|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Enquanto o Sauípe vibrava com Guga, tenistas quebravam o pau
Conheça os detalhes da crise que provocou até lágrimas na equipe brasileira da Copa Davis
RÉGIS ANDAKU
COLUNISTA DA FOLHA
Logo após ganhar o título da
Costa do Sauípe, anteontem, Gustavo Kuerten festejou bastante
emocionado o fim do jejum de 32
meses no saibro. Ainda em quadra, lágrima nos olhos, agradeceu
a familiares, técnico, namorada,
torcida, amigos, organizadores.
Kuerten, sorridente, dizia-se
"tranqüilo, animado, empolgado". Telefonou para a mãe, Alice,
que estava em Florianópolis, e se
disse "o cara mais feliz do mundo". À noite, festejou com uma
lauta refeição no Marriot Hotel.
O título e a festa, porém, escondem a maior crise já vivida pelo
tênis nacional desde que, com o
primeiro título de Guga em Roland Garros, há sete anos, o esporte passou a ocupar as manchetes
dos jornais. A substituição de Ricardo Acioly por Jaime Oncins no
cargo de capitão da Copa Davis,
às vésperas do torneio, foi o estopim para detonar a "bomba".
Aos olhos do público, Kuerten
venceu cinco partidas em cinco
dias, ganhando seu primeiro título no saibro desde julho de 2001,
quando triunfou em Stuttgart.
Fora dali, entretanto, reuniões secretas, palavras como "traidor",
rumores sobre boicote à Davis e
até um choro fizeram parte dos
bastidores de uma crise inédita.
Movimentações
A "bomba" foi detonada exatamente na semana do maior evento disputado no Brasil. As manobras políticas tiraram o foco da
disputa e tornaram a movimentação nos bastidores mais agitada
do que a correria em quadra.
Acioly já havia sido avisado pelo
presidente da Confederação Brasileira de Tênis, Nelson Nastás, de
que seria substituído.
O dirigente passou a descartar
Acioly depois da derrota para o
Canadá, na repescagem em setembro do ano passado.
Rebaixados à segunda divisão
naquele confronto, os jogadores,
por meio de Acioly, chamaram
Nastás para uma conversa ainda
no vestiário do Stampede Park,
em Calgary (Canadá).
Chegaram a perguntar se o dirigente não achava que deveria deixar o comando da CBT.
Além de ser alvo de denúncias
de irregularidade em sua gestão,
Nastás é fortemente criticado pelos tenistas por ter desperdiçado o
bom momento que o tênis viveu
no país e não ter fomentado e popularizado a modalidade.
O fato de Acioly, funcionário da
CBT, ter "agendado" o encontro
com Nastás ajudou a selar o destino do ex-capitão da equipe.
Seu gesto foi visto como "conivente com os jogadores". Ele só
soube de sua demissão, porém,
por intermédio de Oncins no sábado retrasado.
"Você sabe a "roubada" em que
está se metendo?", perguntou
Acioly a Oncins. Diante da reposta positiva, desejou "boa sorte".
Coube ao novo capitão avisar os
tenistas. Gustavo Kuerten, melhor jogador do país (16º do ranking) e peça-chave da equipe, foi
o último a saber, avisado por Flávio Saretta, 45º do mundo.
Irritados por não terem sido
consultados, os jogadores fizeram
uma "reunião de emergência"
com Acioly ainda na noite do sábado. Nastás, após anunciar a
mudança, viajou à Europa.
No quarto de Kuerten, quase
madrugada, os jogadores, ao longo da conversa, criticaram Oncins
por aceitar o posto sem consultá-los e cogitaram até a possibilidade
de boicotar o confronto diante do
Paraguai, na mesma Costa do
Sauípe, entre os dias 9 e 11 de abril.
Intempestivo, Saretta era o mais
favorável à medida. Por ele, Fernando Meligeni seria o nome de
consenso, mas sabe que o ex-tenista jamais seria convidado, pois
tem divergências com a CBT.
No domingo, um novo encontro foi realizado. Desta vez, com
Oncins. Os jogadores deixaram
evidente o desconforto pela maneira que o novo capitão assumia
a equipe. Ressaltaram não haver
nenhum veto pessoal ao nome do
ex-jogador, mas pediram que ele
entregasse o cargo de volta à CBT.
Constrangido, Oncins chorou e
disse que "não poderia deixar de
realizar um sonho", mas que lutaria pelos jogadores. Ao fim da
conversa, pediu (e ganhou) um
"voto de confiança". Mas passou
o resto da semana abatido, isolado, esperando a poeira baixar.
Segundo a Folha apurou, ao
não atender o pedido para abandonar o posto, Oncins deixou nos
jogadores a imagem de "traidor".
É, agora, visto com desconfiança. Os tenistas acham que é difícil
ele dizer que vai defender os jogadores se acertou tudo com a confederação antes de consultá-los.
Além de ter provocado um racha entre os tenistas e o novo capitão antes mesmo de a parceria
começar, a nomeação de Oncins
neste momento acirrou a disputa
política nos bastidores.
Um grupo de ex-tenistas com ligação com o Rio acredita que Oncins não terá condições de peitar a
CBT para apoiar os atletas.
Já um grupo formado por ex-jogadores de São Paulo apóia o nome de Oncins, que representaria
uma mudança na CBT, sem o aumento da influência do grupo carioca e catarinense, que também é
oposição à atual direção.
Oncins terá de fazer a convocação dos jogadores nos próximos
dias. Nesta semana, Saretta iria jogar em Acapulco, mas desistiu. Sá
e Kuerten nada têm agendado.
Na próxima semana, Kuerten e
Saretta disputam o Masters Series
de Indian Wells, enquanto Sá joga
um torneio na Colômbia. Sá, que
havia perdido espaço na equipe
devido a sua péssima fase -é o
196º do ranking-, é treinado por
Oncins, mas deve seguir a mesma
posição de Guga e Saretta.
Várias conversas por telefone
estão sendo feitas. O mais provável é que tudo "acabe em pizza",
como apostam dirigentes.
A não ser que Oncins mude de
idéia e anuncie sua saída da equipe, o que é pouco provável.
Há quem aposte que os tenistas
façam um "boicote branco", alegando contusão e, assim, deixando de atender a convocação.
Larri Passos, técnico de Guga e
que já fez parte da equipe da Davis, por sua vez, tem grandes divergências com a CBT e diz não
querer se envolver no problema.
Defende, porém, que os tenistas
simplesmente não atuem enquanto a atual direção não sair.
Essa opção, porém, é praticamente descartada pelo próprio
Kuerten. Longe dos microfones,
apesar de criticar a confederação,
ele disse à Folha que "é difícil"
deixar de jogar a Davis.
O catarinense gosta de Oncins
-tem mais afinidade com ele do
que com Acioly- e acha que,
com o boicote, o ex-parceiro de
duplas sairia queimado.
Texto Anterior: Painel FC Próximo Texto: O personagem: Oncins figura nas melhores atuações do país no torneio Índice
|