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Figueiredo ameaçou tirar concessão nas Diretas-Já, diz Boni

DO ENVIADO ESPECIAL AO RIO

Boni conta, no trecho a seguir, que o ex-presidente João Baptista Figueiredo (1979-1985) ameaçou cassar a concessão da Globo se a emissora noticiasse a campanha das Diretas-Já, em 1984.(MCC)

Folha - Por que a Globo noticiou o comício de São Paulo como se fosse a festa de aniversário da cidade?

Boni -Ameaçaram tirar o canal do dr. Roberto Marinho.


Folha - Quem ameaçou?

Boni - O general Figueiredo. O dr. Roberto brigou com ele quando ele dividiu a TV Tupi em duas redes para concorrer com a Globo: a Manchete e o SBT. Transmitir a festa foi uma vitória.


Folha - O que foi feito para a Globo cobrir as Diretas-Já?

Boni - Foi montado na sala do Roberto Irineu (Marinho) um esquema para controlar se o discurso fosse muito pesado.


Folha - Quem controlava?
Boni -A própria empresa, pressionada por pessoas do governo.


Folha- Então a censura perdurou na Globo até o governo Figueiredo?

Boni - Acabou com o início do governo Sarney, mas o hábito da pressão cessou recentemente.


Folha - Que tipo de pressão?

Boni - A TV Globo criou-se debaixo de pressão do governo e tinha o hábito de aceitar instruções do Planalto. Virou um vício, e a libertação demorou muito. Esse vício começou a ser eliminado no governo Sarney, abrandado no governo Collor, mas o Collor tinha relações com o dr. Roberto e com o Alberico (Sousa Cruz, diretor de jornalismo até 1995). Eles mantinham o vício antigo da interferência do governo na Globo. O Alberico tinha relações com o Collor por ordem da empresa.


Folha - Quando acabou a interferência do governo?

Boni -Só com a entrada de Evandro Carlos de Andrade (em 1995) é que a TV Globo passou a viver um clima de total independência.


Folha- O sr. teve participação no debate Collor x Lula?

Boni -Soltei a gravata e desmanchei o cabelo do Collor para ele ficar mais parecido com o Lula.


Folha - E na edição do debate?

Boni - Na edição do “Jornal Hoje”, o Collor ganhava de 3 a 2. Essa edição não satisfez ao dr. Roberto. O Alberico recebeu ordem dele de refazer a edição para o “Jornal Nacional”. Dr. Roberto achou que a primeira edição favorecia o Lula.


Folha- Isso faz sentido?

Boni - O Collor foi muito bem no debate, mas a edição me pareceu exagerada. O Armando Nogueira costuma dizer que o Collor ganhou de 3 a 2, e no “Jornal Nacional” apareceu 3 a 0. Não mostrou o gol do adversário. Um dia após o debate, a Folha me procurou e eu disse que não tinha gostado da edição. O dr. Roberto replicou dizendo que o Boni entende de TV, mas não entende nada de política.


Folha- O sr. concorda?

Boni - Posso entender menos de fazer política que o dr. Roberto, mas, como não estou envolvido, posso, de fora, analisar melhor.


Folha- A TV é o meio que mais perde audiência para a Internet. O sr. acha que as grandes redes de TV estão com seus dias contados?

Boni - A Internet não vai acabar com a TV. O que ocorre hoje, nos EUA, é que o público dos 9 aos 28 anos está vendo menos TV e aumentando sua exposição à Internet. A TV vai usar a Internet e a Internet usará a TV. A TV vai perder parte do seu público, 30%, segundo estimativas americanas, mas ganhará interatividade.


Folha- Dá para inventar alguma coisa nesse canal que o sr. terá em Taubaté ou tudo já foi feito na TV?

Boni - Será repetidora da Globo e terá de fazer 20% de programação local. No jornalismo local, tudo está para ser feito. A TV se tornou muito anódina, tem de agradar a gregos e troianos. Quando cuidar de interesses segmentados, haverá grandes mudanças.


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