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TOP PÚBLICA
Vestibulinho para a Federal seleciona os melhores alunos
VINICIUS TORRES FREIRE
SECRETÁRIO DE REDAÇÃO
O currículo não parece muito
ortodoxo, técnico, na maior escola técnica de São Paulo, a "Federal" ou Centro Federal de Educação Tecnológica. No segundo
ano, as aulas somadas de filosofia
e sociologia são tantas quanto as
de matemática. Na bibliografia,
aparecem o crítico americano Harold Bloom ("A Necessidade da
Desleitura") e o poeta-crítico anglo-americano T. S. Eliot ("Tradição e Talento Individual").
Apenas metade dos alunos do
ensino médio opta por fazer também o curso técnico, profissionalizante (automação industrial,
eletrônica, eletrotécnica, informática, telecomunicações e construção civil). Neste caso, a carga horária passa de 34 horas para 55 horas por semana.
Dos estudantes da Federal que
passam nos cursos mais disputados da USP, nem a metade vai para engenharia. Muitos estão em
direito, economia, farmácia, veterinária ou jornalismo.
Desde os anos 70, a escola tem
fama de reduto "nerd" -até o
início do governo FHC, os cursos
médio e o técnico eram integrados. Muitos alunos iam para ITA,
Poli e outras escolas de ponta da
área de engenharia e matemática.
Mas muitos estavam lá apenas
porque a Federal era a melhor escola pública de São Paulo.
"Os alunos são ótimos. Qualquer professor fica satisfeito de
trabalhar com eles. Os professores
também, 33% deles têm mestrado
ou doutorado. Mas está cada vez
mais difícil mantê-los. Os salários
foram muito achatados nos anos
FHC", diz a diretora da unidade
São Paulo (há outras unidades em
Cubatão e Sertãozinho), Célia
Moschiar Pontes, engenheira e
professora de eletrotécnica.
Por que os alunos são bons? Talvez devido a funil fino do vestibulinho da escola: são 18 candidatos
para cada uma das 400 vagas. Cerca de dois terços dos estudantes
vêm de pequenas escolas privadas. De pequena classe média, os
alunos dizem que dificilmente
seus pais teriam como pagar uma
grande escola particular.
"O ensino é muito bom. Há problemas com infra-estrutura, reformas de sala, micros antigos.
Como a escola é federal, tudo demora, qualquer compra tem de
passar pela burocracia de Brasília", diz Danilo Densa, 17, presidente do grêmio estudantil.
André Marques, 16, diretor de
relações públicas do grêmio, diz
ainda que "se aprende muito fora
da sala de aula. As pessoas vêm de
muitos lugares, escolas e classes
sociais diferentes, há várias religiões, gente de várias tendências
políticas".
A primeiranista Mayara Vaz, 15,
concorda e acrescenta: "A Federal
também nos ajuda a amadurecer,
a liberdade é muito maior aqui.
Há pouco controle sobre você,
que tem de saber cuidar da sua vida e estudar".
A média mínima para aprovação é seis, na escala de zero a dez.
Quem tirar menos de quatro no
último bimestre fica, mesmo se tiver "fechado o ano".
Além do currículo normal, há
cursos de "projetos". Em cada
ano, o aluno escolhe um curso extra, com quatro aulas semanais.
Os cursos? "Leitura e Análise de
Obras Centrais da Literatura dos
Últimos 300 Anos". Ou "Ciência,
História e Cultura", "Teatro" e
"Iniciação Tecnológica".
No ensino regular de artes, o
aluno pode optar entre artes plásticas, música e artes cênicas. Literatura e redação são disciplinas
separadas. A carga horária de física e de matemática é algo superior
à das demais escolas e, como tem
orgulho de dizer a diretora Célia,
o "currículo é todo cumprido, e
com rigor, mesmo que os alunos
tenham de cursar as aulas de reforço que oferecemos".
Também colabora para a "liberdade individual" dos alunos o fato
de a escola ser imensa. Além do
ensino médio, há os alunos de
cursos técnicos, de tecnólogo e até
uma licenciatura em física. Os
prédios enormes lembram uma
mistura de edifícios da USP com
fábrica e estação de trem.
Abrigam dezenas de laboratórios e oficinas. Há desde uma minifábrica robotizada até uma minicentral elétrica, além dos tradicionais laboratórios de física, química e biologia. Há professores
específicos para as aulas de laboratório e para as expositivas.
Outra diferença da "Federal" é
que os alunos também votam na
escolha do diretor (o voto deles
tem peso de um terço no colégio
eleitoral). Há campanha nas salas
de aula, têm um mural eleitoral.
Na eleição deste ano, os estudantes votaram maciçamente em
uma candidata que perdeu.
Mas alunos e diretoria têm opiniões curiosamente semelhantes
e orgulhosas sobre a "Federal". O
grêmio dedica-se mais a problemas práticos do que à política
partidária. Para a diretora, os alunos são ultrapolitizados.
Tiago de Mello, 16, diretor cultural, e Renan da Silva, 17, diretor
de formação política do grêmio,
dizem que a orientação política
dos estudantes é variada: há gente
do PSTU, derrotada na eleição
passada, do PC do B, mas muito
PT e PSDB, além de anarquistas.
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