São Paulo, quarta-feira, 03 de março de 2004

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VÔLEI

Empresário que rege carreira de 8 selecionáveis elogia técnico, mas diz que contratos de seus clientes têm de ser cumpridos

"Dono" da seleção peita até Bernardinho

MARIANA LAJOLO
DA REPORTAGEM LOCAL

No banco de reservas, ele não conseguia se conter. Xingava e gritava como louco a cada lance.
Quando Giovane acertou o saque que fez o Brasil campeão do mundo, chorou. E correu para abraçar seus companheiros. Sentia a maior emoção de sua vida.
Jorge Assef Neto não é da comissão técnica da seleção nem assessor da confederação brasileira. Com o corpanzil de mais de 100 kg, não pode sonhar em jogar. Mas ganhou a honra de ver, do banco, o inédito título da equipe.
De certa forma, era responsável pelo que acontecia na quadra.
Assef cuida da carreira de oito dos cobiçados atletas da seleção masculina. É o mais influente empresário do vôlei nacional e um dos maiores do mundo.
"Eu tenho um poder grande. Tenho os melhores jogadores do mundo. Tenho o time", gaba-se.
E, para defender os interesses deles, não teme nem o todo-poderoso técnico Bernardinho.
"Ele é muito competente, faz um trabalho impressionante e montou um dos melhores grupos que eu já vi", afirma o empresário.
"Só não gosto quando quer mudar contratos dos meus jogadores. Antes de cada temporada, eu vejo o calendário e coloco todas as restrições no papel. Se ele quer mudar as datas de convocação, que pague a multa", chia.
Sob os cuidados de Assef estão Ricardinho, Anderson, Nalbert, Giba, Escadinha, Gustavo, André Heller e Henrique, da seleção.
A lista ainda inclui nomes como Joel, sensação do Italiano, o argentino Marcos Milinkovic, destaque da Superliga, e Kid, responsável pelo início de sua aventura.
Entre um papo e outro na piscina de um prédio no Brooklin, Andrea, mulher do jogador, decidiu "contratar" Assef. Na temporada 94/95, Kid fez "o melhor contrato do Brasil", conta o empresário.
Exagero ou não, em dois anos, ele já trabalhava para 30 atletas.
Engenheiro civil com três pós-graduações no exterior, Assef se viu, ao lado do primo e sócio, livre da carreira em multinacionais.
Hoje, administra a vida de 42 jogadores. Só duas são mulheres.
"Não tenho mais paciência para ouvir palpite de pai, irmão, namorado e cunhado que acham que sabem negociar", reclama.
Assef só trabalha com Andrea e Kátia, mulher de Joel. Cristina Pirv, casada com Giba, e Jacqueline, namorada de Murilo, devem entrar no casting, atraídas pelos atletas e amigos do empresário.
Assef faz a linha paizão: batiza filhos, dá conselhos sobre namoradas, liga para médicos.
"Quando eu estava mal, cansado do frio, com saudade do Brasil, ele me deu força. Mas também liga para dar puxão de orelha", diz Gustavo, do Latina (ITA).
Mas o empresário também mexe em contas bancárias, monta sociedades com atletas e dá palpites. Já chegou a proibir Anderson de comprar um carro importado.
"Eu o mandei guardar grana. Hoje, ele tem um carro que vale três vezes mais. Eu queria uma Mercedes aos 18 anos. Só comprei aos 40, mas podia ter quatro."
Outras vezes, o homem de gênio forte palpita tanto que até briga.
"Já ficamos sem nos falar. Um manda o outro para aquele lugar, mas nos respeitamos muito", diverte-se Ricardinho, do Minas.
Assef é menos incisivo quando o assunto envolve contratos. O empresário, que leva 6% de cada negociação (seis é seu número de sorte), diz preferir um atleta feliz a um milionário desmotivado.
"O Nalbert [do Macerata (ITA)] poderia estar ganhando 40% a mais. Ele é capaz de voltar ao Brasil para ganhar ainda menos, mas estará feliz. E estarei ao seu lado."
Mas dizer não ao dinheiro não é tão fácil. Em 2001, Assef se aventurou no futebol. Saiu em seis meses. "Me arrependo. É sedutor pensar que Ronaldo tem em uma semana o que muito atleta top de vôlei ganha em um ano. Mas não sei comprar e vender gente."
A mesma boa relação que tem com os jogadores Assef mantém com o presidente da CBV, Ary Graça. Só não abre mão de defender seus interesses. "Não quero privilégio, mas, se outro empresário tiver, brigarei pelo meu."
Assef só gostaria de manter um privilégio. Nos Jogos de Atenas, se conseguir uma brecha na agenda, estar na quadra novamente.


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