplinas, a universidade trouxe em seu início algumas dezenas de estrangeiros.
Coordenada pelo matemático Teodoro Ramos, enviado à Europa em 1934 para arregimentar professores, a iniciativa levou o mesmo nome da importação de artistas franceses por dom João 6º no século 19: missão.
Grosseiramente, pode-se falar em três "missões", as vindas de professores da França, da Itália e, em menor número, da Alemanha. Grosseiramente, outra vez, pode-se dizer que os franceses vieram lecionar disciplinas "humanas", ficando as "exatas" com os italianos e biológicas com os alemães.
Já nas fornadas iniciais, entre 1934 e 1935, chegaram intelectuais de grande importância na história da universidade. Do primeiro grupo foram importados o antropólogo Claude Lévi-Strauss, 95, o historiador Fernand Braudel (1902-85), o geógrafo Pierre Monbeig (1929-85), entre outros. Mais tarde viria um dos fundadores das ciências sociais no Brasil, Roger Bastide (1898-1974).
Da Itália chegaram logo Luigi Fantappié (1901-56) e o russo de nascimento Gleb Wataghin (1899-1986), nomes mais importantes, no início, da matemática e física uspiana, respectivamente.
Aluno da primeira turma de química, de 1935, Paschoal Senise destaca a vinda do "grande cientista" alemão Heinrich Rheinboldt. "Ele foi o responsável pela implantação e desenvolvimento do curso, auxiliado pelo também alemão Heinrich Hauptmann", afirma Senise, que, aos 86 anos, ainda vai todos os dias na USP.
Felix Kurt Rawitscher (1890-1957, botânico), Ernst Marcus (1893-1968, zoólogo) e Viktor Leinz (1904-1983, geólogo) completaram o time dos "tops" alemães. "Esses professores eram basicamente judeus, que eram os que queria sair de lá a qualquer custo", afirma a matemática Elza Furtado Gomide, 78.
No caso da missão italiana a história foi diferente. O físico Marcello Damy, que conheceu a maior parte dos "missionários", é categórico: "Os italianos que vieram eram todos fascistas". Com o começo da Segunda Guerra, em 1939, a maior parte deles voltou para a terra de Mussolini.
Fugindo do estereótipo dos italianos "exatos" e fascistas, também veio para lecionar na USP, entre 37 e 42, o destacado poeta Giuseppe Ungaretti (1888-1970).
Ainda para a área de letras, chegou uma quase quarta missão. Eram portugueses, como Rebelo Gonçalves (1907-1982) e Fidelino Figueiredo (1888-1967), que veio ensinar letras luso-brasileiras, quando a universidade não tinha uma cadeira de literatura só do Brasil. A USP nasceu mesmo falando outras línguas.
(CASSIANO ELEK MACHADO)


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