São Paulo, sábado, 24 de janeiro de 2004

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Onde haverá oferta de empregos no futuro?

Para economistas, com processo irreversível de redução de vagas na indústria, o setor de serviços terá peso cada vez maior no mercado; exigência de qualificação de mão-de-obra tende a aumentar ainda mais

FÁTIMA FERNANDES
DA REPORTAGEM LOCAL

O futuro do emprego em São Paulo está nos serviços. De cada dez postos criados na cidade, oito serão nesse setor. Essas vagas serão mais bem remuneradas, mas também vão exigir maior qualificação.
Esse é o perfil do emprego em São Paulo traçado para os próximos cinco, dez e até 20 anos por economistas que estudam o mercado de trabalho. São Paulo vai concentrar cada vez mais atividades administrativas e financeiras, além de centros de distribuição.
Conseqüência: vai demandar mão-de-obra para esses serviços. Atualmente, de cada dez vagas criadas, cerca de seis estão nos serviços. Comércio e indústria dividem as outras quatro.
"São Paulo está se transformando numa cidade pós-industrial, o que resulta numa mudança no padrão do emprego", afirma Marcio Pochmann, secretário do Desenvolvimento, Trabalho e Solidariedade da Prefeitura de São Paulo. Se, entre os anos 60 e 80, o município foi o centro industrial de importantes setores, como o automobilístico e o têxtil, diz, hoje a cidade dá apoio a eles.
Por limite de espaço, custo e pressões ambientais, a tendência é de as grandes indústrias continuarem se afastando da cidade, o que deve reduzir ainda mais a oferta de empregos nas fábricas. Mas a tendência é a indústria criar só um emprego a cada dez. Hoje, abre 20% das vagas.
Os serviços cada vez mais demandados serão os voltados à produção (apoio às indústrias), à distribuição (supermercados e atacados) e às pessoas, além dos sociais (escolas e saúde). "A indústria pode eliminar emprego por adquirir nova tecnologia, mas vai demandar serviços", afirma Pochmann.
Projeção feita pelo secretário indica que as áreas industriais das antigas fábricas instaladas na zona leste, que estavam no auge da produção nos anos 80, vão se transformar em áreas residenciais, comerciais (distribuição), educacionais e até abrigar indústrias mais modernas, como as de informática. Essa região, na sua avaliação, deverá ser o coração da metrópole, sobretudo pela proximidade com o aeroporto de Guarulhos, a região do ABC e o porto de Santos.

Desemprego recorde
Enquanto reorganiza sua mão-de-obra, isto é, tenta se adaptar à mudança de uma cidade industrial para uma cidade mais comercial e financeira, São Paulo enfrenta uma das maiores crises de emprego de sua história.
Em novembro de 2003, o desemprego atingiu 18,2% da PEA (População Economicamente Ativa) -a maior taxa do mês de novembro desde 1985. O maior índice registrado na cidade no ano passado foi em abril e maio, quando chegou a 19,5%.
São Paulo possui cerca de 1,1 milhão de desempregados e cerca de 4,6 milhões de pessoas ocupadas -a PEA é formada por 5,6 milhões de pessoas-, segundo dados da Fundação Seade de 2002. Esse quadro é resultado da saída de indústrias da cidade, do processo de modernização das fábricas, decorrente da abertura da economia, a partir de 1990, e do baixo crescimento do país.
"E não é só isso. Pessoas que não residem no município também disputam vagas na cidade", diz Pochmann. Pelos seus cálculos, 1,4 milhão de pessoas trabalham no município sem residir -isto é, elas vêm a São Paulo e voltam às suas cidades diariamente, como o próprio secretário, que mora em Campinas.
A Fundação Seade informa que esse número estava ao redor de 700 mil em 2000, segundo o Censo Demográfico de 2000, elaborado pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).

Mais especialização

Independentemente de quem ocupa as vagas na cidade -paulistanos ou não-, o fato é que, sem qualificação, vai ser cada vez mais difícil o trabalhador conseguir um posto. Isso porque os serviços que criarão vagas serão os mais sofisticados, como já se percebe nas pesquisas de emprego.
Os serviços especializados, como o de informática, o de contabilidade, o jurídico e o de marketing, por exemplo, ganham cada vez maior participação no total de ocupados em São Paulo.
De 1985 a 2003, a participação do emprego nesses serviços subiu de 4% para 7,5% do total de ocupados na cidade. O emprego no setor metalúrgico, que era o característico da cidade, já caiu de 10% para 5,6% no mesmo período, segundo a Fundação Seade.
Os economistas acreditam que os serviços que exigem pouca qualificação também podem empregar mais na medida em que os serviços mais sofisticados são mais procurados. O que eles querem dizer é que uma empresa que produz software vai precisar de pessoal de limpeza, por exemplo.
Esse movimento -aumento de vagas nos serviços e redução de vagas na indústria- não tem volta, segundo economistas. O comércio deve manter a sua participação, com uma a duas vagas de cada dez criadas. "A participação da indústria no total da força de trabalho tende a diminuir, mas não vai desaparecer", afirma Francisco Pessoa, economista da LCA Consultores.
Na sua análise, as indústrias de alta tecnologia, que empregam pouco, são as que têm maior potencial de se instalar ou crescer na capital. Ele cita como exemplo a de programas de informática. A indústria de turismo também deverá empregar mais, até porque as decisões das empresas, segundo ele, continuarão a ser feitas em São Paulo, o que significa a vinda de executivos para a cidade.
Para Paula Montagner, gerente de Análise de Estudos Especiais da Fundação Seade, a indústria do vestuário também deve mostrar mais vigor nos próximos anos.
"Existe em São Paulo muita mão-de-obra qualificada desse setor, além de muito consumo. A indústria do vestuário está se modernizando e tendo a acreditar que ela vai ficar por aqui para aproveitar os trabalhadores já treinados." Essa indústria, porém, será menor e informatizada, bem diferente da do passado, instalada em grandes galpões.
Apesar de o setor de serviços ser a grande esperança do emprego para o trabalhador daqui para a frente, isso não quer dizer que as vagas nesse setor vão se multiplicar a ponto de acabar com o desemprego nos próximos anos.
Economistas ressaltam que a abertura de vagas também depende do crescimento econômico do país. Eles entendem que, mesmo que o país cresça 4% ao ano, a possibilidade de criação de postos de trabalho é mínima. Primeiro, porque os setores trabalham com ociosidade. Segundo, porque as novas tecnologias exigem menos mão-de-obra.
"A abertura maior ou menor de vagas depende de políticas industriais e de emprego para os próximos anos. A economia brasileira foi prejudicada nos últimos anos pela inexistência de uma política industrial e de qualificação profissional", diz Fabio Silveira, sócio-diretor da MS Consult.
Na sua avaliação, a demanda por serviços mais qualificados corre o risco de não ser atendida se não houver preparação de mão-de-obra. "E isso tem de vir dos ministérios do Planejamento e do Trabalho. Hoje, existe um paredão pela frente. Ninguém sabe qual é a política do governo para criar empregos."

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