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O futebol e as espécies em extinção
JOSÉ ROBERTO TORERO
da Equipe de Articulistas
O mundo do futebol não escapa às leis do darwinismo. Mudam as condições externas,
mudam as exigências do ambiente, e lá se vão seres que pareciam eternos, como os fortes
dinossauros. Eles vão morrendo, desaparecendo e virando
objeto da arqueologia esportiva, se é que isso existe.
Um exemplo é o velho ponta.
Antigamente -no caso, há 20
anos-, quando se via um time
entrando em campo na várzea
ou na praia, era só olhar para
os sujeitos mais miudinhos e já
se sabia quem eram os pontas.
Eles ficavam parados ali perto
da linha lateral, só esperando a
bola para partir para cima do
marcador e cruzar.
Mas, de repente, com o meio-campo mais fechado e o melhor
preparo físico dos defensores,
os espaços começaram a ficar
menores. O velho pontinha, por
mais que insistisse, não conseguia driblar com a mesma facilidade de antes.
Começaram a aparecer então
alguns laterais com fôlego de
gato, como Rosemiro e Marinho Chagas. Eles vinham lá de
trás, faziam a passagem pelo
ponta -o tal "overlapping" de
Cláudio Coutinho-, cruzavam para a área e ainda tinham pulmão para voltar e
marcar. Era uma humilhação.
O ponta então começou a
zanzar pelo miolo do ataque,
roubando o espaço dos outros
atacantes, que foram forçados
a recuar para o meio e, em muitos casos, se transformaram
nos atuais segundos volantes.
Hoje em dia, há remanescentes, claro, como Alessandro e
Denílson, mas eles são cada vez
mais raros. Triste fim para
uma posição que teve expoentes como Garrincha, Julinho
Botelho e Pepe.
Outra espécie que não vemos
mais é o meia-lançador, no estilo de Gerson, Dicá e Ailton Lira. Geralmente era um jogador
sereno, imponente e com pose
de centurião romano. Seu papel era cadenciar o jogo e fazer
passes longuíssimos para que
os atacantes pudessem surpreender os zagueiros rivais.
Mas, nos nossos dias, o meia
não pode nem pensar em parar
para pensar na jogada, tal a velocidade e a voracidade com
que os marcadores avançam
sobre ele. Para o bem e para o
mal, ele se transformou num
jogador tático que cobre o lateral, compõe o meio-campo e se
livra da bola o mais rápido possível, para que o time continue
com ela em seu poder. Valdo e
Zinho são dois bons exemplos.
O ponta ousado e o lançador
clássico representam um modo
de jogar que nos dá saudades.
Não eram jogadores versáteis.
Pelo contrário, eram especialistas que nos encantavam justamente por fazer muito bem
aquilo que sabiam fazer. Um
drible bem dado e um lançamento perfeito faziam parte do
espetáculo. Na correria de hoje,
viraram exceção.
Mas não são apenas os pontas, os lançadores, o mico-leão
e as baleias que estão desaparecendo diante de nossos olhos.
Há outros seres em perigo. As
morenas são um bom exemplo.
Elas estão ficando loiras. É um
terrível processo de xuxanização. E também estão desaparecendo os comunistas, os anarquistas, os católicos e os fãs de
F-1. A extinção desses exemplares é uma perda irreparável para nossa biodiversidade social.
Precisamos salvá-los. Principalmente as morenas, é claro.
Salvem as morenas!
²
E-mail torero@uol.com.br
²
José Roberto Torero escreve às quartas-feiras
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