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Após corte, atacante aluga quarto por conta própria num hotel e critica comissão técnica
Revoltado, Romário sai atirando
MÁRIO MAGALHÃES
enviado especial a Ozoir-la-Ferrière
Na maior das suas crises na seleção brasileira, Romário saiu ontem atirando contra a comissão
técnica que o tirou da Copa de 98.
Depois de dizer de manhã que
não era o momento de falar, à tarde Romário protestou contra os
responsáveis pelo afastamento.
Às 13h, revoltado, ele abandonou o Château de Grande Romaine, concentração da equipe. Por
conta própria, alugou um quarto
num hotel da capital francesa.
O coordenador Zico, o grande
defensor do corte de Romário,
disse que procurou o jogador para
se despedir, mas não o encontrou.
Para amigos, Romário dissera na
semana passada que Zico queria
"fodê-lo".
O atacante afirmou que, provavelmente, já poderia jogar na estréia da Copa, no dia 10, com a Escócia, e que, "com certeza", já
teria condições de atuar no dia 16,
contra o Marrocos.
O maior jogador do Mundial de
94 reclamou da "falta de paciência" dos autores do corte: "Infelizmente, na cabeça da comissão
técnica, não tiveram essa paciência. Eles não devem ter confiado
na minha recuperação".
De manhã, Zagallo, Zico, o médico Lídio Toledo e o supervisor
Américo Faria anunciaram o corte
e foram embora.
Depois, Romário chegou à tenda
de entrevistas acompanhado só do
assessor de imprensa da seleção,
Nélson Borges. Zagallo afirmou
que teria chamado Romário para o
anúncio do corte, sem deixá-lo sozinho depois.
O atacante ironizou o relato do
treinador, seu desafeto há mais de
cinco anos: "Acontecem coisas
muito particulares num grupo...
Eu poderia contar muitas coisas...
mas prefiro não... Já que ele falou,
vamos dizer que está certo...".
Romário condenou a análise da
sua lesão por um médico francês,
que, conforme o seu depoimento,
não é especialista em esporte.
"Eles seguiram um laudo de
um especialista, que não é médico
de jogador. Cada um tem seu organismo, jogador é diferente."
Romário deu as declarações sobre o corte em entrevista à Rádio K
do Brasil, de Goiânia.
Ele disse que ontem já se sentia
melhor, confirmando informação
do fisioterapeuta Claudionor Delgado de que o edema na batata da
perna diminuíra de nove centímetros para seis centímetros, em seis
dias de tratamento.
"Tenho certeza de que ficaria
bom, confio no meu organismo.
Poderia voltar no dia 10, à vontade, superaria o problema. Com
minha vontade de disputar a Copa, eu superaria qualquer coisa."
Romário deu a entender que se
sentiu traído pela comissão técnica: "Em nenhum momento me
passou pela cabeça a possibilidade
do corte. No domingo, eu dei coletiva para vocês, vocês ouviram a
minha confiança. Hoje, eu estou
melhor, estou cada dia melhor".
Romário, antes da viagem para o
Brasil, iria se encontrar com parentes que estavam em Paris.
"Tenho fé em Deus, no dia 16
já estarei jogando pelo Flamengo."
No mesmo vôo de Romário, viajaria o tenista Gustavo Kuerten.
O atacante foi informado do corte anteontem, por volta das 23h30,
ao ser chamado no quarto para
ouvir a decisão da comissão técnica, reunida desde as 22h numa sala
do primeiro andar do hotel.
Romário pediu para ficar, mas
não foi atendido. No quarto, telefonou para amigos, no Rio, atordoado com o afastamento. Ontem
de manhã, chorou três vezes.
Na noite de anteontem, o presidente da CBF, Ricardo Teixeira,
foi informado do corte pelo telefone celular. Teixeira, até então confiante na presença de Romário na
Copa, conversou com vários integrantes da comissão técnica.
Há dias, ele ouvira um apelo do
presidente da Fifa, João Havelange, para tentar manter Romário
até quando fosse possível. Havelange temia pelo esvaziamento da
Copa da França, com a ausência
de várias estrelas. Ontem, o presidente da Fifa disse: "Lamento,
como brasileiro, pelo Romário.
Como presidente da Fifa, sinto por
mais uma estrela fora da Copa".
A contusão de Romário foi provocada por seu esforço muscular
em partidas de futevôlei, no Rio.
Na comissão técnica, havia ceticismo sobre a recuperação. Depois
de se exercitar o dia inteiro, Romário se deitava em sua cama, onde passava a noite com dores.
De manhã, ele ia para o café
mancando, o que levantava novas
preocupações sobre seu estado.
Desde os primeiros dias na França, Zico defendia o seu corte. Lídio
Toledo queria a sua manutenção,
mas abriu mão da posição.
Zagallo, até anteontem, preferia
esperar. A escolha de Emerson para o lugar de Romário ocorreu pelo medo de que Dunga e César
Sampaio não teriam condições físicas de jogar toda a Copa.
O corte de Romário é consequência não só da sua lesão -a
comissão técnica poderia apostar
na sua melhora-, mas de antipatias e ressentimentos gerados por
choques desde 1990.
Na Copa da Itália-90, ele entrou
em confronto com Lídio Toledo
por querer se tratar com o seu fisioterapeuta particular, Nilton Petroni, o "Filé".
Em dezembro de 92, Romário se
rebelou contra o técnico Carlos
Alberto Parreira e o coordenador
Zagallo, ao saber que seria reserva
num amistoso com a Alemanha.
Após o tetracampeonato, Romário disse que queria "dar um
tempo" à seleção, o que irritou Zagallo, que o atacou por "falta de
amor à amarelinha".
O resultado da polêmica foi o
afastamento de Romário da seleção na Olimpíada de Atlanta-96,
em que ficou em terceiro lugar.
O jogador voltou em 97, quando, em baixa, não tinha tido o
contrato de patrocínio renovado
pela Nike -o que ocorreu ao retornar à seleção.
Com Zico, a queda-de-braço foi
mais grave. Em 95, jogando pelo
Flamengo, Romário irritou-se
com críticas de Zico, o maior ídolo
da história do clube. "Quem
gosta de coisa velha é museu", disse Romário, sobre Zico. "O que
ele ganhou na vida? Perdeu todas
as Copas que disputou."
O primeiro corte de Romário foi
na seleção de juniores, por urinar,
do quarto do hotel onde o time estava sobre transeuntes na calçada.
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