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BASQUETE
Toco cru
MELCHIADES FILHO
EDITOR DE ESPORTE
Dois saltos simultâneos.
Tayshaun Prince, do Detroit, um passo adiante da linha
de lance livre; Reggie Miller, do
Indiana, embaixo da cesta. O vôo
de Prince apaga os três metros de
diferença. Sua mão esquerda bloqueia a bandeja, centímetros antes que a bola toque na tabela e
provoque o empate, a 17 segundos
do fim. O lance mais bonito, empolgante deste campeonato.
Já antevejo a saraivada inconformada de queixas. E as acrobacias do Kobe Bryant, o chute milagroso do Derek Fisher, as cestas
vitaminadas do LeBron James, os
passes absurdos de Jason Kidd?
De todos os lances da NBA, o sujeito vai destacar logo um de defesa? É coisa de paulista mal-humorado! Mal-amado! A Folha é do
contra até em análise estética!
Calma, galera, segurem seus e-mails. Concordamos, não há esporte com a dinâmica e riqueza
de movimentos do basquete.
O sujeito pode driblar ou não,
seguir pela direita ou pela esquerda (ou pelo alto), saltar antes ou
depois, chutar assim ou assado.
Em 24 segundos de posse de bola (ou 23, 22...), tudo pode acontecer. E, em cada 24 segundos (ou
23, 22...), acontece algo diferente.
Naturalmente somos estimulados a procurar essa fagulha de
criação, a inspiração, o que convencionamos chamar de arte. E o
nosso olhar, treinado a rejeitar
tudo o que conspira contra ela.
Mas é justamente o livre arbítrio das ações ofensivas que, no
basquete, empresta magnitude e
beleza a um desarme, a um toco,
a uma armadilha. Você acha difícil fazer as maravilhas de Kobe?
Vá, então, tentar impedir que Kobe faça as suas maravilhas.
Os mata-matas da liga norte-americana, a melhor defesa do
planeta, têm oferecido diariamente, pela TV, chances de se encantar pelo "lado B" do esporte.
Como a malícia de Karl Malone, que atrai a atenção de todos
(até dos juízes) com os braços,
mas utiliza os quadris para evitar
que craques como Tim Duncan e
Kevin Garnett se acomodem no
garrafão do Los Angeles Lakers.
A agressiva marcação por zona
do Minnesota, que flutua Garnett
no miolo do garrafão, pronto para dar o bote. E o desapego do
mesmo Garnett, que, em situações críticas, avança até em oponentes mais baixos e rápidos, como Kobe (este, na partida de sábado, devolveu a "cortesia").
A sincronia do "front court" do
Detroit, alas e pivôs posicionados
em linha, que suga adversários
para perto da tabela a fim de
martelá-los com tocos. Os braços
da parelha de Wallaces, Ben e
Rasheed, lembram um balé!
Ou a aplicação de Ron Artest,
eleito o melhor "stopper" pelos
técnicos da NBA -a válvula da
panela de pressão do Indiana.
Ao contrário do que se imagina,
marcar nem sempre requer velocidade, força e explosão física.
Mais importante é possuir visão
de jogo, saber antecipar as ações
do adversário e, uma vez feito esse
obrigatório exercício intelectual,
dar asas à imaginação.
Rachar o basquete em dois, entre ataque e defesa, só interessa
aos preguiçosos, aos que detestam
treinar (e dar treinos). Quem se
dispuser a ver o jogo como um todo vai se divertir ainda mais.
Defesa 1
É um erro dizer que os placares emagreceram porque o nível técnico
da NBA caiu. Nos últimos 30 anos, o atleta da liga cresceu em média 8
cm e 12 kg. Mas a quadra seguiu do mesmo tamanho.
Defesa 2
O divertido índice rebotes/arremesso destaca os jogadores com fome
de bola, mas sem aferro à cesta. Pelo segundo ano consecutivo, o cabeludo ala-pivô Ben Wallace (Detroit) ocupa o topo desse ranking.
Defesa 3
Os cestinhas Tracy McGrady (Orlando), Vince Carter (Toronto) e
Allen Iverson (Philadelphia) não classificaram os times aos playoffs.
Estão os três na lista dos negociáveis para a próxima temporada.
E-mail melk@uol.com.br
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