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FUTEBOL
A magia do artista
TOSTÃO
COLUNISTA DA FOLHA
Depois do Ronaldo e do Roberto Carlos, dois craques
consagrados que brilham há muitos anos na Europa, o melhor e
mais encantador jogador brasileiro não é o excepcional Kaká, e
sim o artista Ronaldinho Gaúcho.
Ronaldinho Gaúcho e Kaká estão nos lugares certos. Os italianos adoram mais a objetividade e
a técnica, e os espanhóis, a fantasia e o show. Isso não significa que
Ronaldinho não seja técnico e eficiente e que o Kaká não seja habilidoso e criativo. Mas são dois estilos diferentes. Ronaldinho Gaúcho tem o jeito imprevisível e moleque do craque brasileiro.
Por que os italianos, um povo
apaixonado pela beleza e pela arte, adoram jogadores raçudos e
disciplinados, mas sem nenhuma
habilidade e criatividade, como
Gattuso?
Vou perguntar ao Carsughi.
Ronaldinho tem tido atuações
espetaculares. É sua primeira
temporada no Barcelona. O time
do Paris Saint-Germain era muito fraco para o seu imenso futebol. Nos próximos anos, não será
surpresa se Ronaldinho for eleito
o melhor do mundo pela Fifa.
Maradona e Ronaldinho são os
dois únicos malabaristas que deram certo, que se tornaram craques. Quando parar de jogar, Ronaldinho poderá dar shows antes
e nos intervalos das partidas. Valerá pagar outro ingresso só para
vê-lo brincar com a bola.
Ronaldinho não joga bonito
porque quer se exibir. Ele une a
magia e a beleza com a simplicidade e a eficiência. Ronaldinho
conhece e executa muito bem os
fundamentos técnicos e, no momento certo, improvisa e inventa.
Torna simples o que é complexo.
Aí está a sua magia.
Garrincha foi outro artista que
unia a brincadeira e a fantasia
com a competência e a simplicidade. Mas não era um malabarista, como Ronaldinho. Garrincha
não era simplório nem humilde.
Era simples. Não driblava também para se exibir, e sim para se
divertir e porque sabia. Driblava
e cruzava (passava). Quando não
dava para colocar a bola nos pés
ou na cabeça de um companheiro, voltava com a bola e driblava
de novo.
Na sua simplicidade, Garrincha
não se notava em campo. Não
pretendia ser nada. Era tudo.
Misterioso craque
Rivaldo é um mistério. A maioria dos grandes jogadores brasileiros mostrou que é craque antes
dos 20 anos, como os dois Ronaldos e o Kaká. Rivaldo se tornou
craque mais tarde, por esforço e
insistência.
Apesar de ter brilhado em duas
Copas do Mundo, principalmente
na de 2002, e de ter sido escolhido
o melhor do mundo pela Fifa, Rivaldo nunca foi aceito como um
craque por grande número de torcedores e jornalistas esportivos.
Nas eliminatórias de 2002, ele foi
o atleta mais criticado da seleção.
Durante a sua carreira, discutiu-se muito qual era a posição
correta do Rivaldo, na frente, na
ligação entre o meio e o ataque ou
no meio-campo. Ele brilhou intensamente e jogou muito mal
nas três.
Mas o melhor momento do Rivaldo foi no Barcelona. Ele jogava
avançado pela esquerda, quase
como um ponta, numa posição
que detestava e que o treinador
queria. Rivaldo desobedecia o
Van Gaal, deslocava-se para o
meio e decidia as partidas.
Após a Copa de 2002, Rivaldo
não mais se destacou. O técnico
do Milan não o colocou nem na
reserva. Carlo Ancelotti pensava
que ele não era atacante e que no
meio era inferior ao Kaká e Rui
Costa. Imagino que o treinador
achava o Rivaldo esquisito.
No Cruzeiro, Rivaldo jogou mal
suas dez partidas e só fez dois gols.
Estava lento, parecendo um veterano, embora tenha 32 anos. Será
que ele está em decadência? Parece, mas não se pode afirmar nesse
momento.
Rivaldo sempre foi um craque
atípico. Uma das características
mais faladas dos grandes atletas é
que eles antevêem o lance. Antes
de a bola chegar, já sabem o que
vão realizar. Isso nunca aconteceu com Rivaldo. Ele domina a
bola para depois pensar no que
vai fazer. Mas faz muito bem. Ele
é mais técnico do que criativo.
Rivaldo nunca foi também um
bom marqueteiro. Nunca esteve à
disposição da mídia. Dar entrevistas, sorrir para as fotos e ir a
encontros sociais e badalados,
sempre foi um martírio para ele.
Rivaldo gosta do sucesso, e não da
fama.
Mesmo se Rivaldo não voltar a
jogar como antes, ele já está na
história como um dos grandes do
futebol brasileiro. A maioria não
vai concordar.
E-mail
tostao.folha@uol.com.br
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