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PERFIL
Da roça para casa, produtor vive há 61 anos sem férias
FREE-LANCE PARA A FOLHA
São 6h e o produtor Antônio
Morgado, 68, já está ordenhando
as vacas, o que renderá 70 litros de
leite ao final do dia.
Ele passa o dia trabalhando no
sítio de 45 hectares, que fica a nove quilômetros de sua casa, na cidade de Brodowski (339 km ao
norte de São Paulo), para onde só
volta à tarde, por volta das 18h.
Trabalhando desde os sete anos,
Morgado nunca tirou férias e viu
seu negócio mudar muito.
Segundo ele, o mercado de hoje
não dá espaço para montar o capital e, por isso, a saída é manter o
que economizou, após ter vendido a fazenda herdada do pai e
comprado o sítio atual.
"Os produtos não aumentam de
preço. Há oito anos, eu vendia o
leite a R$ 0,30 o litro. Hoje, continua igual. Só que as máquinas e
outras coisas que a gente precisa
dobraram de preço. Tocando o sítio só dá para viver, não para lucrar", afirma o produtor.
A esperança está na produção
de café, "que está muito bonita e
dará uma boa colheita", com a
qual espera garantir o ano.
Morgado engrossa o coro dos
34% dos produtores brasileiros
que citaram como principal problema a falta de crédito ou de recursos para financiamento, segundo a CNA (Confederação Nacional da Agricultura).
Os outros problemas citados
pelos produtores foram os baixos
preços de venda dos produtos e
elevado custo de produção.
"A gente não pega financiamento do governo por medo de ser
passado para trás", afirma. "Precisamos de um juro mais barato,
para poder comprar as coisas que
eram possíveis antes."
O sítio faz parte dos 94% não-
irrigados do país. O trator e o arado são os mesmos há dez anos. A
colheita do café é manual. Ele afirma que não irá à Agrishow.
"Não vou passar vontade vendo
os outros comerem macarronada
e eu na polenta", diz Morgado.
R$ 1.000 por mês
Além da produção de leite, são a
criação de porcos e a plantação de
café que garantem a renda de R$
1.000 por mês a Morgado.
Ele ganha acima da média do
produtor brasileiro, que é de R$
500, mas está abaixo da média do
Estado, entre R$ 1.500 e R$ 2.000.
Mato Grosso do Sul possui a
maior renda média do setor, R$
2.600, seguido por Goiás, cujo ganho médio chega a R$ 2.000.
Morgado mantém só um empregado com carteira assinada no
sítio, assim como 70% dos produtores brasileiros que usam mão-de-obra. O outro é temporário.
Críticas
O que mais incomoda Morgado
são as as cooperativas, por não saber até onde é explorado pelas tarifas cobradas por elas.
As usinas de açúcar também são
criticadas. O produtor é um dos
poucos que abriram mão de arrendar suas terras para as usinas,
prática comum na região.
"Seria a mesma coisa que ganhar dinheiro dormindo, porque
você recebe e não produz."
Televisão
A maioria dos produtores comerciais brasileiros (62%) possui
apenas o primeiro grau completo,
como Morgado.
Ele se encaixa no perfil do produtor comercial brasileiro, que é
casado e vive para a fazenda.
Para ele, que nunca viajou para
fora da região de Brodowski,
"passeio é da roça para casa".
Mar, internet e clonagem ele só
conhece pelo que viu na televisão.
(TATIANA UEMURA E JOEL SILVA)
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