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Operação tartaruga
Rolou a festa. O trio elétrico da Ambev, patrocinadora da seleção, escolhido para fazer o trajeto entre o aeroporto de Brasília e o Palácio do Planalto,
tinha mais atrativos para os pentacampeões do que o carro do Corpo de Bombeiros usado em 1970 e 1994, como a
música de Ivete Sangalo e as bebidas da companhia. Ronaldo e Ronaldinho beberam guaraná Antarctica, e os demais acumularam várias latinhas de cerveja Brahma até a praça dos Três Poderes. A opção frustrou os bombeiros e
atrapalhou a TV. A festa, porém, não era para eles.
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Fora das imagens da Copa do
Mundo, controladas a ferro e fogo
pela Fifa, a Ambev, mais recente
patrocinadora da seleção, conseguiu no último dia espaço mais
que privilegiado: era seu o trio elétrico em que os pentacampeões
desfilaram em Brasília, na primeira e mais importante recepção aos
atletas da equipe brasileira.
Tudo estava acertado para que o
desfile fosse em carro aberto dos
bombeiros, mas o tradicional caminhão foi preterido na chegada.
A Ambev, que tem um contrato
com a CBF até 2018, que prevê o
pagamento de, no mínimo, US$
10 milhões por ano, disse, por
meio de sua assessoria, que a escolha foi dos próprios jogadores.
Já na chegada, Ivete Sangalo recepcionou os jogadores na porta
do avião com uma camiseta da
Brahma. Dali para frente, só carnaval. Edílson fez dueto com a
cantora em diversas músicas de
axé e pagode. Entre as mais tocadas, Zeca Pagodinho, com o "hino" da seleção, "Vida leva eu",
Ivete e o grupo Fundo de Quintal.
No viaduto de acesso ao Eixo
Monumental -onde fica a Esplanada dos Ministérios-, o atacante tomou uma guitarra e puxou
"Lá Vem o Brasil Descendo a Ladeira", de Pepeu Gomes e Moraes
Moreira. Atrás do carro, uma
multidão de cerca de 250 mil pessoas acompanhava a seleção.
Ronaldinho preferiu os tambores. Chegou a praticar um desafio
com diversos percussionistas da
banda de Ivete, variando os ritmos e os tipos de batida no tantã.
Dida, mais tímido, tirou fotos e
filmou a atuação dos colegas, como Denílson, que tocou tambor
após algumas latinhas de cerveja.
Ao se aproximar da praça dos
Três Poderes, Ivete pediu para
que a música fosse interrompida
em respeito ao presidente Fernando Henrique Cardoso. Vampeta, que deu cambalhotas na
rampa do Palácio do Planalto, insistiu na saideira, "Vamo Batê Lata", do Paralamas do Sucesso.
O goleiro Marcos, nesse momento, surpreendeu-se com a
multidão que estava na Esplanada
e resolveu descansar. Sentou-se e
acendeu um cigarro, saboreando
a última latinha de cerveja antes
de encontrar o presidente FHC.
Durante o trajeto, além de faixas
de propaganda no caminhão, garotas portavam bandeiras da cervejaria. O carro tinha ainda imagens como a tartaruga símbolo
dos comerciais da Brahma.
O caminhão dos bombeiros que
deveria exibir a seleção do técnico
Luiz Felipe Scolari foi o mesmo
no qual desfilou a seleção tricampeã em 1970 e a tetracampeã em
1994. Durante 15 dias, o Corpo de
Bombeiros preparou o caminhão
principal, que não é usado atualmente para no caso de incêndios.
"Pensávamos que receberíamos
a seleção. Com certeza estamos
decepcionados, principalmente
porque comemoramos hoje o Dia
do Bombeiro", afirmou o major
Marcos Negrão, um dos coordenadores do desfile dos jogadores.
Além de provocar a decepção
dos bombeiros, a decisão dos jogadores acabou provocando
transtornos para a TV Globo, que
estava preparada para fazer imagens ao vivo durante o desfile de
dentro do caminho tradicional.
Somente depois de mais de uma
hora da chegada é que a TV conseguiu montar um "link" no trio
elétrico e passou a transmitir imagens ao vivo dos jogadores.
A informação transmitida ao
Palácio do Planalto e ao presidente da Radiobras, Carlos Zarur, foi
a de que o "link" para a transmissão ao vivo havia sido instalado
no carro dos bombeiros. Com a
mudança, não houve condições
técnicas de transmissão até quase
perto da rodoviária central do
Plano Piloto (centro de Brasília).
Conforme a Folha apurou,
quem providenciou a transferência de última hora da seleção para
o trio elétrico foram a produtora
de eventos Bia Aidar e representantes da Ambev. Desde a véspera, o Cerimonial da Presidência
da República e a Secretaria de Comunicação discutiam se seria
conveniente utilizar o carro.
O argumento a favor era que a
tradição deveria ser mantida. Mas
também havia argumentos contra: é muito desconfortável, e os
jogadores teriam que praticamente se pendurar em escadas
depois de semanas de tensão e
muitas horas de vôo. Apesar desses problemas, prevaleceu a tese
de manter a tradição, esquema
que acabou sendo desrespeitado.
Na versão oficial da Globo, só
não houve transmissão ao vivo
dos jogadores por cerca de meia
hora, "enquanto o helicóptero era
reabastecido". Segundo a Folha
apurou, a transmissão ao vivo foi
das 9h19 às 15h42, atingindo 28
pontos no Ibope (de cada dez telespectadores, seis estavam assistindo).
(DENISE MADUEÑO, IURI DANTAS E ELIANE CANTANHÊDE)
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