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Os líquidos de um palmeirense
JOSÉ ROBERTO TORERO
da Equipe de Articulistas
Antes do jogo, lá pelas sete da
manhã, o palmeirense tomou seu
café com leite para forrar o estômago. Era a partida mais importante da sua história. O jogo demorava para começar, e ele já ia
ficando nervoso. Tomou então
um copo de água com açúcar.
Nos primeiros minutos o Manchester United desequilibrou.
Aqueles toques em linha reta, precisos, o fizeram levantar e pegar
uma dosezinha de uísque.
Só para acalmar.
Veio então o gol perdido por
Alex e depois a cabeçada de Paulo
Nunes, que Silvestre tirou debaixo
do gol. O que era aquilo senão o
prenúncio de momentos felizes?
Como momentos felizes não se
comemoram com uísque, ele sorrateiramente abriu uma lata de
cerveja.
Estava limpando a espuma do
bigode quando aconteceu o lance
fatal: cruzamento de Giggs, mau
posicionamento de Marcos, gol de
Keane. Era uma injustiça, justamente quando o time estava melhor.
Tinha que rebater aquela sensação de embrulho no estômago
com algo forte: um conhaque.
Sábia decisão: assim ele pôde
suportar melhor o fim do primeiro tempo, o súbito desequilíbrio
do time e os chutes tortos de Júnior Baiano.
No intervalo, para se tranquilizar, tomou um chazinho de camomila.
Reinício de jogo e Asprilla quase
empata. O Manchester estava
bem, mas aquele lance tinha tudo
para animar o time e ele resolveu
fazer uma caipirinha de vodca.
Houve momentos terríveis, como o gol perdido por Giggs e o
quase gol contra de Júnior, mas,
de modo geral, a tônica foi o Palmeiras martelar e tentar abrir espaços na bem compactada defesa
britânica.
Em cada um desses lances, ele
pegava a primeira garrafa que via
pela frente.
No gol anulado de Alex, tomou
uma caneca de rum para esquecer.
No chute de Alex, que passou à
direita de Bosnich, ele bebeu meia
garrafa de gim.
No lance em que Alex, sozinho,
cabeceou rente à trave, ele engoliu
uma dose de martíni.
Na hora que Oséas, cara a cara,
chutou em cima do goleiro, ele
mandou para baixo um gole de
cachaça.
No chute cruzado de Euller, já
um tanto amargo, ele entornou
um copo de campari.
E, no sem-pulo de Alex, que Bosnich espalmou para escanteio, ele
tomou, sem se dar conta, meio copo de vinagre.
Então o juiz apitou o fim do jogo. O palmeirense foi até a geladeira e viu a garrafa de champanhe que tinha reservado para a
festa.
E engoliu em seco.
Não foi dessa vez. O Palmeiras,
como seu torcedor, volta de Tóquio com o gosto de ressaca.
O time jogou melhor e teve mais
chances. Poderia ter vencido por
dois a zero, assim como naquele
seu primeiro jogo contra o Savóia
de Sorocaba, quando entrou em
campo com seu uniforme todo
branco com um triângulo azul no
lado esquerdo do peito.
Mas não faz mal, o Palestra Itália nasceu na Primeira Guerra
Mundial e renasceu como Palmeiras durante a segunda.
É um time acostumado às batalhas e logo vai estar de novo suando a camisa em busca de lágrimas
de felicidade, que o suor e as lágrimas, e não a cerveja ou o uísque, é
que são os verdadeiros líquidos do
futebol.
E-mail torero@uol.com.br
José Roberto Torero escreve às quartas-feiras
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