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"Saci" dribla guerrilha e acende Inter
Rentería, o reserva que é o artilheiro da equipe na Libertadores, vem da zona mais caótica da conturbada Colômbia
Time gaúcho joga hoje por uma vitória simples contra os paraguaios do Libertad por vaga na decisão da competição sul-americana
PAULO COBOS
DA REPORTAGEM LOCAL
Foram só 180 minutos em
campo pela Libertadores, divididos em pequenas frações para quem sempre começou na
reserva. Mas, ainda assim, o colombiano Wason Rentería, 21, é
o principal artilheiro do Internacional no torneio continental, em que o clube gaúcho joga
hoje, às 21h45, contra o paraguaio Libertad, no estádio Beira-Rio, por vaga na final.
Mas os quatro gols (dois deles entre os mais belos do torneio deste ano) em tão pouco
tempo, que o colocam na luta
pela artilharia geral (tem um só
a menos que os líderes), não é
nada complicado para quem
saiu de um lugar que concentra
tudo o que de mais perverso
existe na América Sul.
Rentería, que imita um saci, o
símbolo do clube, quando faz
gol, nasceu e cresceu em Quibdó, a capital do Departamento
do Chocó, o mais pobre da Colômbia. Isolada, a região tem
um IDH, o índice criado para
medir o desenvolvimento humano, que o colocaria em 114º
no ranking dos países. A Colômbia como um todo aparece
em 69º. Mas pobreza, comum
para tantos jogadores sul-americanos, está muito longe de ser
o maior problema da terra natal do elemento surpresa do Internacional na Libertadores.
Encravada numa área de floresta tropical e com apenas um
acesso rodoviário, Chocó sofre
como ninguém a ação das guerrilhas esquerdistas, dos grupos
paramilitares de direita e do
narcotráfico que corrói a Colômbia há mais de 30 anos.
Estima-se que mais de um
quinto dos 500 mil moradores
do Departamento sejam refugiados da guerra civil colombiana, a maior proporção do país.
A questão racial é outro problema. Segundo o censo colombiano, 90% dos moradores da
região são negros, como Rentería. Muitos se dizem discriminados, e leis foram criadas na
década passada para garantirem seus direitos.
Três dos cinco irmãos de
Rentería ainda moram em
Quibdó. Ele passa as férias lá e
homenageia a terra natal celebrando parte de seus gols dançando no estilo ruque-raque,
uma variação do regatón, um
ritmo colombiano.
Mas a proximidade das Farc
(Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia) fazem que
Chocó nunca mais seja o lar de
Rentería. "Não sei onde vou
morar quando parar de jogar,
mas não será em Quibdó. A violência lá é muito grande", declarou o atacante à Folha.
Ele conta como era a sua vida
lá, de onde saiu no final da adolescência. "Na minha cidade, as
coisas até que eram tranqüilas.
Só que você não pode sair para
qualquer outro lugar. A guerrilha está em todo o interior", diz
Rentería, que compara a situação da sua terra como uma espécie de prisão, em que você
não pode ir para onde quiser.
Rentería fala de problema de
segurança com autoridade. Seu
pai era um policial municipal
em Quibdó. Trocou o emprego
perigoso (policiais são alvos
constante das Farc), com o
qual criou seis filhos, por Porto
Alegre, onde passeia com a mulher e o filho nos shoppings.
O futebol foi a forma da família iniciar o processo de afastamento do caótico Chocó. Dois
irmãos de Rentería também
são atletas. Um está na Venezuela, e outro, na Argentina.
Preso ao falar do lugar em
que nasceu, Rentería se solta
ao falar sobre futebol.
"Toda vez que entro em campo, não importa o tempo que
vou jogar, faço o máximo", diz o
atacante sobre seu ótimo aproveitamento em poucos minutos jogados na Libertadores.
E, para alguém com sua origem, dar o máximo em um
campo de futebol não deve ser
mesmo um problema.
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