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O futebol precisa de uma lei universal
RAI SOUZA VIEIRA DE OLIVEIRA
especial para a Folha
Greve sempre é uma atitude
extrema, a última coisa a se
fazer. É preciso, antes, negociar, mostrar os prós e os contras, para tentar chegar a uma
decisão consciente.
Agora, quando se chega a
outro extremo, como foi o caso
da Argentina, nesta semana, é
diferente. Não foi um jogador,
nem dois, mas seis, que um
clube está impedindo de trabalhar, de ganhar o pão. Eles
estão certos. Só posso aplaudir
o sindicato e os jogadores.
Um sindicato não existe sem
o apoio dos jogadores. É necessário cumplicidade. E, nesse
episódio da Argentina, isso
existe e precisa ser elogiado.
Na Europa, a lei do passe
acabou por um caso semelhante -um jogador que queria
sair e o clube impediu. Ele entrou na Justiça e acabou ganhando. Isso deve ocorrer em
todos os lugares, inclusive no
Brasil, onde já houve um julgamento parecido.
A tendência é o passe acabar,
e por força de movimentos desse tipo. É preciso deixar claro
que a lei do passe pode impedir
o jogador de fazer o seu trabalho. O profissional de futebol
tem que ter liberdade, como
ocorre normalmente com outros profissionais.
No Brasil, já foram dados os
primeiros passos nesse sentido.
Primeiro foi o Zico, quando
era secretário de Esportes, e,
agora, o Pelé, que está se empenhando nas negociações.
Mas mudanças, protestos, esbarram em uma questão cultural do nosso país. Em qualquer setor da sociedade, o brasileiro tem dificuldade em se
organizar, protestar, em ir
contra uma idéia de maneira
consciente, organizada.
Demoramos para nos engajar nas lutas em favor de nossos direitos. Até pela nossa
maneira de ser, mais tranquila, mais de paz. É uma questão
cultural, e o futebol, obviamente, não escapa disso. De
qualquer modo, mesmo que
demorem, essas mudanças fazem parte, na minha opinião,
de um processo irreversível.
No futebol e em tudo mais,
existem cada vez menos fronteiras. A gente não pode mais
viver aqui na Europa de uma
maneira, e no resto do mundo,
de outra, com outras leis.
Existem muitas transferências de jogadores latino-americanos para cá. Tem uma circulação muito grande entre os
países. Na União Européia,
não existem mais estrangeiros.
Isso abre oportunidades de
trabalho para os jogadores fora de suas comunidades.
Uma forte tendência, que
exige uma lei universal.
Como já disse, no Brasil talvez demore um pouco mais. No
começo pode até dar confusão,
mas o mercado vai acabar se
adaptando com a abolição da
lei do passe. A própria legislação terá que ser modificada,
pois tais mudanças alteram as
estruturas do futebol.
Mas o princípio de liberdade
tem que ser respeitado. Tem
que começar por aí, por uma
ideologia, e esperar que ela
provoque modificações.
A greve argentina é basicamente isso e, caso eles consigam resultados práticos, a
idéia pode se estender a outros
países da América Latina.
No mesmo sentido, na Europa, estamos tentando organizar a Associação Internacional de jogadores. Também um
processo difícil, lento, mas necessário para nos fazer representar internacionalmente.
Rai Souza Vieira de Oliveira, o Rai, 32, é
meia-atacante do Paris Saint Germain (França)
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