São Paulo, sábado, 01 de julho de 2006

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Scolari quer "Bombonera" lusa

Técnico usa vivência em jogos no lendário estádio argentino para estimular equipe contra ingleses

Treinador diz, porém, que já considera Portugal vitorioso por ter conseguido chegar entre os oito melhores times do Mundial da Alemanha


CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A MARIENFELD

O Schalke 04, o time da cidade de Gelsenkirchen, está muito longe de ser um Boca Juniors, mas o técnico Luiz Felipe Scolari quer que os jogadores da seleção de Portugal atuem hoje como se estivessem no lendário La Bombonera, o estádio de Buenos Aires em que o Boca manda seus jogos.
"Eu uso, com meus jogadores, exemplos do que já vivi. Conto para eles como é jogar no La Bombonera, com lotação esgotada e mesmo assim mais gente chegando, e como se faz para alcançar resultados positivos", disse Scolari, na véspera do confronto com a Inglaterra, exatamente em Gelsenkirchen.
Se a pregação de Scolari funcionar, Portugal passará à semifinal pela primeira vez em 40 anos, igualará o feito da seleção de Eusébio, o Pelé português, e dará a seu técnico brasileiro o que ele próprio diz ser o terceiro maior troféu de uma carreira bem-sucedida. O primeiro, óbvio, é o Mundial de 2002, com o Brasil. O segundo, Scolari não conta, mas insinua que nada tem a ver com futebol. Talvez com a vida pessoal.
Para ganhar hoje, Portugal vai mesmo precisar do espírito de guerra que cerca todos os combates do Boca em La Bombonera. Afinal, pode ficar sem dois dos seus três grandes astros: o brasileiro naturalizado português Deco está suspenso, e Cristiano Ronaldo, o jovem e promissor atleta do Manchester United, machucado, "pode ou não jogar", diz o técnico, de forma nada esclarecedora.
Sobra Figo, e ainda falta Costinha, igualmente suspenso. Não tem o nível dos outros três, mas é um útil meio-campista.
Os desfalques levaram a uma pergunta agressiva de um jornalista inglês, na entrevista que Scolari concedeu ontem de manhã. Quis saber se Portugal estava em "pânico", como conseqüência das ausências.
O técnico, em plena fase "paz e amor", deu a resposta que 11 técnicos em 10 dão nessas ocasiões: "Deco e Costinha são jogadores especiais. Mas todos os que tenho nesse grupo são especiais. Confio plenamente neles, e Portugal também confia".
Com a dúvida sobre Cristiano Ronaldo, Scolari não anunciou o time para hoje.
O treinador já cuida, no entanto, de deixar preparado o discurso para o caso de derrota. Mais de uma vez disse que "Portugal já é vitorioso, por ter chegado entre os oito melhores times do mundo" (situação em que, amavelmente, colocou também a Inglaterra).
A Folha quis saber como ele fizera para modificar seu psiquismo, já que, no Brasil, qualquer técnico que se diga vitorioso por ficar apenas entre os oito melhores seria demitido no ato. No Brasil, só é vitorioso quem leva a Copa para casa.
Scolari deu uma resposta que permite ver a diferente perspectiva do futebol português e do brasileiro: "Faço meus projetos dentro do que posso realizar. Na Copa de 2002, disse que, se chegasse entre os quatro finalistas, estaria feliz, e não me preocupei com as críticas dos brasileiros. Agora, com Portugal, disse que deveríamos ficar entre os oito primeiros, até porque somos o sétimo no ranking da Fifa, e também não me preocupo com críticas".
Críticas, aliás, é tudo o que não tem havido, até porque Portugal ganhou todos os seus quatro jogos até agora. Mesmo os jornalistas ingleses trataram Scolari ontem com uma deferência reservada aos grandes (técnicos ou jogadores), universalmente reconhecidos.
Insistiram em perguntas sobre o fato de não ter aceitado o convite dos ingleses para substituir Sven-Göran Eriksson como treinador. O brasileiro aproveitou para dar lição de moral, ao seu estilo. "Ainda existem pessoas no mundo que respeitam contratos e são leais. Fico feliz com o convite, mas estarei livre [do contrato com Portugal] só dia 31 de julho".
O técnico escapou de uma última provocação, em pergunta sobre se dorme bem mesmo com o vôo de helicópteros ingleses de uma base bem próxima da concentração. "Durmo com helicópteros, durmo com mosquitos, para mim dormir não paga imposto."
Mas deu uma pista do sonho que tem ao dormir: "Os jogadores só escutam o sino da igrejinha daqui, que começa às 7h49 e vai até as 8h. E querem continuar ouvindo o sino até dia 8 de julho" [véspera da final].


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