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CLÓVIS ROSSI
Em busca
do jogo que
a seleção
"escondeu"
O repórter do jornal espanhol "El País" saiu do San
Mamés, o estádio de Bilbao em
que a seleção brasileira empatou com o Athletic, em dúvida
se o Brasil "é assim" ou apenas
"se escondeu" no amistoso.
Suspeito que essa dúvida esteja na cabeça de todos os torcedores brasileiros. Parece inacreditável que um time que
tem, entre outras coisas, os dois
jogadores eleitos os melhores
do mundo (Ronaldinho e Roberto Carlos), para não mencionar um lote grande de outros,
se limite a esse futebolzinho de
quinta mostrado no San Mamés.
Diz "El País": "O Brasil se escondeu muito tempo em Bilbao. Escondeu sobretudo sua
capacidade ofensiva, ontem indolente e demasiado previsível".
No fundo, era a mesma inquietação que Juca Kfouri exibia, à noite, no programa "Cartão Verde" (TV Cultura). Como
explicar que jogadores como os
já citados Ronaldo e Roberto
Carlos, mais Giovanni, Rivaldo,
Denílson, Edmundo e cia., não
joguem na seleção um décimo
do que jogaram por seus clubes
na temporada que passou?
A resposta fácil é culpar Zagallo. Mas pode não ser a melhor
resposta. Afinal, o pressuposto
nela embutido é o de que todos
os técnicos dos clubes em que
jogam os atletas citados são brilhantes o suficiente para explorar melhor o talento deles. E Zagallo seria, por extensão, o único incompetente, que tem ouro
nas mãos e dele tira só pedras.
Fosse assim mesmo, a solução
seria simples: trocar Zagallo por
qualquer outro técnico e ponto
final. Por mais traumático que
pareça, na antevéspera da estréia na Copa, pelo menos serviria para injetar sangue novo, o
que, nos clubes, em geral dá
certo, ao menos inicialmente.
É raro o caso de técnico novo
que na estréia e nos primeiros
jogos subsequentes não consiga resultados algo melhores
que seu antecessor, em especial
se tem nas mãos um elenco pelo menos razoável. E o da seleção, mais que razoável, é excelente.
Tanto é assim que o teor de
polêmica em torno da convocação foi baixo desta vez. Pode-se
criticar Doriva, por exemplo, e
lamentar a ausência de Zé Elias.
Mas, no todo, não há muito
mais a tirar ou acrescentar aos
22 nomes relacionados por Zagallo.
O problema aí são dois: primeiro, falta coragem à CBF para
mudar de técnico tão perto da
Copa. Tanto que, em vez de dispensá-lo e convocar outro treinador, a CBF preferiu o quebra-galho de chamar Zico para
coordenador técnico, seja lá o
que signifique isso exatamente.
Já naquela altura estava claro
que os jogadores não rendiam,
na seleção, o que rendem nos
clubes. Portanto, estava claro,
se for correta a tese de que a
culpa é de Zagallo e de ninguém mais, que seria preciso
mudar o comando.
O segundo problema é justamente a hipótese de que a culpa não seja de Zagallo ou, ao
menos, não seja só dele. É o pior
dos mundos, porque derruba a
explicação que tudo resolve.
Seria preciso pensar em toda a
fracassada estrutura do futebol
brasileiro, que espalha campeonatos irracionais pelos Estados,
desmotiva os torcedores, expulsa os astros para o futebol estrangeiro e assim por diante.
Depois, espera-se que um técnico e 22 atletas se reúnam às
vésperas do torneio e resolvam
tudo com meia hora de treino.
Até podia funcionar quando a
superioridade do futebol brasileiro era de fato incontrastável.
Hoje, não é mais, até porque os
outros aprenderam em parte
graças ao conhecimento aportado pelos atletas brasileiros espalhados pelo mundo.
Como não dá para corrigir
problemas estruturais desse calibre do dia para a noite nem
parece haver coragem (se é que
se trata de fato de uma necessidade) para trocar de técnico, o
jeito é esperar que "El País" esteja certo e que a seleção esteja
apenas "escondendo" seu jogo
até a hora de estrear na Copa.
Ou esperar que Romário se recupere e faça até mais que os
outros, ou seja, jogue na seleção
não apenas o que joga no clube
mas muito mais, porque, neste
caso, nem nos seus clubes, o número 11 vinha jogando alguma
coisa.
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